Uma mãe com véu (hijab) acompanha um grupo de estudantes em uma visita a um prédio público e é repreendida por um vereador da extrema direita. Este incidente alimenta debates na França, onde a maioria dos cidadãos se opõe ao uso de símbolos religiosos ostensivos.

O uso do véu e de outras roupas com simbolismo religioso costuma gerar polêmica na França, um país visceralmente ligado ao laicismo.

Nesta ocasião, durante visita de um grupo de estudantes ao Conselho Regional da Borgonha (no centro da França), um vereador pediu a uma mulher, mãe de um dos meninos presentes, para remover o lenço da cabeça ou sair da sala.

O político buscou respaldo nos “princípios republicanos e laicos” e denunciou uma “provocação comunitária”, dias após o assassinato em Paris de quatro policiais por um suposto radical islâmico.

Alguns vereadores de extrema-direita aplaudiram o colega, em sinal de apoio, enquanto outros gritaram “laicismo!”.

Imagens que circulavam nas redes sociais mostram a mãe tentando acalmar o filho, que chora nos seus braços, antes de sair do edifício.

– Acompanhantes ‘ocasionais’ –

A cena de dois minutos despertou uma polêmica acalorada nas redes sociais. Muitos ficaram indignados com a humilhação imposta à mulher em frente do filho, enquanto outros pediram que o banimento de símbolos religiosos ostensivos fosse estendido aos passeios escolares.

A lei francesa proíbe o uso de símbolos religiosos ostensivos, como o véu islâmico, o quipá judaico ou os grandes crucifixos, nas escolas públicas.

Mas o Conselho de Estado, a mais alta instância judicial em questões administrativas, determinou em 2013 que acompanhantes “ocasionais”, como pais que acompanham seus filhos em uma viagem escolar, não podem estar sujeitos à neutralidade religiosa que é imposta aos professores.

Mas isto pode mudar. O Senado abordará o assunto na próxima semana após a direita francesa apresentar um projeto de lei para garantir “a neutralidade religiosa das pessoas que contribuem para o serviço público da educação”.

Segundo uma pesquisa do Instituto Francês de Opinião Pública (Ifop) publicada na segunda-feira passada, dois de cada três franceses (66%) são a favor de proibir os pais que acompanham seus filhos em passeios escolares de ostentarem símbolos religiosos.

– Divisões latentes –

A cena que provocou esta polêmica trouxe à tona divisões internas no partido presidente Emmanuel Macron, a República em Marcha (LREM, centro).

Três ministros influentes, Jean-Michel Blanquer (Educação), Bruno Le Maire (Economia) e Gérald Darmanin (Contas Públicas) se posicionaram contra o uso do véu.

“O véu não bem aceito na nossa sociedade” principalmente pela mensagem que transmite sobre “a condição feminina”, disse Blanquer. “A religião é algo íntimo e não tem lugar no espaço público “, disse Le Maire, enquanto Darmanin declarou que “prefere que as mulheres na França não usem o véu”.

Já a porta-voz do governo, Sibeth Ndiaye, disse que via como algo “positivo” ter a mães com véu nos passeios escolares, pois isso estimula “inclusão”.

Diante da crescente polêmica, o presidente deixou o silêncio de lado e pediu na quarta-feira para não “estigmatizar” os muçulmanos.

“Vamos permanecer juntos e não vamos nos dividir na luta contra a radicalização da nossa sociedade”, clamou Emmanuel Macron.

Esta controvérsia é a mais recente de uma longa lista neste país com a maior população muçulmana da Europa (cerca de 10%).

A cada verão, retorna a polêmica do ‘burkini’, a roupa de banho usada por algumas muçulmanas e que cobre todo o corpo.

Além disso, no início deste ano, uma empresa desistiu de comercializar um ‘hijab’ para esportes, por conta da pressão popular.