Mesmo sem contato com o apoio formal do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), descartou a possibilidade de desistir de sua pré-candidatura à presidência da República. Em entrevista à IstoÉ, o mineiro garantiu que a decisão está tomada tanto por ele quanto pelo partido e rechaçou a possibilidade de buscar a vice na chapa de centro-direita ou algum cargo no Legislativo.
Zema já almejava a presidência da República ainda em 2022, após ser reeleito governador de Minas. Desde então, corria por fora na busca pela preferência de Jair Bolsonaro para herdar o capital político após a condenação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por abuso de poder político e econômico. Sem ter o favoritismo – que sempre esteve com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), Romeu Zema passou a ser cotado para assumir a vice na chapa da centro-direita, como estratégia de angariar os votos dos dois maiores colégios eleitorais do país.
O mineiro chegou a ouvir sobre a possibilidade nos bastidores, disse respeitar o chefe do Palácio dos Bandeirantes, mas reforçou a manutenção da sua candidatura à presidência. Ele rechaçou qualquer possibilidade de se candidatar ao Senado, afirmando que tem um perfil ligado à gestão.
“Sou grande admirador do Tarcísio e mantenho excelente relação com ele. Agradeço muito a menção ao meu nome por parte dele ou de sua equipe. Como já mencionei, disputaremos esta eleição de forma alinhada. Tenho certeza de que, seja ele ou eu eleito, um convidará o outro para ser ministro. Estaremos juntos de qualquer forma – talvez não como presidente e vice, mas como presidente e ministro, função que ele inclusive já exerceu”, disse Zema.
“Não tenho perfil parlamentar – não é minha vocação ser deputado ou senador. Minha trajetória sempre foi prática, direta, de atuação concreta. Por isso, seguirei com minha pré-candidatura e candidatura até o fim, independentemente de quem seja o candidato. Essa é uma decisão minha e do Partido Novo”, concluiu.
Mesmo com o favoritismo de Tarcísio, Bolsonaro quebrou as bancas de apostas ao nomear seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), como o sucessor de seu capital político. Flávio estava longe das preferências do Centrão e do mercado financeiro, mas tem entrado em campo para viabilizar sua candidatura, apesar das dúvidas de caciques políticos sobre ela.

Romeu Zema, governador de Minas Gerais, em entrevista à IstoÉ
Para Zema, a escolha de Bolsonaro não interfere em sua candidatura. O governador voltou a defender a pulverização de candidaturas da direita em 2026. Na avaliação do governador de Minas, a ampla gama de candidatos dá mais força aos partidos de centro-direita e afasta os ataques do Palácio do Planalto a apenas um candidato.
“Pelo contrário. Quem observa de fora pode interpretar dessa forma, mas quem está envolvido sabe que isso significa mais votos para a direita. Haverá uma transferência significativa de votos tanto no primeiro quanto no segundo turno, pois todos apoiaremos o candidato que avançar. Esse movimento potencializa o volume de votos da direita. Não se trata de divisão, mas de soma de forças”, afirmou.
Leia a entrevista completa com Romeu Zema, governador de Minas Gerais
IstoÉ: Como avalia seus sete anos e meio de governo e a situação atual de Minas Gerais?
Romeu Zema: Ao assumir o governo de Minas Gerais, encontrei um Estado à beira do colapso. No primeiro mês, recebi mais de 400 prefeitos reclamando que não recebiam repasses de ICMS, IPVA, saúde e educação. O PT deixou salários parcelados, décimo terceiro atrasado e 240 mil funcionários com o nome sujo porque descontaram empréstimos consignados sem pagar os bancos – situação que em qualquer lugar seria crime.
Coube a mim e minha equipe consertar esse desarranjo. Pagamos quase R$ 30 bilhões em dívidas atrasadas com municípios, funcionários, fornecedores e até depósitos judiciais saqueados do Tribunal de Justiça. Mesmo com essa herança, colocamos as contas em dia e criamos mais de 1 milhão de empregos formais.
A economia de Minas hoje cresce acima da média nacional, com mais de meio trilhão em investimentos privados. O mineiro aprovou essa mudança, reelegendo-me em primeiro turno. O Estado que herdei tinha um cemitério de obras abandonadas e vandalizadas – todas foram concluídas.
Vou entregar ao meu sucessor um Estado funcionando, com contas organizadas e projetos de longo prazo em execução. Saio com a consciência tranquila após sete anos, deixando Minas Gerais nos trilhos e prosperando.
Por que a privatização da CEMIG está travada, enquanto a da Copasa avança?
Avançamos significativamente nas privatizações, vendendo participações estatais em empresas como Light, Renovo e subsidiárias da CEMIG, além de partes em empreendimentos como Belo Monte. Essas operações foram possíveis porque o Estado não tinha controle majoritário, não exigindo aprovação legislativa.
Atualmente, estamos focados na operação da Copasa, que já tem autorização legislativa. A empresa precisa investir R$ 20 a 30 bilhões para universalizar água e esgoto, recursos que nem ela nem o Estado possuem. A entrada do setor privado trará o capital necessário e a agilidade operacional que o serviço público não tem.
O processo será transparente, sem aumento tarifário acima da inflação – pelo contrário, a eficiência deve gerar aumentos abaixo desse índice. Após concluída a etapa da Copasa, avaliaremos a mudança de governança da CEMIG, onde o Estado tem apenas 17% do capital, mas mantém controle através de ações preferenciais.
A proposta é migrar para a B3 com um único tipo de ação, tornando o Estado acionista de referência e não controlador. Isso melhora a governança e poderá valorizar a empresa em 30 a 40%, beneficiando também a participação acionária do Estado com a valorização das ações.
O que falta para Minas Gerais equilibrar suas contas?
Minas Gerais está com as contas em ordem, tendo superado um déficit de R$ 11 bilhões deixado pelo PT para um resultado positivo de R$ 5 bilhões no ano passado. É importante esclarecer que toda a dívida atual foi herdada da gestão anterior – eu não contraí nenhum empréstimo ao longo destes sete anos.
O principal desafio é a dívida de R$ 182 bilhões com o Governo Federal, acumulada desde os anos 1990. A taxa de juros excessiva cobrada ao longo das décadas fez com que o comprometimento orçamentário crescesse de forma insustentável, como uma família que vê sua parcela da casa própria consumir cada vez mais da renda.
Estamos em negociação para aderir ao Programa de Apoio à Reestruturação Fiscal (Propag), que permitirá ajustar a correção da dívida ao crescimento da receita do estado. Isso trará alívio financeiro e condições reais de pagamento.
Meu sucessor administrará um Estado com mais conforto financeiro, embora ainda com restrições. Não estamos atrasando compromissos, mas operamos com recursos contados devido ao peso dessa dívida histórica.

Romeu Zema, governador de Minas Gerais, em entrevista à IstoÉ
Como avalia a reorganização da direita após a prisão de Bolsonaro?
O presidente Bolsonaro continua sendo a maior referência da direita, a quem nós, governadores, devemos muito de nossas eleições e do crescimento desse campo político. Infelizmente, ele enfrenta uma perseguição política evidente, não uma condenação legítima.
Com sua situação atual, a direita terá um cenário plural em 2026, com dois, três ou até quatro nomes disputando a Presidência. Isso é positivo, pois cada candidato fortalecerá a votação em seu estado, aumentando o total de votos do campo.
O importante é que todos estaremos unidos no segundo turno. Nós, governadores, mantemos um diálogo constante e uma relação muito boa, o que também nos protege de ataques concentrados. Se houvesse apenas um candidato, a máquina de perseguição do governo federal estaria focada exclusivamente nele.
Considera a condenação de Bolsonaro injusta? E o STF está enviesado?
O STF é totalmente tendencioso e enviesado. Se você descrever no exterior o que ocorreu em 8 de janeiro de 2023, ninguém caracteriza os fatos como golpe de estado, tentativa de golpe ou atentado contra a democracia.
Quando eventos similares acontecem em outros países, há envolvimento das forças armadas, milícias, manifestantes armados, conflitos e mortes. O que presenciamos foi um ato de vandalismo e depredação – deplorável e passível de punição –, mas incomparável a um atentado à democracia ou golpe de estado.
Além disso, temos observado a punição não apenas do presidente Bolsonaro, mas também de diversos inocentes que estavam presentes sem compreender a situação, detidos e condenados a penas excessivas de 14 e 17 anos.
Mas o que aconteceu na avaliação do senhor para esse Judiciário, para vocês terem essa visão? Porque os próprios deputados e senadores de direita também procuram o Supremo Tribunal Federal.
O Supremo Tribunal Federal tem demonstrado uma tendência autoritária e de perseguição política, desrespeitando claramente a Constituição. A recente decisão sobre sabatinas de senadores é um exemplo disso: a Carta é explícita, mas o STF age como se estivesse acima dela.
Se falam tanto em democracia, por que não submeter suas medidas ao Congresso, conforme previsto? A decisão de hoje mostra mais uma afronta ao texto constitucional, algo que a maioria dos brasileiros que lêem a Constituição compreenderá.

Romeu Zema, governador de Minas Gerais, em entrevista à IstoÉ
A pulverização de candidatos de direita não enfraquece a oposição?
Pelo contrário. Quem observa de fora pode interpretar dessa forma, mas quem está envolvido sabe que isso significa mais votos para a direita. Haverá uma transferência significativa de votos tanto no primeiro quanto no segundo turno, pois todos apoiaremos o candidato que avançar. Esse movimento potencializa o volume de votos da direita. Não se trata de divisão, mas de soma de forças.
Manteria candidatura presidencial mesmo sem apoio de Bolsonaro? Poderia recorrer a uma candidatura ao Senado, por exemplo?
Não tenho perfil parlamentar – não é minha vocação ser deputado ou senador. Minha trajetória sempre foi prática, direta, de atuação concreta. Por isso, seguirei com minha pré-candidatura e candidatura até o fim, independentemente de quem seja o candidato. Essa é uma decisão minha e do Partido Novo.
Seu nome entrou entre os cotados para ser vice do Tarcísio [de Freitas, governador de São Paulo, em uma possível chapa presidencial. Aceitaria a ideia?
Sou grande admirador do Tarcísio e mantenho excelente relação com ele. Agradeço muito a menção ao meu nome por parte dele ou de sua equipe. Como já mencionei, disputaremos esta eleição de forma alinhada. Tenho certeza de que, seja ele ou eu eleito, um convidará o outro para ser ministro. Estaremos juntos de qualquer forma – talvez não como presidente e vice, mas como presidente e ministro, função que ele inclusive já exerceu.
Ou seja, se for eleito, Tarcísio seria seu ministro?
Se ele aceitar, é lógico. Já foi ministro da infraestrutura, fez um belíssimo trabalho. Agora, ele eleito, espero que eu seja chamado também.
Pretende mexer nos benefícios sociais se eleito?
Precisamos revisar criticamente os benefícios sociais para promover justiça com os mesmos recursos. É inaceitável que homens jovens, saudáveis e sem responsabilidades familiares recebam auxílio ano após ano sem buscar qualificação ou trabalho formal.
O sistema atual cria um convite perverso para que pessoas não se integrem ao mercado de trabalho. Quero ajudar quem realmente precisa – como mulheres com filhos pequenos –, mas não sustentar aqueles que poderiam trabalhar ou se capacitar.
Esses beneficiários deveriam comprovar que estão em cursos de qualificação ou prestando serviços comunitários. Receber apoio sem contrapartida, especialmente para quem tem saúde e condições de trabalho, não pode continuar sendo a regra.

Romeu Zema, governador de Minas Gerais, em entrevista à IstoÉ
O Bolsa Família é o principal problema fiscal do governo, na sua avaliação?
A maior distorção fiscal do Brasil é a taxa de juros elevada, que consome mais do dobro dos recursos destinados aos benefícios sociais. Enquanto o governo mantiver um perfil gastador e populista, o mercado não confiará e os juros permanecerão altos.
Com um presidente austero que corte privilégios e mordomias, a Selic atual de 15% poderia cair pela metade. Isso liberaria centenas de bilhões atualmente gastos com serviço da dívida – valor suficiente para financiar um programa como o Bolsa Família.
Os juros altos prejudicam justamente os mais humildes, que pagam mais caro por eletrodomésticos, motos e financiamento da casa própria. Enquanto isso, milionários com aplicações financeiras lucram com a renda fixa. O governo atual, ao aumentar gastos, tira com as duas mãos o que dá com uma.
Qual sua posição sobre a PEC da Segurança e o PL Antifacção?
O principal problema da segurança pública no Brasil é que leis são propostas por teóricos sem contato real com o crime, como antropólogos e sociólogos, enquanto quem atua na linha de frente não tem voz. Esses especialistas deveriam ver de perto as comunidades controladas pelo crime, onde moradores pagam mais por serviços básicos e sofrem extorsão.
Precisamos aprender com experiências que deram certo, como El Salvador, onde homicídios caíram 99% após prender bandidos e tratar organizações criminosas como terroristas. Em Minas, respondemos com firmeza ao “Novo Cangaço”, após um confronto que resultou em 26 mortes de criminosos em Varginha [em agosto, o Ministério Público Federal pediu arquivamento parcial da investigação feita pela Polícia Federal; foram denunciados dez policiais por cinco mortes, sob alegação de indícios de crime e fraude processual por simulação de resistência].
O Brasil precisa elevar o custo do crime, acabando com saídas, visitas íntimas e privilégios. Enquanto um ladrão com 88 ocorrências for solto na audiência de custódia, continuaremos sendo uma escola do crime. Criminosos devem cumprir pena em segurança máxima, sem regalias.
Seu vice, Mateus Simões (PSD), é a melhor opção para sucedê-lo em Minas?
Conheço o Matheus há oito anos – esteve no Novo e agora integra o PSD, partido com o qual estabelecemos uma nova articulação política em Minas Gerais. João Vítor, ele tem sido meu braço direito e o maior colaborador dos avanços que mencionei no início de nossa conversa.
É uma pessoa brilhante. Professor universitário especializado em direito societário, lecionou na Fundação Dom Cabral, uma das instituições mais conceituadas do país. Terá meu apoio porque conheço seu trabalho. Evidentemente, qualquer um pode se candidatar. Cleitinho é um bom e popular senador, mas, em minha avaliação, tem perfil mais parlamentar do que executivo. Todos têm o direito de participar.
Aquele que disputou comigo em 2022, o ex-prefeito de Belo Horizonte [Alexandre Kalil], também deve concorrer. Contudo, trata-se de uma figura desagregadora, o que, a meu ver, limita seu espaço. A democracia permite a participação de todos, mas meu apoio e confiança estão em um sucessor como Matheus Simões.

Romeu Zema, governador de Minas Gerais, em entrevista à IstoÉ
O Novo se tornou um partido bolsonarista?
As propostas do Novo coincidem significativamente com as posições de direita, e o bolsonarismo é claramente dessa orientação. Não incentivamos a posse de armas, mas reconhecemos o direito do cidadão que deseja se proteger e portá-las. Acreditamos no conservadorismo e no valor da família. Cada um tem liberdade para sua orientação sexual, mas não deve buscar influenciar os demais. Essa convergência de valores explica nossa proximidade política.
O senhor foi convocado para a CPMI do INSS. Pretende prestar depoimento ao colegiado?
Por não encontrarem falhas em meu governo, passaram a investigar minha vida empresarial. A empresa que administrei no passado e da qual sou sócio sofreu uma fiscalização inédita do Ministério do Trabalho, com grande aparato, buscando suposto trabalho escravo – algo que nunca ocorreu em seus mais de 100 anos de história.
O banco associado também segue todas as regulamentações do Banco Central e tem demonstrações auditadas publicamente. Se há questionamentos sobre operações de consignado, que fiscalizem todos os bancos do país com o mesmo rigor. Não temo essas ações, pois são claramente políticas.
Sou acionista minoritário e nunca atuei como administrador dessas empresas. Profissionais qualificados conduzem as operações em total conformidade. Se convocado, apresentarei todos os documentos, pois é uma perseguição infundada que não encontrará irregularidades.