O que se vê diante das denúncias contra a operadora de planos de saúde Prevent Senior é que dentro da sua rede de atendimento a preservação das vidas humanas não é a prioridade e nem o foco principal. Mais importante é torturar as estatísticas, torná-las mais favoráveis aos seus objetivos estratégicos de impor o uso da hidroxicloroquina e atender os interesses políticos negacionistas do governo federal.

Na empresa, pacientes são apenas números e eles se tornam mais desinteressantes economicamente quando ocupam leitos de UTI e precisam de oxigênio para sobreviver à Covid-19. Aí eles viram um estorvo. O mantra da empresa de que “óbito é alta”, exposto pela advogada Bruna Morato na CPI da Covid,  denuncia um descaso alarmante com as pessoas e uma visão mercenária da saúde. Há um pragmatismo perverso nas decisões da rede de impor o uso de medicamentos ineficazes para enfrentar a pandemia. O raciocínio é que a morte representa uma redução de custos.

Três médicos que trabalhavam na operadora mostraram a cara e deram depoimento no programa Fantástico de domingo. Um deles, Walter Correa, definiu perfeitamente a situação. “Importa é o fluxo, importa o número, não importa o paciente”, declarou. “Vejo a Prevent como especialista em números e não importam as pessoas.” Ex-plantonista da operadora, ele, como seus colegas, a acusa de obrigar os médicos a receitar hidroxicloroquina irrestritamente como tratamento precoce para qualquer paciente com suspeita de contágio pelo coronavírus sem se preocupar com efeitos colaterais, como as alterações no ritmo cardíaco, que podem ser fatais.

De maneira acintosa, a empresa ofereceu o ineficaz kit-Covid como uma panacéia capaz de confortar seus clientes e de dar-lhes a ilusão de que estavam sendo bem tratados. A grande maioria dos beneficiários da operadora é composta por pessoas com mais de 60 anos, grupo reconhecidamente mais suscetível à doença, que viam a Prevent como um plano de saúde acessível, acolhedor e preocupado com a situação dos idosos.

Pura falácia. Raras vezes se viu uma barbaridade ética na medicina brasileira como a que vem sendo cometida pela Prevent. Sem qualquer critério científico e sem autorização dos órgãos competentes, a empresa passou a testar os remédios do kit-Covid clandestinamente e obrigou seu corpo clínico a seguir as orientações de cima sem qualquer objeção. Também se empenhou em omitir mortes causadas pelo coronavírus, falseando atestados de óbitos. Tudo para comprovar os dados de sua pesquisa fajuta, aliviar seus leitos de UTI e diminuir seus custos de operação.

Infelizmente, de forma traumática, descobriu-se que dentro da rede da operadora o paciente vira só um número, não passa de uma unidade de custo. Quanto ao respeito à vida, ele parece significar pouco, ficar em segundo plano. Pouco importa se a hidroxicloroquina ou a azitromicina vier a causar a morte de um doente. Afinal, “óbito é alta”.