A conjuntura econômica brasileira chegou a uma situação crítica, a ponto de o risco fiscal merecer até mesmo orações, disse nesta quinta-feira, 15, José Júlio Senna, pesquisador do Ibre/FGV e ex-diretor de dívida pública e mercado aberto do Banco Central (BC).

“Por esses dias, pelo que estamos vivendo, o que a gente tem de fazer é torcer muito, torcer pelo BC, torcer para o fiscal caminhar na direção correta. O que a gente tem de problema na economia brasileira hoje não é brincadeira”, disse, ao participar de evento promovido pelo Estadão e pelo Ibre/FGV sobre política monetária.

“É uma encrenca colossal. Se, em cima de tudo isso, a gente passar a ter também o problema da inflação, vai ficar muito mais feio ainda. Então, temos de torcer, se bobear dar também uma ‘rezadinha’ para ver se o fiscal entra nos eixos, o Executivo e o Legislativo tomam as medidas que devem ser tomadas e o BC tenha sucesso em manter as expectativas da inflação sob controle”, disse.

Também no evento, o ex-diretor do BC Carlos Viana, chefe de research da Asset 1, considerou que a regra do teto de gastos (que limita o aumento das despesas públicas à inflação do ano anterior) deixou de ser suficiente para dar sustentabilidade às contas públicas. Para ele, o BC faz uma correção de rumo ao iniciar o aumento de juros de forma agressiva num momento em que a inflação de 2022, cuja meta corre risco, tem maior peso na política monetária.

Apesar das dificuldades, como a resiliência da atividade econômica, que deixou de ser um limitador da alta de preços na visão do BC, Viana rechaçou a ideia de subir as metas de inflação – fixada para este ano em 3,75%, com margem de 1,5 ponto para mais ou para menos. “Temos de perseverar no caminho de inflação mais baixa e estável”, disse o economista. “O regime de metas brasileiro tem flexibilidade para acomodar choques de oferta.”

O economista Márcio Garcia, professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, por sua vez, disse que o problema principal da economia brasileira é e sempre foi fiscal. Por isso, segundo ele, não se pode atribuir à redução da taxa de juro a até 2% ao ano os problemas sofridos pela economia brasileira.

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Para Garcia, é a fragilidade imposta pela política fiscal que impede o Brasil de dar, por meio da economia, respostas diferentes de outros países a eventos de ordem internacionais. Ele lembrou que, quando os EUA despejaram recursos na sua economia para fazer frente à pandemia do coronavírus, o dólar e o juro no território americano não se alteraram, como ocorreu nos países emergentes e, em especial, no Brasil.

Segundo o economista, o BC continuou a reduzir a taxa de juros, mas ressaltou não o acusar de erro, porque estava tentando fazer alguma coisa que não deu resultado pelo problema fiscal. “Redução de juro a até 2% não ajudou, mas não acuso o BC de ter errado”, disse.

Para ele, a economia não vai melhorar até que a questão sanitária seja resolvida. “Mas o que me preocupa é que a volta da inflação está se tornando uma ameaça à economia brasileira”, disse.

Choque de oferta

Senna, por sua vez, disse que a inflação no Brasil não sofre com um problema de aquecimento de demanda, mas sim um choque de oferta, em especial de commodities, e de gargalos de logística que limitam a produção.

Segundo ele, o comportamento fraco da atividade econômica vem, na verdade, segurando repasses de preços. Ainda assim, lembrou, os preços das matérias-primas já subiram mais de 70% em 12 meses, enquanto os de bens intermediários tiveram alta de 40% e os finais, de 20%.

“O problema do Brasil não é de demanda. Vivemos um choque de oferta, fundamentalmente de commodities, e gargalos de logística”, disse. “O Banco Central está reagindo no sentido de conter efeitos secundários do choque, transmitidos por piora das expectativas. Está tentando impedir a propagação desses choques”, acrescentou.


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