Integrantes do governo Lula (PT) e aliados que defendem a indicação do ministro-chefe da AGU (Advocacia-Geral da União), Jorge Messias, à vaga aberta no STF (Supremo Tribunal Federal) pela aposentadoria de Luís Roberto Barroso utilizam a religião como argumento.
Fiel da Igreja Batista Cristã, Messias é uma das raras pontes entre o petista e a comunidade evangélica. A avaliação é de que a religião, seguida por 26,9% da população brasileira, está subrepresentada na corte, onde tem somente André Mendonça, pastor da Igreja Presbiteriana de Pinheiros; o mesmo entendimento leva a crer que Lula, católico, precisa se aproximar do segmento com as eleições de 2026 em vista.
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O desafio cristão de Lula
Em 2022, o presidente se elegeu sem ter maioria entre os evangélicos, que preferiram o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), também católico e responsável pela indicação de Mendonça. Desde que governa, Lula não melhorou a interlocução com os crentes e pesquisas mostram um avanço tímido sobre esse eleitorado.
Lideranças religiosas dizem que o único gesto do mandatário neste sentido foi a sanção do Dia Nacional da Música Gospel, celebrado com uma roda de oração no Palácio do Planalto. Como relatou a IstoÉ, no entanto, o petista apenas avalizou uma lei aprovada com ampla margem no Congresso.
Nos últimos meses, o presidente chegou a participar do podcast Papo de Crente e a primeira-dama, Rosângela da Silva, passou a realizar encontros periódicos com mulheres evangélicas. Os movimentos não mudaram a percepção de que o diálogo se restringe aos crentes progressistas — que, portanto, já são simpáticos ao petismo.
Um elo sob questão
Ao longo do mandato, Messias se manteve como uma espécie de “ponte solitária” do governo com as lideranças e representou Lula nas três edições da Marcha Para Jesus realizadas em São Paulo. Em 2023, chegou a ser vaiado pelo público ao mencionar o chefe; em 2024, foi abraçado por Estevam Hernandes, apóstolo da Igreja Renascer em Cristo, organizador do evento e simpático à oposição.
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Para Vinícius do Valle, ex-diretor do Observatório Evangélico e autor de “Entre a religião e o lulismo” (Recriar, 2019), o ministro da AGU não é uma liderança evangélica, mas um “evangélico comum, que vai ao templo do seu bairro”. Seu peso político no segmento, porém, vem da “boa circulação” entre as lideranças, rara no grupo dos políticos progressistas.
O pesquisador lembra que, embora pastor, Mendonça também não era um representante proeminente dos crentes à altura da indicação, mas teve o nome defendido publicamente por pastores de grandes denominações pela proximidade com o bolsonarismo. “Era muito difundido que o governo Bolsonaro era próximo dos evangélicos e dava espaço a eles nas políticas públicas e na alocação de cargos no Estado”, disse à IstoÉ.
Em declarações recentes, o bispo Robson Rodovalho, fundador da Sara Nossa Terra e figura constante na convocação de manifestações da direita, disse que Messias merece “crédito e respeito” para a vaga na corte. Já o pastor Silas Malafaia, presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo e aliado próximo de Bolsonaro, disse não ter “nada pessoal” contra o ministro.
Raio-X: o evangélico Jorge Messias
Chefe da Advocacia-Geral da União, o ministro é fiel da Igreja Batista Cristã, denominação protestante que, em diferentes comunidades, é a terceira em membros no país, depois das igrejas Pentecostais e das Assembleias de Deus. As duas primeiras concentram a maior parte dos crentes brasileiros e tiveram lideranças mais diretamente associadas, nos últimos anos, ao conservadorismo.
Ao participar de uma entrevista da Fundação Perseu Abramo, braço acadêmico do PT, com o objetivo de divulgar a fé evangélica de políticos de esquerda, Messias fez as seguintes defesas:
“O cristão verdadeiro é o primeiro a defender a família. Eu cresci em um lar cristão, e a família é a base de tudo para que a gente possa exercer nossa fé”.
“O olhar de Cristo para a humanidade é um olhar de misericórdia”.
“Se olharmos o processo de expansão da evangelização no mundo, com igrejas brasileiras que se internacionalizaram, nós vamos ter um encontro desse fenômeno com os primeiros anos do governo Lula. Foi quando mais enviamos missionários para fora do Brasil”.
“Eu, como cristão, seguindo o ‘ide’, tenho toda a alegria do mundo de evangelizar para converter outras pessoas a Jesus, mas faço isso pela minha fé, não pelo cargo que exerço em qualquer posição do Estado brasileiro”.