Diante de um mundo cruel, a esperança não precisa ser um sentimento bobo. É o que aprendemos vendo os filmes do francês Robert Guédiguian. Ele sabe, e seus personagens também, que o mar não está para peixe para os que mantêm ideias humanistas, mas que, mesmo assim, resistir é preciso. É temática recorrente desse cineasta marselhês e não está ausente de sua nova obra, Uma Casa à Beira Mar.

Sim, há essa casa debruçada sobre o mar do sul da França, com um terraço maravilhosamente desenhado. É nele que fuma e medita o patriarca da família, olhando o pôr do sol, pouco antes de ser vítima de um derrame que o colocará no leito, imóvel e sem fala. A doença do pai traz de volta a atriz Angèle (Ariane Ascaride), que se reencontra, 20 anos depois, com seus dois irmãos, Armand (Gérard Meylan) e Joseph (Jean-Pierre Darrroussin).

Angèle partiu por motivo que não se explicará senão na metade da história. Armand ficou por lá e tenta tocar o restaurante proletário (bom e barato) fundado pelo pai. Joseph é um desempregado amargo, escritor frustrado e namora uma mulher bem mais jovem (Anaïs Demoustier), que, aliás, parece à procura de novas emoções.

O acúmulo de temas poderia derrotar um diretor menos dotado. No entanto, Guédiguian consegue encaixá-los numa narrativa tão simples como fluida e elegante. Nesse desenho, surge um tema de fundo que se revelará dominante – o dos refugiados, que deixam seus países por causa da fome, da guerra, da falta de oportunidades. São um tema da atualidade europeia e representam um desafio para governos e para quem ainda defende a existência de uma sociedade civil solidária.

A grande arte de Guédiguian consiste em defender a ideia do “outro mundo possível” sem incorrer em ingenuidade nem desprezar as contradições de quem se julga na obrigação moral de estender a mão aos outros. Trabalha na ausência total de pieguice e, por isso mesmo, seu filme é emocionante e lúcido.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.