A Comissão Mista do Congresso criada para discutir a Medida Provisória que trata do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) manteve a previsão de portabilidade na lei que alterou as regras do vale alimentação e refeição, contrariando a recomendação do governo, e remeteu responsabilidade sobre o tema ao Banco Central.

A comissão decidiu também ampliar o prazo para regulamentar a portabilidade, que é a possibilidade de os trabalhadores escolherem a bandeira do vale, independentemente do contrato feito pelo empregador, e incluir a vedação do dispositivo em caso de decisão em acordo ou negociação coletiva. O texto agora segue para o plenário do Senado e da Câmara.

As mudanças foram incluídas no texto da MP pelo relator, o senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR). Originalmente, a MP só previa a ampliação do prazo para a regulamentação da lei, aprovada em 2022, de maio de 2023 para o mesmo mês do ano que vem.

A legislação atualizou as regras do PAT, permitindo a portabilidade, a interoperabilidade, que prevê que as maquininhas aceitem todos os cartões, e o fim do rebate, espécie de bônus que as empresas de tíquete davam às empregadoras para conseguir fechar o contrato. Mas não havia determinação de qual órgão regulamentaria as novas regras.

No parecer, o senador Mecias de Jesus estabelece que as transações de pagamento necessárias para o cumprimento da lei integram o âmbito de regulação do Sistema de Pagamentos Brasileiros (SPB). “A legislação é clara quanto à competência do BC para disciplinar arranjos de pagamentos. E, por consequência, teremos assegurada a participação do BC para a regulamentação”, disse o senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR) na apresentação do relatório.

No início deste ano, o BC indicou que não tinha competência para tratar de benefícios ao aprimorar a regulação relativa ao auxílio alimentação em arranjos de pagamento. Com a mudança, o BC deixou claro que esses arranjos não faziam parte do SPB.

Na terça-feira, o Ministério do Trabalho recomendou “abandonar” neste momento o dispositivo, que permite que os trabalhadores escolham a bandeira do vale.

Segundo disse o auditor fiscal do trabalho da pasta, Marcelo Naegele, a regulamentação do dispositivo é complexa e a portabilidade poderia ficar para um momento futuro, se as demais mudanças não alcançassem o objetivo de baixar as taxas cobradas pelas empresas de tíquete. Segundo ele, só a abertura dos arranjos de pagamento e a interoperabilidade já poderiam gerar economia de R$ 7,5 bilhões em taxas, que giram em torno de 6% a 13%, de acordo com estudo da LCA Consultores.

Apesar de manter a portabilidade na lei, o relator aumentou o prazo para regulamentação e também permitiu que a possibilidade seja vedada por acordos coletivos de trabalho. Se aprovado pelo Congresso, o prazo para regulamentação desse dispositivo passaria de 1º de maio do ano que vem para 31 de dezembro de 2024. “Dada a complexidade dos temas é de extrema relevância o adiamento da regulamentação”, disse o relator, acrescentando que vai permitir o aprofundamento técnico sobre o assunto.

Sobre as negociações coletivas, o texto do parecer diz que “ao considerarem a adequação setorial negociada, poderão vedar a portabilidade”. “Compreendemos que as negociações coletivas são propícias para o adequado balanceamento da medida.”

A Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT) é contrária à portabilidade, com o argumento de que pode criar uma competição desleal no mercado e prejudicar empresas menores. Há receio no setor de que o mercado seja dominado por gigantes de tecnologia ou do mercado financeiro.

Da mesma forma, a associação que representa os bares e restaurantes, a Abrasel, defendia a vedação total da portabilidade porque criaria uma “guerra de cashbacks” que tenderia a onerar mais o setor. Já a Zetta, que representa empresas como Ifood e Caju que já têm cartões de benefícios – além de Nubank e Mercado Pago, por exemplo -, acredita que a portabilidade empodera o trabalhador e aumenta a competição no mercado, o que deve gerar redução de taxas.