Os EUA e a ex-URSS transformaram a astronomia em sinônimo de conquista espacial e aquilo que era ciência tornou-se uma das trincheiras da chamada Guerra Fria — se tais trincheiras estiveram presentes na política, diplomacia, em batalhas com tanques e fuzis, guerrilhas, espionagens, e até na moda e competições de xadrez, é claro que se fariam notar também em um dos mais remotos hábitos humanos: o de olhar para os céus e indagar se existe vida fora da Terra. Para tentar responder a essa questão com rigor metodológico a astronomia tinha, no entanto, de retornar ao seu patamar científico. Retornou e, atualmente, uma de suas máximas expressões é a sonda Juno, da Nasa, que orbita o planeta Júpiter desde 2016. Na semana passada, Juno conseguiu o inimaginável: passou a apenas trezentos e cinquenta e dois quilômetros de Europa, uma das oitenta luas jupiterianas.

“Dentre as suas oitenta luas, Júpiter tem quatro principais. Elas guardam papel relevante para o conhecimento científico e a evolução da humanidade” Roberto Costa, professor de astronomia da USP

Voando a quarenta e oito mil quilômetros por hora, Juna registrou quatro imagens de Europa. Somente quatro? Sim. E isso é um grande feito? Mais uma vez, sim. “As fotos são deslumbrantes”, exultou a cientista Candice J. Hansen-Koharcheck, do Instituto de Ciência Planetária em Tucson, no Arizona. Pelas imagens, conforme explica o professor de astronomia da USP Roberto Costa, confirma-se o que era hipótese: há oceanos de gelo envolvendo Europa, com profundidade de até vinte quilômetros. Se um dia o homem conseguir vencer esse hoje insuperável obstáculo verá então aquilo que os sensores da sonda, exemplo do que há de ferramenta tecnológica mais avançada nessa área, acabam de ver: sob o gelo há água em estado líquido e com atividade vulcânica, em fenômenos similares aos da Terra.

Pode-se novamente recorrer-se a uma indagação: qual a importância? Aonde há água pode haver vida, isso é regra. Existe, portanto, vida microbiana nos aproximadamente três mil e cem quilômetros de diâmetro da lua Europa, principal satélite natural de Júpiter. As recentes imagens também auxiliarão os astrônomos que já estão trabalhando em outra missão da Nasa, prevista para ser lançada daqui há dois anos e que sobrevoará Europa – “uma cápsula de gelo com oceanos muito mais profundos que os da Terra”, pela definição do astrônomo Costa.

Colaborou: Fernando Lavieri