O PSDB ainda não cicatrizou as feridas sofridas pela maior derrota dos últimos 30 anos, mas já discute as razões que o levaram ao fracasso eleitoral e repensa os caminhos a fim de se transformar num partido antenado com os anseios do eleitor, mais jovem e comprometido com as novas práticas políticas. Em outubro, o candidato do partido à Presidência da República, Geraldo Alckmin, fez apenas 4% dos votos, ficando na rabeira entre os 13 candidatos ao Planalto. Um vexame, para quem detinha o maior tempo de rádio e TV e a maior aliança com partidos de centro – um total de nove legendas. A tragédia anunciada ocorreu mais pela insistência de Alckmin, então presidente nacional do partido, em manter uma candidatura já fracassada no nascedouro. O eleitor havia deixado claro o desejo pelo novo, mas Alckmin fez ouvidos moucos, preferindo insistir em velhas práticas desbotadas pelo tempo. Passados 20 dias da malsucedida empreitada, o PSDB já deu um cavalo de pau na condução da sigla, a começar pela direção nacional. Quem distribui as cartas do novo jogo é o futuro governador de São Paulo João Doria, eleito com 11 milhões de votos.

JANTAR INDIGESTO Doria e Alckmin se reúnem em São Paulo na quinta-feira 8 para discutir o futuro do PSDB (Crédito:Divulgação)

Sangue novo

Doria, que em dois anos se elegeu prefeito da maior cidade brasileira e governador do Estado mais importante do País, se credenciou para ser o novo comandante do partido, embora ele faça questão de refutar o papel de “dono” da agremiação. “O PSDB tem líderes, não donos”. Mesmo assim, está usando a grande vitória em São Paulo para chamar para ele a responsabilidade de “salvar o partido”. Para isso, conta com a ajuda de outros “vitoriosos”, como os governadores eleitos do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja. “Precisamos desse sangue novo para colocar o PSDB em sintonia com a realidade. Quero que o PSDB saia do quinto andar e passe a freqüentar o chão de fábrica para compreender a real dimensão da pobreza e da miséria”.

Nesse contexto, Doria defende a necessidade de se substituir o atual presidente nacional, Geraldo Alckmin, por alguém da nova geração do PSDB, como o deputado Bruno Araújo, ex-ministro das Cidades. “Não há necessidade de desqualificar a história e a biografia de ninguém, sobretudo a de Alckmin, que foi um grande governador, com trajetória ilibada dentro da vida política, mas Bruno Araújo é jovem, com três mandatos de deputado e foi ministro, sempre cumprindo suas atribuições com competência”. Para Doria, Bruno exibe “espírito moderno e está sintonizado com a perspectiva de renovação do partido”. Está pronto para ser o novo presidente do PSDB.

Araújo é um dos “cabeças pretas” (nova geração), comprometidos com as mudanças no partido. “O recado da eleição é inquestionável: o estilo e o conteúdo tradicionais da política foram rechaçados. Vamos nos reorganizar com serenidade, sem divisionismo e sem buscar bodes expiatórios”, disse ele.

A percepção de que o partido precisa mudar não é apenas de Doria ou de Araújo. Há duas semanas, os líderes do PSDB receberam um diagnóstico apontando as causas da derrota e o que o partido deve fazer para empreender uma guinada. O documento foi elaborado pelo secretário-geral do partido, Marcus Pestana, e encaminhado a Alckmin, ao senador Tasso Jereissati, ao ex-presidente Fernando Henrique e outros “cabeças brancas” do partido. “O PSDB precisa se transformar para sobreviver. Ou nos enraizamos solidamente na sociedade, construindo um partido com vida intensa, ou seremos dizimados”, diz Pestana.

Mudar a tendência do partido é um dos caminhos. Segundo Alberto Goldman, membro da Executiva Nacional, “terminou o ciclo social-democrata do PSDB”. Goldman tornou-se “inimigo” de Doria, que pediu a expulsão de Goldman da legenda por ele ter trabalhado contra sua eleição em São Paulo, aliando-se ao governador Márcio França (PSB). Doria vai comprar outras brigas. Quer também que na reformulação do partido, políticos envolvidos com corrupção, como é o caso do senador Aécio Neves (MG), deixem o tucanato. Assim, o PSDB trilhará rumo à centro-direita, o que o aproximará do governo Bolsonaro. “Vamos torcer para o quanto melhor, melhor, e não para a trágica visão dos partidos de esquerda do quanto pior, melhor”. O apoio a Bolsonaro provoca calafrios nos “cabeças brancas”. Sinal de novos tempos no ninho tucano, em que os pássaros de penas brancas já não gorjeiam como antes.

Sob nova direção
O PSDB nacional prepara-se para mudar de comando

A SAÍDA DE ALCKMIN
Em maio, a presidência nacional do PSDB deve mudar de mãos. O atual presidente, o ex-governador Geraldo Alckmin, deverá deixar o cargo. Como candidato a presidente, sofreu a maior derrota do PSDB em 30 anos

O SUBSTITUTO
Em seu lugar, deve assumir o deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), que é o candidato do governador eleito de São Paulo João Doria e de outros importantes tucanos que saíram vitoriosos nas urnas em outubro

DISSIDENTE
Quando as lideranças tucanas levaram o PSDB a apoiar o governo Temer, Bruno Araújo era ministro das Cidades. Quando houve o caso das gravações de Joesley Batista, deixou o ministério e abriu dissidência no PSDB

PADRINHO
Doria tem dito que para mudar o PSDB, não é preciso achar culpados pela derrota presidencial em 2018, mas o fato é que ele se empenha em tirar o partido das mãos de Geraldo Alckmin, que foi seu padrinho político

AS MUDANÇAS
Os tucanos liderados por Doria querem reformular o PSDB nacional, levando-o a deixar a posição social-democracia para engajar-se na centro-direita, inclusive com o apoio ao novo governo de Jair Bolsonaro

(Colaborou André Vargas)