A cena, no mínimo constrangedora, é ilustrativa do quão arriscada se tornou a política externa brasileira. Segundo apurou ISTOÉ, enquanto o presidente Jair Bolsonaro viajava a Israel, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, tentava convencer o embaixador de um país árabe de que nada mudaria nas relações comerciais do Brasil com as nações islâmicas. “Da nossa parte, a intenção é manter o respeito que conquistamos junto aos senhores”, argumentava ela. “Ministra, se a embaixada de Israel mudar para Jerusalém, nossos povos vão parar de comprar os produtos brasileiros”, ameaçou o embaixador. A decisão de, por enquanto, apenas instalar em Jerusalém um escritório de negócios deixou Tereza Cristina mais aliviada. Mas, no fundo, isso pouco ajudou a melhorar a situação. Na verdade, na sua passagem por Israel, Bolsonaro conseguiu desagradar a todos. O escritório de negócios frustrou as expectativas do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que esperava um sinal mais evidente da troca da embaixada. Por outro lado, árabes consideraram que a mera criação do escritório e os demais paparicos de Bolsonaro a Netenyahu eram um sinal evidente de que o governo brasileiro escolheu um lado. O recado do embaixador árabe para a ministra ainda está valendo.

Alinhamento à direita

Depois da subserviência demonstrada na viagem aos EUA, a visita a Israel somente reforçou a sensação de que Bolsonaro se alinha de forma ideológica aos interesses de Donald Trump, sepultando a tradição diplomática brasileira de neutralidade. Ao se eleger, Bolsonaro prometeu mudar o foco das relações internacionais, contaminadas nos governos do PT por acenos a governos como Cuba e Venezuela. Na prática, porém, Bolsonaro apenas trocou de bússola. Vira agora à direita de uma forma ainda mais aguda do que a que o PT virou à esquerda. E, nessa guinada, brinca com fogo.

Os gestos de Bolsonaro geraram um perigoso mal-estar com o grupo terrorista palestino Hamas, que domina a Faixa de Gaza. O grupo reprovou a abertura do escritório de negócios. Bolsonaro quebrou também um protocolo diplomático que vinha sendo adotado por chefes de Nações: não visitar o Muro das Lamentações. Mas ele fez pior: promoveu a visita a um território neutro, uma terra santa capaz de reunir diversos credos, sem preconceitos, acompanhado de autoridades do governo israelense. E o Hamas não gostou. Os dedos rápidos da família do presidente no Twitter fizeram com que o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que acompanhava a comitiva, digitasse uma resposta à facção terrorista: “Quero que vocês se explodam”. Seria uma piada pronta não fosse o real efeito explosivo da provocação. Uma das especialidades do Hamas é justamente explodir locais de grande concentração de pessoas. Dada a repercussão negativa, Eduardo apagou o post.

Um tiro na diplomacia

O presidente visitou um território neutro, uma terra santa que reúne diversos credos, acompanhado de autoridades do governo israelense. Um insulto para as demais nações

As consequências da forma como o Brasil vem se aproximando de Israel podem ser danosas para a economia. O Brasil é o maior exportador de carne Halal do mundo. O Brasil vende R$ 1,6 bilhão do produto para os países árabes. Ao setor, uma retaliação seria mortal. A venda para eles representa 30% das exportações brasileiras de carne. A ministra Tereza Cristina aposta que o governo não consumará a transferência da embaixada. Bolsonaro já teria se convencido do potencial explosivo dessa decisão. Na quarta-feira 10, a ministra esteve em um jantar promovido pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA) com 50 embaixadores árabes. Foi uma nova tentativa de conter a insatisfação. Que Bolsonaro – ou algum dos seus filhos – não exploda esse esforço.