A participação do Cabo Daciolo (Patriota) no primeiro debate televisivo entre os presidenciáveis na TV Bandeirantes, na quinta-feira 9, deu o que falar. Ele fez Ciro Gomes (PDT) parecer comedido e Jair Bolsonaro (PSL), quase um estadista. Dono de inexpressivos 1,2% das intenções de voto no último levantamento da Paraná Pesquisas, o candidato chamou para si quase todas as piadas em um debate que, de resto, foi morno. Tudo começou quando ele afirmou que Ciro fazia parte de uma conspiração para a criação de um estado comunista sem fronteiras no continente, a “União das Repúblicas Socialistas da América Latina, a U.R.S.A.L.”. No dia seguinte, o termo estava entre os mais comentados do Twitter mundial. Para constar, Ursal é uma sigla fictícia criada em 2001, pela socióloga Maria Lúcia Victor Barbosa, que criticava a resistência das esquerdas em apresentar alternativas viáveis à Área de Livre Comércio da Américas (ALCA). Ou seja, é uma ironia ressuscitada enquanto paranoia.

Diante de tanta gozação, Daciolo gravou um vídeo divulgado na segunda-feira 13, em que afirmava estar em uma montanha jejuando. Evangélico neopentecostal, também disse ser perseguido pela maçonaria e pelos Illuminati, suposta sociedade secreta citada desde o século 18. “Eles querem me matar. Mas aqui não toca, só com autorização divina”, disse. Sua promessa de campanha é a expulsão das sociedades secretas da “nação brasileira”. Daciolo também jurou acordar cercado de anjos e falar com Jesus. “Satanás quer colocar a ideologia de gênero nas escolas”, afirmou sobre o ensino de respeito às minorias LGBT em salas de aula.

“A estratégia é ficar nos montes orando. Eles querem me matar. Mas aqui não toca, só com autorização divina” Cabo Daciolo, após o debate na Band

Essas não são as primeiras declarações estapafúrdias desse ex-bombeiro militar de 42 anos, eleito deputado federal pelo Rio de Janeiro em 2014, com 50 mil votos. Em novembro de 2016, ainda no PTdoB, Benevenuto Daciolo Fonseca dos Santos foi à tribuna conclamar o presidente Michel Temer: “abandone o satanismo”. Em julho do ano passado, ele se atrapalhou ao filosofar sobre sua atuação. “Deus e religião não combinam. Política e religião não combinam. Agora, política e Deus combinam”, disse. O deputado também cometeu uma grosseria. De Bíblia na mão, profetizou a “cura” da colega Mara Gabrilli (PSDB-SP), tetraplégica em decorrência de um acidente automobilístico.

Expulso do PSOL

A pregação contra as pautas de esquerda não é coisa nova. O problema é que surgiram justo quando ele militava no PSOL, partido que o acolheu após liderar a greve dos bombeiros do Rio, em 2011. Recém empossado, em março de 2015 defendeu a soltura de doze PMs suspeitos do desaparecimento do pedreiro Amarildo Dias de Souza, ocorrido na Rocinha. Logo depois, propôs uma emenda para alterar o primeiro parágrafo da Constituição. No lugar de “todo poder emana do povo”, queria “todo poder emana de Deus”. Foi expulso do PSOL em menos de seis meses. Simpático à bancada da bala, declarou: “Bandido bom é bandido lavado e remido no sangue do Senhor Jesus”. Seja lá o que isso quer dizer, convenceu eleitores, pois supera candidatos sérios como João Amoedo (Novo) e Henrique Meirelles (MDB).