O ano de 2019 foi cruel para a Amazônia, mas a pior notícia ainda está por vir. Diante da falta de ações do governo Bolsonaro e de seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para conter o desmatamento desenfreado, especialistas afirmam que a tendência é que a degradação da floresta aumente ainda mais em 2020. De acordo com o Imazon, de agosto a outubro a área afetada da Amazônia Legal cresceu 93%, em relação ao mesmo período do ano anterior. Quando analisados os dados de 2019 (que cobrem de agosto de 2018 a agosto de 2019), a destruição chegou a 9.762 km2, o equivalente a mais de seis vezes o município de São Paulo. Antes, a taxa de derrubada estava em 6 mil km2 ao ano, uma das mais baixas, graças aos governos anteriores.

Com medidas conduzidas, principalmente, pela ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, grileiros e madeireiros foram presos e punidos. Com a implementação do sistema Deter, que monitora o desmate via satélite, as taxas foram caindo sucessivamente até 4,5 mil km2 em 2012 — muito inferiores ao recorde da década de 1990, de 29 mil km2. No segundo governo Dilma, no entanto, a derrubada voltou a crescer, disparando com a entrada de Bolsonaro. O principal erro do atual governo é o desmonte da fiscalização, o que cria impunidade. Para se ter ideia, a meta para o Brasil estabelecida na 25ª Conferência do Clima (COP-25), da Organização das Nações Unidas (ONU), para reduzir a emissão de gases de efeito estufa, era manter a perda da cobertura vegetal em até 3 mil km2 ao ano. Ou seja, o Brasil está desmatando três vezes mais que o limite proposto. “Todas as vezes em que o desmatamento aumentou, os governos entraram com medidas para preveni-lo. Não estamos vendo isso acontecer nesse governo. Não houve nenhuma medida para reduzi-los”, diz Carlos Souza Jr., pesquisador e coordenador do Sistema de Alerta de Monitoramento do Imazon.

É sabido que um dos principais motivos do desmatamento é o ganho financeiro no curto prazo, já que ocorre em grande parte para atividades agropecuárias e garimpo. Com a desvalorização do real frente ao dólar, o Brasil está exportando mais commodities agrícolas, o que incentiva o avanço sobre a mata, em uma extensão que vai da divisa do Piauí até o Acre. Há, no entanto, um fator legal ainda mais agravante: uma medida provisória publicada este mês no Diário Oficial — mas precisa ser aprovada pelo Congresso — visa multiplicar por quatro vezes as áreas que podem ser legalizadas unicamente com base na declaração do ocupante e sem a vistoria de autoridades. Assim, terras invadidas poderão ser legalizadas sem grande esforço no futuro. É um prato cheio para grileiros e madeireiros. Somada à ausência de políticas públicas para controle do desflorestamento, a Amazônia fica ainda mais ameaçada. Se no passado as operações de comando e controle do Ibama eram mais intensas, hoje são raras e até alvos de críticas do presidente, que não admite contestações aos ruralistas.
De acordo com um estudo do Instituto Socioambiental, após as críticas de Bolsonaro à atuação do órgão em Cujubim, Rondônia, o número de alertas de desmatamento na região dobrou. E não há nenhuma perspectiva de que o governo irá mudar sua postura. Pelo contrário, o ministro do Meio Ambiente e o presidente argumentam que a floresta preservada atrapalha o desenvolvimento econômico e a produção agrícola na região. Outra dificuldade para conter o desmatamento é o bloqueio, desde o início do ano, dos recursos do Fundo Amazônia, que financia projetos de conservação. Diante do fim das verbas, governadores da Região Norte tentam obter novos apoios internacionais.

“Se não houver controle, 2020 fechará com aumento do desmatamento” Carlos Souza Jr., coordenador do Sistema de Alerta de Monitoramento do Imazon (Crédito:Divulgação)

 

Indígenas em risco

A invasão de territórios indígenas é outra preocupação. De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), de janeiro a setembro de 2019 o número de invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos ao patrimônio em áreas habitadas por brasileiros nativos cresceu 46,7%, em relação ao mesmo período de 2018. Além da floresta, a vida de indígenas de diferentes etnias está em risco. Somente em dezembro de 2019, três líderes guajajaras foram assassinados no Maranhão por madeireiros. Em 2020, se nada mudar, os homicídios e os crimes ambientais vão crescer.

O que deve permanecer intacto é a conhecida ignorância do ministro Ricardo Salles sobre a realidade da região. Uma posição estimulada pelo presidente, que se mantém desconectado das boas práticas ambientalistas e das propostas sustentáveis de exploração da floresta. Bolsonaro se recusa a aprender com Greta Thunberg, a adolescente sueca que está ensinando o mundo a preservar o planeta.