A liderança da oposição ao governo Lula (PT) na Câmara dos Deputados, ocupada por Luciano Zucco (PL-RS), pediu que o Legislativo reaja ao STF (Supremo Tribunal Federal) pela determinação do ministro Alexandre de Moraes para que a deputada Carla Zambelli (PL-DF) seja presa preventivamente por fugir do país após ser condenada pela corte.
Em nota enviada à IstoÉ, a liderança disse que a decisão representa uma “escalada da ditadura do Judiciário” e pede que a ordem de prisão seja submetida ao crivo do plenário da Câmara.
“Diante de tamanha gravidade e total ausência de precedentes na história do Parlamento brasileiro, a presidência da Câmara, na figura do presidente Hugo Motta [Republicanos-PB], tem o dever constitucional, institucional e moral de se manifestar com firmeza e urgência. O que está em jogo não é apenas a imunidade parlamentar, mas a própria sobrevivência do Poder Legislativo como instituição livre, independente e autônoma”, prosseguiu o texto.
Na primeira declaração pública após a decisão, Zambelli afirmou que a prisão só se justificaria “em flagrante e por crime inafiançável”, evocando a prerrogativa conferida aos parlamentares.
STF x Câmara: imunidade é ponto de atrito
A ordem de prisão preventiva para Zambelli inaugura um novo capítulo na tensão aberta entre Legislativo e Judiciário ao redor da imunidade parlamentar.
Em maio, o plenário da Câmara suspendeu ações penais contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), réu pela participação em uma suposta tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022, sob argumento de que cabe ao Legislativo decidir sobre o prosseguimento de uma denúncia contra um de seus integrantes em razão da prerrogativa. Dias depois, o STF derrubou parte da suspensão e manteve acusações contra o deputado por três dos cinco crimes inicialmente previstos no processo.
Com um histórico recente de indiciamentos pela Polícia Federal e penalizações no Judiciário, deputados da oposição haviam prometido emendar a Constituição e criaram uma secretaria para defender suas prerrogativas no cargo. A nota divulgada nesta quarta-feira, 4, fala em uma escalada que “já avançou sobre outros parlamentares”.
O caso de Zambelli
Moraes justificou que a deputada seja presa preventivamente em “razão da fuga do distrito da culpa” e “pretensão de se furtar à aplicação da lei penal”, configurada pelo anúncio feito por Zambelli na terça-feira, 3, de que pediria licença do mandato e estava deixando o país rumo à Itália para realizar um tratamento médico.
Em 14 de maio, a parlamentar havia sido condenada a 10 anos de prisão por ter contratado o hacker Walter Delgatti Neto e tê-lo coordenado em uma invasão ao sistema do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), razão que levou a PGR (Procuradoria-Geral da República) a pedir que ela fosse detida por deserção. O ministro do STF acatou esse pedido.
Além de ordenar a prisão da deputada, Moraes determinou a inclusão de seu nome na difusão vermelha da Interpol e a aplicação de uma série de medidas cautelares:
- Entrega dos passaportes, incluindo o passaporte diplomático;
- Bloqueio dos vencimentos e quaisquer outras verbas destinadas à ela e seu gabinete na Câmara dos Deputados;
- Bloqueio de cartões de crédito, débito e pix. Instituições financeiras deverão informar o bloqueio em até 24 horas;
- Bloqueio de veículos automoroes e bens imóveis em nome da deputada;
- Bloqueio de embarcações e aeronaves registradas em nome de Zambelli;
- Determinação de bloqueio de todas as redes sociais no prazo de duas horas sob pena de multa diária de 100 mil para as empresas por dia;
- Multa diária de R$ 50 mil para Carla Zambelli em caso de postagens dela ou de terceiros.
O que pode acontecer com a deputada na Itália
Ao canal CNN Brasil, Zambelli afirmou que possui dupla cidadania italiana e, por isso, não poderia ser deportada para o Brasil independentemente das ordens judiciais. “Sou cidadã italiana e lá eu sou intocável, a não ser que a Justiça italiana me prenda. Estou pagando para ver um dia desses”, disse.
À IstoÉ, o advogado penal Caio Favaretto afirmou haver precedentes de decisões da Justiça italiana de extraditar pessoas com dupla cidadania atendendo a solicitações do governo brasileiro.
Um dos exemplos é o caso do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, condenado no processo do Mensalão. Em 2013, ele fugiu para a Itália na tentativa de não ser preso. No ano seguinte, acabou sendo detido por agentes da Interpol em Maranello. O governo brasileiro entrou com pedido de extradição, realizada em 2015 após decisão do Conselho de Estado da Itália, última instância da justiça administrativa do país europeu.