Elenice da Silva se comunica com seus fisioterapeutas através da leitura labial: “Estou muito bem”, articula essa mulher negra de 63 anos, que respira por meio de uma sonda na traqueia, depois de passar quase três meses em terapia intensiva por complicações do novo coronavírus.

Elenice se recupera na unidade “pós-covid-19” do Hospital Universitário Pedro Ernesto da Uerj (Hupe), uma enfermaria adaptada aos cuidados daqueles que ficaram gravemente doentes e sofrem sequelas, mas carecem dos meios e da estrutura familiar para continuar o tratamento em casa.

“O hospital projetou uma enfermaria de atendimento a pacientes pós-covid, ou seja são pacientes que não têm mais o potencial de infectar outros pacientes nem membros da equipe, pacientes que já estão recuperados da parte inicial da doença, mas que ainda precisam de uma assistência médica e uma assistência multidisciplinar”, explicou à AFP Marcia Ladeira, professora de clínica médica da UERJ e uma das coordenadoras da unidade.

Após longos períodos de hospitalização, muitos pacientes sofrem de atrofia muscular, insuficiência respiratória ou renal, lesões na pele, problemas cardíacos, neurológicos ou psicológicos.

“A nossa enfermaria, com toda a sua equipe, tenta dar condições para que esses pacientes possam ter uma reabilitação plena. Que eles possam sair andando, comendo sozinhos, sem aquela cânula, aquela traqueostomia, com as feridas da pele fechadas. Eles já vão bem preparados para sua reintrodução na sociedade”, explica a dra. Ladeira, que se orgulha de ter dado alta a dezenas de pessoas com esse perfil.

Além dos cuidados médicos, a unidade oferece tratamento de fisioterapia, fonoaudiologia, nutrição e acompanhamento psicológico.

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

O governo estima que quase 1,3 milhão de pessoas tenham se recuperado da doença desde o início da pandemia, que no país causou quase 80.000 mortes e mais de dois milhões de infecções.

O Hupe, centro médico multidisciplinar de referência, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, adaptou suas instalações durante o período mais crítico da pandemia, que na cidade do Rio foi entre abril e junho.

Com a curva de infecções e mortes em declínio, as alas destinadas aos pacientes com COVID-19 estão retomando gradualmente sua função original, assim como a enfermaria pós-covid, onde nos últimos dias havia apenas cinco pessoas em recuperação.

– Fragilidade muscular e psicológica –

A duração da internação varia de uma semana a vários meses.

Com a ajuda de dois fisioterapeutas, Elenice segue uma rotina de exercícios para fortalecer os braços e as pernas e até tenta brevemente ficar de pé.

“Lá no CTI foi tremendo. Mas agora estou maravilhosa. Se não fosse os doutores, eu teria ido”, diz a mulher, que também sofre de epilepsia e outras doenças que a tornam uma paciente de risco.

Com a sonda de traqueostomia – que envia ar dos pulmões para fora através de um orifício na garganta – sua voz é inaudível. Mas com uma válvula colocada por uma fonoaudióloga, ela consegue falar por alguns minutos, com alguma dificuldade.

Assim, conseguiu se comunicar com seus dois filhos, que desde que deixou a unidade de terapia intensiva puderam visitá-la.

“Após a infecção ela ficou bem debilitada. Ela tem uma fraqueza muscular importante”, explica Cleiton Ferreira dos Santos, de 28 anos, residente de fisioterapia no hospital.


“Hoje ela já consegue se equilibrar melhor quando a gente senta a beira-leito. Isso é muito bom. Ela é muito colaborativa, isso é muito importante”, diz.

O próximo objetivo da equipe é que Elenice recupere sua capacidade de engolir e comer pela boca, para, assim, remover a sonda nasogástrica.

Embora tenha um longo caminho a percorrer e ainda não tenha previsão de alta, Elenice promete, sorrindo, que, quando deixar o hospital, fará “um bolo gigante para todo mundo”.


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias