Deflagrada na manhã desta quinta-feira, 8, a Operação da Polícia Federal (PF) que mira ex-ministros, aliados políticos e o próprio ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) recebe o nome de Tempus Veritatis. Segundo a PF, trata-se de uma expressão em latim que significa “hora da verdade”. A ação apura a organização criminosa responsável por atuar em tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito, depois das eleições de 2022.

Um dos alvos da Tempus Veritatis é Filipe Martins, ex-assessor especial de Assuntos Internacionais da Presidência no governo Bolsonaro. Preso nesta manhã, ele era conhecido por publicar frases em latim no X (antigo Twitter). Em agosto de 2020, por exemplo, Martins publicou na rede social um mote em latim utilizado como lema do grupo neonazista britânico Combat 18.

Acusado de fazer alusão ao grupo extremista, Martins negou a relação. Meses depois, em março de 2021, o então assessor de Jair Bolsonaro ajeitou o paletó juntando as pontas do indicador e do polegar, como se emitisse um sinal de “ok”. Para o Ministério Público Federal (MPF), o sinal buscou reproduzir um acrônimo formado pelas letras “W” e “P”, aludindo à expressão racista White Power (“Poder Branco”, em inglês). Ele é investigado por suposta analogia a grupos racistas.

Expressão faz sentido em latim, diz especialista

De acordo com especialistas consultados pelo Estadão, a expressão com a qual a Polícia Federal batizou as diligências não é consagrada na língua, mas isso não quer dizer que esteja incorreta – pelo contrário. Ricardo da Cunha Lima, professor de Latim da Universidade de São Paulo (USP), não localizou a expressão “tempus veritatis” de forma exata em autores clássicos, renascentistas ou mesmo na bíblia em latim. Mas atesta que os policiais estão de acordo a norma culta. “A criação seguiu corretamente a gramática da língua e faz sentido em latim”, diz Cunha Lima.

“Se trata de expressão correta e possível, ainda que não seja consagrada ou especialmente célebre”, afirmou Marcelo Vieira Fernandes, também professor de Latim na USP. Por mais que a expressão não tenha sido localizada de forma exata, há outras frases semelhantes que possuem lastro nos documentos. “No texto latino da bíblia vulgata, há expressões como ‘verbum veritatis’, ‘a palavra da verdade’, e ‘via veritatis’, ‘o caminho da verdade’”, observa Vieira Fernandes.

Operações são batizadas com sátiras

É comum que os nomes das operações da PF sejam satíricos ou tenham sentidos figurados. Exemplos recentes são a Operação Última Milha, deflagrada em outubro de 2023 e cujo foco foi um núcleo de informações “paralelo” que teria se instalado na Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Uma das peças-chave dessa investigação é um programa chamado “FirstMile”, algo como “primeira milha”, em tradução livre do inglês.

Em dezembro do ano passado, a PF cumpriu mandados de busca e apreensão contra os endereços de Lucinha, deputada estadual do Rio de Janeiro (PSD). Nesta ocasião, a investigação foi denominada como “Operação Batismo”, em alusão ao fato apurado nas diligências de que a deputada era chamada por milicianos de “madrinha”.