Oitenta anos depois de sua execução pelos nazistas, a França prestou homenagem, nesta quarta-feira (21), a 24 estrangeiros membros da Resistência, cujas histórias entraram para a posteridade com a chegada dos restos mortais do mais famoso deles, Missak Manouchian, ao Panteão nacional.

Sob uma chuva persistente e em meio a aplausos, os restos mortais de Manouchian e de sua esposa, Mélinée, percorreram, sob os ombros dos soldados da Legião Estrangeira, centenas de metros das ruas de Paris rumo ao “Templo dos Imortais”.

“Estou certo de que o povo francês e todos os combatentes da Liberdade vão saber honrar nossa memória dignamente”, escreveu este apátrida em sua última carta à esposa, lida no início da cerimônia. Seu prognóstico se cumpriu oito décadas depois.

Gritados um a um, os nomes de Manouchian e de seus 23 companheiros de armas, entre eles Joseph Epstein, Golda Bancic, Rino Della Negra e Celestino Alfonso, romperam o silêncio.

“A França, agradecida, os acolhe”, concluiu o presidente francês, Emmanuel Macron, após enaltecer a “odisseia da liberdade” destes “estrangeiros e, no entanto, irmãos”, “por tempo demais confinados no esquecimento”.

Milhares de estrangeiros – judeus do leste europeu e da Europa Central, republicanos espanhóis que fugiam do franquismo, italianos antifascistas, etc, – lutaram na clandestinidade na França contra o nazismo durante a Segunda Guerra Mundial.

Mas, a partir de 1960, o então presidente Charles de Gaulle decidiu “estruturar” a memória oficial do conflito, deixando “um pouco esquecidos” os resistentes “estrangeiros, comunistas e judeus”, explicou à AFP Jean-Baptiste Romain, diretor dos sítios memoriais da região de Paris.

Para simbolizar seu retorno, Macron escolheu a figura do mais famoso, o armênio Manouchian. Este apátrida, que sobreviveu aos massacres armênios no Império Otomano, se uniu à resistência na França e organizou ataques contra as forças alemãs até ser detido em novembro de 1943.

Esta reunião da resistência “gaullista” e comunista começou na véspera, quando o caixão de Manouchian recebeu homenagens no Memorial do Monte Valérien, nos arredores de Paris, onde foi fuzilado em 21 de fevereiro de 1944, juntamente com grande parte de seu grupo.

– “Grande herói” –

Embora seus restos não entrem no Panteão, o nome de 22 membros de seu grupo, FTP-MOI (Franco-atiradores e Partidários – Mão de Obra Imigrante, em tradução livre), assim como o líder dos FTP da região de Paris, Joseph Epstein, serão gravados no templo que homenageia os personagens ilustres da França.

“É uma alegria. É como se meu pai entrasse no Panteão”, disse à AFP Georges Duffau-Epstein, de 82 anos, único filho vivo dos 24 resistentes homenageados. A homenagem é ainda mais necessária oito décadas depois, quando as ideias da extrema direita avançam na Europa, advertiu.

A presença na cerimônia da líder da extrema direita francesa, Marine Le Pen, gerou mal-estar entre os familiares e os impulsionadores da homenagem, que destacaram que seu partido foi fundado por “nazistas e colaboracionistas” franceses.

“Sou filho de imigrantes, meus pais eram poloneses, e se Marine Le Pen tivesse estado no poder, nunca teriam podido viver na França”, criticou Duffau-Epstein, que tinha apenas dois anos quando seu pai foi fuzilado.

Os descendentes esperaram 80 anos por esta homenagem e para curar as feridas de seus sacrifícios para libertar a França, caso de Juana Alfonso, neta do espanhol Celestino, um dos “panteonizados” e cujo trágico fim marcou a vida de seu pai, Juan. “Meu pai morreu muito cedo, com 33 anos, de dor”, assegura à AFP.

“Fico triste de que meu pai não veja isto porque precisava por todo o sofrimento que viveu”, afirmou sobre a homenagem esta diretora de creche de 57 anos, para quem seu avô, que lutou na Guerra Civil Espanhola antes de entrar na resistência, era um “grande herói”.

O nome de Celestino já foi imortalizado no “Affiche Rouge” – cartaz vermelho de propaganda nazista contra o “exército do crime” de Manouchian -, mas Juana tenta há anos que a cidade de Paris dedique o nome de uma rua a ele.

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