BELEZA Com duas chaminés, um farol e dois estribos, a Baroneza corria sobre trilhos de bitola indiana (Crédito:Divulgação)

O Brasil tem uma incrível história ferroviária e uma das dez maiores malhas do mundo, com cerca de 30 mil quilômetros. Algumas estradas de ferro do País, como a Santos-Jundiaí e a Curitiba-Paranaguá são obras espetaculares de engenharia do século 19 que impressionam até hoje. Circularam por aqui também algumas poderosas máquinas a vapor construídas com a tecnologia mais avançada que havia no passado. Uma delas ­­­— a mais preciosa ­ — é a Baroneza, locomotiva fabricada na Inglaterra em 1852, há 170 anos, pela empresa William Fair Bairns & Sons, de Manchester. Quem a comprou foi o empresário Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, que a colocou para rodar dois anos depois, a partir da inauguração da Estrada de Ferro Petrópolis, a primeira do País, usada por Dom Pedro II. Por 30 anos, a locomotiva serviu o imperador. Agora, ela deveria estar brilhando no Museu do Trem do Engenho de Dentro, no Rio, que abriga um acervo magnífico herdado da antiga Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA). Mas o museu, instalado ao lado do Estádio do Engenhão, está abandonado e seus mais de mil itens jogados às traças e distantes do público.

O esquecimento da locomotiva, que recebeu o nome em homenagem à Maria Joaquina Machado de Souza, esposa do barão, mostra mais uma vez que, se tem história, o País não tem memória. A inauguração da ferrovia Rio-Petrópolis, em 1854, no trecho entre o Porto de Mauá e Fragoso, em Magé, com 14,5 quilômetros, é um marco da economia e uma revolução no transporte nacional. Na mesma ocasião, Dom Pedro II concedeu o título de barão a Evangelista de Souza. Com 7,5 metros de comprimento, 2,5 metros de largura e 17 toneladas de peso, a Baroneza corria sobre trilhos de bitola indiana e alcançava a altíssima velocidade de 36 Km/h. Além dela, o museu do trem, que abriga cerca de mil itens, esconde hoje outras relíquias, como o Carro Imperial, fabricado na Bélgica, em 1886, para servir a Dom Pedro II já no fim do seu reinado, o Carro do Rei Alberto, que fez parte de uma composição adaptada para atender o monarca belga quando ele veio ao Brasil em viagem oficial em 1922, e o Carro Presidencial, vagão usado por Getúlio Vargas em suas viagens pelo Brasil.

INOVAÇÃO O Barão de Mauá foi o empreendedor responsável
pela instalação da primeira ferrovia do país (Crédito:Divulgação)

O museu está fechado desde maio de 2019 para visitantes e, segundo o Iphan, não há qualquer perspectiva de reabertura em um período próximo. A verdade é que a instituição, instalada no antigo galpão de pintura da antiga Estrada de Ferro Pedro I, corre o sério risco de desaparecer. Em 2013, ela chegou a ser selecionada para ser restaurada com verbas do PAC, mas o governo federal nunca repassou dinheiro ao Instituto. Para o historiador Bartolomeu Homem d’El-Rei Pinto, seu último diretor, o museu está na iminência de acabar, apesar do preciso acervo. “Não vislumbro qualquer interesse por parte dos governantes e gestores em preservar a memória histórica e patrimonial do País”, diz. “Para voltar a funcionar ele precisa de uma reforma geral. Foi gasta uma grandiosa quantia para que uma empresa fizesse um projeto de reforma que acabou ficando só no papel”. Em 2014, quando dirigia o museu, d’El-Rei Pinto já denunciava o abandono da instituição e sua falta de visibilidade para os turistas do Rio e de todo o Brasil. Agora, ele está quase certo de que o museu irá fechar por falta de mão-de-obra capacitada. Será um crime privar o público da história das ferrovias brasileiras e da visão da Baroneza, monumento cultural tombado pelo próprio Iphan.