A opositora María Corina Machado descartou, nesta segunda-feira (29), desistir de sua candidatura, após uma sentença judicial que a tornou inelegível para as eleições presidenciais deste ano.

O Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), de viés governista, selou na sexta-feira sua inabilitação política por 5 anos, o que na prática a impediria de participar do pleito.

“Nicolás Maduro não vai escolher o candidato do povo porque o povo já escolheu seu candidato, ponto”, disse Machado a seus apoiadores três dias depois da sentença, que tachou de “decisão grotesca”.

“Recebi o mandato de quase três milhões de venezuelanos, que exerceram a soberania popular em 22 de outubro” nas primárias de 22 de outubro, as quais venceu com 92% dos votos. “Eu represento essa maior soberania popular. Não podem fazer eleições sem mim”, sentenciou, descartando, ao mesmo tempo, escolher um substituto.

O TSJ tomou a decisão no âmbito de um mecanismo criado sobre pressão dos Estados Unidos para que os candidatos inabilitados pudessem impugnar a sanção, em meio aos acordos assinados em Barbados pelo governo e a oposição em um processo de negociação mediado pela Noruega.

Estes acordos incluem, ainda, a realização das eleições presidenciais no segundo semestre do ano – ainda sem data – com observadores da União Europeia e outros atores internacionais.

Maduro, no poder desde 2013, não confirmou sua candidatura, embora apareça como candidato natural do chavismo.

As inabilitações políticas são uma antiga arma do chavismo para tirar seus adversários do caminho. São impostas pela Controladoria, facultada por lei para adotar medidas contra funcionários sob investigação, embora a Constituição estabeleça que apenas uma sentença judicial definitiva impeça alguém de se candidatar à Presidência.

– “Nunca” notificada –

Machado foi inabilitada por um ano em 2015 por assistir como “embaixadora alternativa” do Panamá a uma reunião da Organização dos Estados Americanos, onde denunciou supostas violações dos direitos humanos durante os protestos daquele ano, que pediam “a saída” de Maduro e deixaram 40 mortos.

Mas a sanção foi estendida a 15 anos em junho passado, no auge de sua campanha das primárias.

A Sala Político Administrativa do TSJ validou os argumentos da Controladoria para sancionar a política liberal de 56 anos por ser “partícipe do esquema de corrupção”, vinculado ao líder Juan Guaidó, reconhecido como presidente pelos Estados Unidos entre 2019 e 2023 com a gestão de recursos bloqueados no exterior, e “propiciou o bloqueio criminoso” e “o despojo descarado das empresas e riquezas do povo venezuelano no exterior”.

Machado afirma que “nunca” foi notificada do ato administrativo contra ela e não pôde se defender.

A delegação da oposição na mesa de negociações exigiu no sábado que a decisão fosse revertida e antecipou que denunciaria a situação perante a Noruega, assim como diante dos governos de Brasil, Colômbia e França, também envolvidos no processo de diálogo.

Enquanto isso, a representação do governo considera a decisão “coisa julgada” e vira a página sobre Machado. “Houve um mecanismo de forma voluntária, quem quis recorrer, recorreu e, além disso, se comprometeu a respeitar o resultado. Isso é passado, bem passado já”, disse Jorge Rodríguez, líder desta delegação.

“Já é coisa julgada e não há nada a falar sobre isso”, insistiu o também chefe do Parlamento, ao considerar que a oposição está sendo “profundamente arrogante” por acreditar que “um sobrenome pode substituir a Constituição”.

– UE, “muito preocupada” –

Nesta segunda, a União Europeia se declarou “muito preocupada” pela decisão do Supremo, que também ratificou uma inabilitação contra o duas vezes candidato à Presidência Henrique Capriles.

“As decisões destinadas a impedir que membros da oposição exerçam seus direitos políticos fundamentais só podem socavar a democracia e o Estado de Direito”, afirmou, em nota.

O advogado constitucionalista, Juan Manuel Rafalli, explicou à AFP que Machado poderia “tentar uma ação de amparo constitucional contra a decisão adotada ou pedir a nulidade do ato administrativo”.

“Mas isto é um problema político, não é um problema jurídico”, insistiu. “Se não houver um poder judiciário independente, autônomo (…) você nunca vai ter uma resposta favorável”.

O diálogo entre o governo e a oposição começou em agosto de 2021 e foi paralisado em duas ocasiões antes da assinatura do acordo em Barbados. Nenhuma das partes expressou a intensão de se levantar da mesma até o momento.

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