Morreu João Gilberto. Conheço muitos admiradores daquele que é considerado o pai da Bossa Nova, mas também sou próximo de quem nunca se entusiasmou com o estilo por ele consagrado. Mesmo estes últimos, todavia, foram capazes de compreender a importância do artista quando do anúncio de sua morte. Quem não compreendeu, ao menos se sensibilizou. O que significa, como podem deduzir, que Jair Bolsonaro não faz parte do meu círculo de amizades.

O falecimento de um dos nossos maiores artistas, ao lado de Tom Jobim, proporcionou a seguinte pérola presidencial: “[…] Uma pessoa conhecida. Nossos sentimentos à família, tá ok?”. É possível e até esperado que Bolsonaro não seja especialista em Bossa Nova, entretanto, ele não pode se dar ao luxo de ser um completo ignorante quando se trata da cultura nacional. Nem que alguém de seu estafe faça o dever de casa e lhe entregue um apanhado sobre o tema antes de seus pronunciamentos.
Defensores do presidente costumam lançar mão de um argumento assaz débil para explicar a sua falta de traquejo ao se expressar: Bolsonaro seria um sujeito do povo. Simplório. Aquele tiozão que a maioria de nós tem na família, sem freios na língua.

Sou perfeitamente capaz de visualizar o personagem. Não se trata de uma figura rara, de fato. Há, contudo, um porém incontornável: ele não é o presidente da República. E aí, lamento por quem tenta em vão socorrer o “mito”, pois não é possível deixar de se envergonhar com determinadas declarações. Vale lembrar que, em meio à morte de João Gilberto, o mandatário se viu tendo que esclarecer outra fala desastrada sobre trabalho infantil. E ainda conseguiu comparar o Brasil a uma virgem ansiada por tarados.

A reação de boa parte da sociedade aos despautérios proferidos por Bolsonaro, sem contar o farto histórico de quando era um reles e obscuro deputado, é sintomática: fazer galhofa. Rir do presidente para não rir de si mesma. Ou, quem sabe, até isso, a depender do peso que cada um carrega nos ombros pela escolha feitas nas urnas. O problema é que estamos rindo há bastante tempo. O atual governo mal entrou no sétimo mês e já parece estar aí há uma eternidade, dado o volume de crises desnecessárias e desatinos defendidos por alguém eleito para representar o País. Antes, noves fora o hiato do governo Michel Temer, houve seis anos de Dilma Rousseff. É tempo suficiente para ter perdido a graça.

Bolsonaro seria aquele tiozão sem freios na língua que a maioria de nós tem na família. Há quem prefira rir dele. O problema é que estamos rindo há tempo demais