Resumo:

  • Nove membros da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) foram presos pela Polícia Federal na Operação Sequaz, que interrompeu planos para sequestros e assassinatos de autoridades.
  • Sergio Moro, ex-juiz federal e ex-ministro da Justiça, era um dos alvos da facção, junto a outras autoridades públicas.
  • O ex-ministro defendeu a necessidade de políticas rigorosas para combater as facções e afirmou que a classe política e as autoridades de investigação não devem ceder às ameaças.
  • O PCC também planejou o resgate do seu líder, Marcola. A facção teria investido R$ 5 milhões para tentar libertá-lo.

A Polícia Federal deflagrou nesta quarta-feira, 22, a Operação Sequaz e prendeu nove integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) que planejavam assassinar e sequestrar autoridades em São Paulo, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Paraná e Distrito Federal. O senador Sérgio Moro (União-PR), ex-ministro da Justiça no governo Bolsonaro, era um dos alvos da facção. Os criminosos se referiam ao ex-juiz pelo codinome “Tóquio”.

Os atentados contra autoridades tinham também como alvo o promotor Lincoln Gakiya – que investiga o grupo criminoso há cerca de 20 anos -, além de agentes penitenciários e policiais de Mato Grosso e de Rondônia. A facção estabeleceu como Plano A – o objetivo principal dos bandidos – o resgate de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder do grupo. Os investigadores calcularam que o PCC gastou aproximadamente R$ 5 milhões apenas na articulação para tentar libertar Marcola, que está preso desde julho de 1999.

A ordem para a operação da PF partiu da juíza Gabriela Hardt, que foi substituta de Moro na 13.ª Vara Federal Criminal de Curitiba na Operação Lava Jato. Em pronunciamento na tribuna do Senado, Moro disse que a classe política e os órgãos de investigação não podem se “render” ou “retroceder” a ameaças e devem adotar “políticas rigorosas” de combate às facções.

“Se eles vêm pra cima da gente com uma faca, a gente tem que usar um revólver. Se eles usam um revólver, nós temos que ter uma metralhadora. Se eles têm uma metralhadora, nós temos que ter um tanque ou um carro de combate. Não no sentido literal, mas nós precisamos reagir às ações do crime organizado”, afirmou.

Moro soube em janeiro que era um dos alvos do PCC. Isso aconteceu quando Gakiya e o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Luiz Sarrubbo, levaram a Brasília as informações de uma testemunha protegida ouvida pelo Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (Gaeco): o senador, sua mulher, a deputada federal Rosângela Moro (União-SP), e os dois filhos do casal estavam sendo seguidos pela “Sintonia Restrita”, o setor de operações especiais do PCC.

Monitoramento

Os criminosos comandados por Janeferson Aparecido Mariano, conhecido como Nefo ou NF, receberam há seis meses a ordem para monitorar o alvo. Alugaram chácaras na região de Curitiba. Segundo o ministro da Justiça, Flávio Dino, em uma das chácaras “havia compartimentos sendo preparados em casas. “Compartimentos falsos, paredes falsas. E eles poderiam ser desde para armazenar armamento, droga, como para guardar pessoas.”

Nefo também alugou uma casa perto da residência dos Moro e uma sala comercial ao lado do escritório político do senador, em Curitiba. Os integrantes do PCC fotografaram o cotidiano do casal e dos filhos. Escola, academia, compras e reuniões: tudo foi acompanhado pelos criminosos.

O grupo tinha entre seus integrantes ainda Reginaldo Oliveira de Sousa, o Rê, da “Sintonia Final dos 14” – grupo responsável pelas ordens dirigidas aos membros do PCC que estão em liberdade. Eles teriam providenciado carros blindados para a ação. Investigadores desconfiam que toda a vigilância sob a família Moro tinha como provável objetivo o sequestro do senador, da deputada e dos filhos, que seriam mantidos reféns em uma das chácaras, para obrigar o Estado a negociar a libertação de Marcola. Não descartam, entretanto, a possibilidade de a facção planejasse matar Moro.

Honra

“O resgate de Marcola é questão de honra para o PCC. Dinheiro tem de sobra”, disse o promotor Gakiya ao Estadão. O ataque às autoridades era o chamado Plano B da facção. Ele estava pronto para ser executado quando o promotor e Sarrubbo chegaram a Brasília. Além de informar a cúpula da PF sobre o caso, os dois também avisaram a Polícia Legislativa. Foi quando Moro e sua mulher souberam que eram o alvo e passaram a ser escoltados.

“Nós acreditamos que ele (o plano) só não foi posto em prática porque faltou a ordem do Marcola”, afirmou o promotor. Após o alerta dado pelo promotor, a PF passou a monitorar telefones e obteve quebras de sigilo para localizar os envolvidos. Antes, há dois meses, um dos principais implicados na ação foi detido em São Paulo pelas Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota). Era Valter Lima Nascimento, o Guinho, outra liderança da Sintonia Restrita.

É Gakiya quem explica o que é a tal sintonia: “Eles são responsáveis apenas por assassinatos e resgates. Não se envolvem em outras atividades, exceto o tráfico de drogas.” Nefo e Ré foram presos ontem pela PF. O primeiro estava na região de Campinas, no interior, e o segundo, na Baixada Santista. Em nome de laranjas e familiares, Nefo teria um patrimônio que incluiria lancha, carros importados e imóveis. “Coisa de milhões.”

Há mais de um ano, a inteligência do Departamento Penitenciário Federal e a PF acompanhavam as movimentações de Marcola e de outros presos da facção na penitenciária federal de Brasília. O resgate envolvia o treinamento de mercenários na Bolívia e a ação de integrantes do Novo Cangaço.

Em razão da descoberta do plano, Marcola foi transferido em março de 2022 para o presídio federal de Rondônia, onde a organização criminosa traçou um novo planejamento para a fuga de seu líder. Ao mesmo tempo, resolveu cobrar seus integrantes pelo fracasso da operação. Marcos Roberto de Almeida, o Tuta, que tinha recebido a missão de libertar o chefe, foi sequestrado na Bolívia, em maio de 2022, e levado a um tribunal do crime. Desde então, está desaparecido.

A responsabilidade para soltar Marcola passara, então, para Guinho e, depois, para Nefo. Marcola ficou em Rondônia até janeiro deste ano, quando foi levado de volta à Brasília, após a conclusão da construção de uma muralha no presídio. Foi só então que a facção teria começado a discutir a execução do plano B. Mas era tarde. A ideia de apanhar Moro já havia chegado ao Ministério Público.

Ontem, 120 agentes foram às ruas e vasculharam 24 endereços ligados aos investigados.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.