Versões contraditórias e dúvidas sobre a interrupção abrupta do jogo entre Brasil e Argentina se multiplicaram nesta segunda-feira, um dia depois do escândalo no superclássico sul-americano em São Paulo.

“Tiveram 24 horas antes do jogo, 72 horas antes do jogo. Vai fazer na hora do jogo?”, reclamou Tite quando funcionários da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) entraram no gramado do estádio Neo Química Arena, em São Paulo, no momento em que brasileiros e argentinos jogavam o sétimo minuto (0-0) de um dos principais confrontos de seleções do mundo.

Câmeras de televisão captaram o técnico brasileiro, visivelmente irritado, depois que autoridades tentaram fazer cumprir uma ordem de deportação de quatro jogadores da Albiceleste que violaram os protocolos anticovid ao entrar na metrópole brasileira na sexta-feira.

O questionamento do treinador da Seleção, líder das Eliminatórias para a Copa do Mundo com sete vitórias em sete partidas, foi o de muitos dentro e fora do Brasil.

“Já estamos aqui há três dias. Deveriam ter vindo no primeiro dia e não assim”, questionou o capitão argentino Lionel Messi, em uma conversa em campo com o coordenador da seleção brasileira, Juninho Paulista.

Por que os funcionários da Anvisa entraram no superclássico, o primeiro desde que a Albiceleste venceu o Brasil na final da Copa América-2021 disputada no Maracanã, em julho, apesar dos argentinos estarem em São Paulo havia duas noites?

Segundo a Anvisa, os jogadores também descumpriram uma portaria que “estabelece que viajantes estrangeiros que tenham passagem, nos últimos 14 dias, pela África do Sul, pela Índia e pelo Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte estão impedidos de ingressar no Brasil”, para evitar a propagação de variantes do coronavírus.

– Abertura de inquérito –

A autoridade garantiu que desde que os jogadores de Lionel Scaloni partiram rumo ao estádio, ele tentou sem sucesso deportar os jogadores Emiliano Martínez, Cristian Romero, Giovani Lo Celso e Emiliano Buendía, que não poderiam ter entrado no país porque estiveram em algum momento nos últimos quatorze dias no Reino Unido.

Além disso, a Anvisa garantiu que neste sábado se reuniu com representantes da Conmebol, da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), da seleção argentina e do Ministério da Saúde para notificá-los sobre a necessidade de os jogadores se isolarem e alertá-los de que os atletas teriam mentido no registro de imigração.

“A escalação de jogadores que descumpriram as leis brasileiras e as normas sanitárias do país, e que ainda prestaram informações falsas às autoridades, isso sim exigiu a atuação da Agência de Estado a tempo e a modo, ou seja, de maneira tempestiva e efetiva”, apontou.

A Polícia Federal disse nesta segunda-feira que abriu um inquérito contra os atletas por possível falsidade ideológica.

À tarde, a CBF afirmou em nota que, na reunião, os representantes da seleção argentina “foram informados de que havia uma irregularidade na entrada dos jogadores, que eles deveriam ficar em quarentena e receberam a orientação” para solicitar uma autorização especial.

Após a reunião, continuou a CBF, os jogadores foram o treinamento, “descumprindo orientação passada durante a reunião.”.

O pedido foi finalmente rejeitado no domingo, e a delegação argentina foi notificada “diretamente na NeoQuímica Arena, com tempo suficiente para adotar os procedimentos necessários”.

Mas o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, deu outra versão à TV Globo: “Ainda antes da partida se iniciar, o delegado da partida disse que poderiam jogar, para depois serem deportados. Mas depois, por um motivo que a CBF não conhece, mudaram de ideia”.

O incidente deixou “um sentimento amargo. Foi cancelado por razões políticas”, disse o goleiro Martínez, antes de deixar seu país para se juntar ao seu clube, o inglês Aston Villa.

“Se eles nos tivessem avisado quando chegamos ao Brasil não teria havido tanta bagunça. É uma pena, um papelão, porque íamos ganhar”, acrescentou.

O técnico da seleção argentina campeã mundial em 1978, César Luis Menotti, seguiu na mesma linha. “Estou no futebol desde 1960, nunca vi nada igual na minha vida, a intervenção política que aconteceu ontem (domingo) não pode ser explicada por ninguém, é inusitada, ridícula”, disse Menotti à Rádio 10, da Argentina.

“Qualquer decisão que tenha sido tomada, independentemente dos motivos ou sem motivos, não pode acontecer quando os jogadores estão em campo. Dá a impressão de uma demonstração de poder para todo o mundo ver”, acrescentou o lendário treinador.

– “Decisão” da Fifa em suspenso –

Arquirrivais, as seleções brasileira e argentina se juntaram, à frente dos presidentes de suas federações, para mostrar surpresa com a suspensão da partida.

Estamos “aguardando a resolução do Tribunal Disciplinar” da Fifa, disse Claudio Tapia, presidente da Associação Argentina de Futebol (AFA).

O órgão que comanda o futebol mundial lamentou nesta segunda-feira a suspensão da partida e anunciou que tomará “uma decisão” depois que seus órgãos disciplinares examinarem o ocorrido.

Os relatórios oficiais foram recebidos pela Fifa e as “informações serão analisadas pelos órgãos disciplinares competentes e será tomada uma decisão”, garantiu.

Após a suspensão, pontos importantes estão em jogo na briga por uma das quatro vagas diretas da Conmebol para a Copa do Catar-2022.

No momento em que ainda resta metade das eliminatórias sul-americanas o líder Brasil tem 21 pontos e a Argentina, segunda colocada, quinze. Com entre 27 e 30 pontos, a vaga para a Copa do Mundo deve ser garantida.

Para esse tipo de caso, o regulamento prioriza o reagendamento da partida, opção que deve ser apertada porque as duas equipes entrarão em campo na quinta-feira, no encerramento da rodada tripla.

A seleção brasileira receberá o Peru e a Albiceleste, que voltou a Buenos Aires na noite de domingo, joga em casa com a Bolívia.

A opção de que os pontos sejam decididos no ‘tapetão’, segundo a mídia argentina, está na mesa.

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