02/09/2019 - 11:37
Ocupação Vladimir Herzog/ Itaú Cultural, SP/ até 20/10
O jornalista Vladimir Herzog (1937-1975) era um amante do cinema. Como repórter de O Estado de S. Paulo, entrevistou François Truffaut, cobriu o Festival de Cinema de Mar del Plata, na Argentina, escreveu análises sobre os circuitos de São Paulo e do Rio. Como realizador, dirigiu o curta-metragem documental “Marimbás” (1963), sobre a pesca de arrastão; participou como produtor de dois filmes da Caravana Farkas — série de documentários idealizada pelo fotógrafo Thomas Farkas —, e realizou vasta pesquisa de campo no sertão da Bahia para a realização de um filme sobre Antônio Conselheiro e Canudos. Teria concluído a produção e, talvez, passasse então a ser reconhecido como cineasta documentarista, se a ditadura militar não lhe tivesse ceifado a vida naquele sábado, 25 de outubro de 1975. Foi no mesmo ano em que ele se tornou diretor do departamento de jornalismo da TV Cultura e que viajou à Bahia para pesquisar sobre a Guerra dos Canudos.
Os 38 anos de vida de Vlado, seus talentos, projetos e realizações são revelados na comovente exposição documental produzida pelo Itaú Cultural, em parceria com o Instituto Vladimir Herzog. O enfoque da Ocupação é na vida e na obra. Um importante recorte do seu “jornalismo de análise e reflexão”, como o amigo Zuenir Ventura define seu trabalho, está reproduzido no espaço expositivo na forma de impressos, jornais e uma edição de reportagens dos telejornais Hora da Notícia e Homens da Imprensa (TV Cultura), exibida em um antigo televisor de tubo de raios catódicos.
Retratos de família e cartas a amigos atestam o rapaz espirituoso, sorridente, bem-humorado e apaixonado, que mesmo diante das atrocidades do governo militar, decide voltar ao Brasil após viver quatro anos em Londres, estudando e trabalhando na BBC. Vlado pisou em solo brasileiro em janeiro de 1969, poucas semanas depois do Ato Institucional nº 5 (AI-5) — que este ano completou 50 anos e, conforme exposição recente no Instituto Tomie Ohtake “Ainda não terminou de acabar”.
A família Herzog — sua esposa Clarice, seus filhos Ivo e André, sua mãe Zora — atravessou 40 anos para desmontar o teatro macabro instaurado a partir da sentença de morte por suicídio, até que o caso chegasse à Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), obtendo-se a condenação do Estado Brasileiro. Em um momento em que tantas mortes são acobertadas, na semana em que a Polícia Federal declara o afogamento como a causa mortis do líder dos índios waiãpi no Amapá, faz-se essencial voltar ao jornalista Vlado: “O que fez, o que ia fazer. E não pôde” foi o título do jornal do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, em novembro de 1975. PA