Contra a agressividade, o amor. Em tempos difíceis, a leveza. Tudo É Um, novo disco de Zélia Duncan, que será lançado nesta sexta, 31, foi feito em meio a um momento de polarizações no País. Seu álbum bem que poderia vir contagiado por esse clima, mas acabou virando uma espécie de antídoto a ele. Tudo É Um tornou-se um trabalho afetuoso. “Foi muito espontâneo. Claro que é bom para as pessoas, mas, antes de mais nada, eu estava precisando. Sou muito combativa, tenho voz grossa. Quero brincar de cantar baixinho, quero fazer um carinho em mim para fazer carinho nos outros”, diz a cantora e compositora, ao jornal O Estado de S. Paulo.

No novo álbum autoral, Zélia busca – e encontra – beleza nas letras simples, nos tons mais baixos. Ao lado de seu principal parceiro na música, Christiaan Oyens, que assume aqui também como produtor, ela revisitou a sonoridade folk pop dos primórdios de sua carreira. Resgatou os antigos amigos parceiros. Com o próprio Christiaan, assina Olhos Perfeitos e a primeira faixa, Canção de Amigo, que é arrebatadora com a forma singela em que se mostra, em letra e música. “Ser quem se é/ Aceitar o que não deu pra ser/ Receita pra não sofrer/ Não ser perfeito, mas ser você”, diz o refrão, tão universal quanto atemporal.

“Essa primeira música – não é à toa que abre o disco – celebra a amizade, está dizendo que a gente não precisa ser perfeito, que um amigo é aquele que te estende a mão em qualquer situação. São coisas que a gente sabe, mas, quando ouve tão arrumadinho, comove. A gente está precisando reafirmar um pouco essas coisas simples que estão sendo jogadas na lama”, observa ela. “Também tem a ver com minha amizade com o Christiaan, numa música muito típica da gente, clima folk total. Após esses anos todos, tive vontade de voltar sendo quem eu sou hoje, uma mulher madura com muitos outros parceiros.”

Já Olhos Perfeitos tem gosto de melancolia à Tom Waits. “Essa faixa vem com os metais meio New Orleans”, diz Zélia, sobre o arranjo de Christiaan. “A gente se emocionou muito durante a gravação. As duas músicas da gente são simples e batem nesse lugar profundo, no amor que a gente tinha quando começou. A gente se encontrava num quartinho pequeno e ficava tocando, e ele me ensinou a não ter medo dos refrões. São duas músicas que têm refrões lindos. A alma da gente está no disco todo.”

Os dois vinham de um período sem compor juntos. “Sortimento foi um álbum muito emblemático na minha vida. Foi quando encontrei o Beto Villares, produzi oito faixas com ele e quatro com o Christiaan. Ali já começou a ter menos presença dele, e a ter uma coisa muito nova para mim. Naquele disco também, só tem uma música que ele assina comigo, mas muito importante, a Me Revelar, e muitos outros parceiros se espalharam pelo trabalho. Eu quis muito ir fundo na diversidade do meu som, foi quando ele começou a ficar bem misturado”, diz ela. “Por isso, foi tão gostoso voltar para esse som, trazendo esses outros parceiros.”

Ainda das antigas parcerias, Zélia traz para Tudo É Um composições com Zeca Baleiro, em Me Faz Uma Surpresa e Medusa; com Moska, em Feliz Caminhar; e com Chico César, na faixa-título. Me Faz Uma Surpresa remete aos clássicos de Zeca Baleiro, novamente com arranjo de metais de Christiaan, com um quê de Vitória Régia, banda de Tim Maia. “Essa é uma música que ele canta comigo, em que a gente canta colado um no outro”, diz Zélia. Os dois gravaram juntos com os músicos, ali, ao vivo no estúdio, assim como o restante do disco.

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Um convite à calmaria no meio do repertório, Feliz Caminhar traz Moska também no violão e no vocal. “Ele é meu irmão, nossa parceria é muito bonita, ele faz vocal sutil, bonito, é violão e cordas e mais nada.” Já Tudo É Um, a canção, carrega a assinatura do parceiro Chico César junto, assinala Zélia. “Você sente que vem do Nordeste, de outro lugar.” E letra faz refletir com versos simples: “Tudo é um/Tudo é resto de alguém”.

Entre os outros parceiros, então Dani Black, em Só Pra Lembrar; Fred Martins, em Sempre Os Mesmos Erros, com violoncelo marcante do amigo Jaques Morelenbaum; e Dimitri, em Breve Canção de Sonho. O Que Mereço é a única canção do disco que não é de autoria de Zélia. A composição é de Juliano Holanda, um dos nomes em destaque da cena pernambucana, que a cantora conheceu por intermédio do amigo, o cantor e compositor Almério. Zélia foi fisgada pela atmosfera “bem folk, Bob Dylan” da canção e pela letra: “E eu só quero o que mereço/ Nenhum mar a mais, nenhuma gota a menos”. Quando a mostrou para Christiaan, ele topou. “É tão bonito isso, combina tanto com nosso caminho, com o que tentei trilhar até aqui.”

Como ‘tudo é um’, no encarte do disco, Zélia aparece nua, fragmentada, com partes do corpo refletidas em diversos espelhos. Na capa, seu rosto, em primeiro plano, não esconde suas marcas. “Não tem muita maquiagem. Sou uma mulher de 54 anos e é isso aí. Não quis nada de Photoshop na foto. Tinham tirado uma ruguinha minha. Falei: ‘Queria que vocês me devolvessem essa marca, porque ela me custou muito (risos). Não é que eu esteja mais exposta do que antes, é que me sinto mais tranquila para estar exposta do que antes.” Como artista, Zélia está sempre exposta, inclusive nas redes sociais. “Sou mulher, sou gay, e, além de tudo, gosto de dar opiniões, me exponho, passei a ler muito mais sobre a questão do feminismo, a ser mais ativa mesmo nisso tudo. E não conseguiria ser de outro jeito.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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