A avó paterna deste jornalista pertencia aos povos originários. Ao que parece, num episódio meio nebuloso, meu avô praticamente a arrastou de uma comunidade indígena no interior paulista. Com seu jeito tímido, ela tinha muito medo da televisão. Bastava ligar o aparelho para que saísse da sala. Na cabeça dela, estava sendo vista pelas pessoas que via na tela. Em sua ingenuidade, sem saber, minha avó antecipava o que viria a ser a chamada de vídeo. Uma de suas frases favoritas era: “Televisão é coisa de outro mundo”.

Assistindo aos noticiários da TV aberta no último fim de semana, dá até para dizer que Dona Adelina acertou mais uma previsão. A televisão é mesmo de outro mundo. Ou pelo menos algumas emissoras. Record, SBT e Rede TV estão numa realidade paralela na qual Brasília parece ser uma terra distante, com um noticiário tão relevante a seu público quanto o que acontece na Albânia. É um mundo onde Anderson Torres é um nome desconhecido, nem mesmo um coadjuvante na vida pública.

Em jornais que certamente nem existiriam sem a influência de uma cobertura policial contundente e histérica ao estilo celebrado por José Luiz Datena, as matérias vão passando na tela, e as notícias políticas nunca chegam. Uma tentativa de roubo seguida de assassinato numa biboca do extremo da Zona Sul paulistana, com a câmera de segurança flagrando o assaltante disparando contra o balconista, ganha uma dimensão épica que, na cabeça de quem comanda, é muito mais relevante do que a destruição do Congresso ou do STF.

Com todo respeito ao funcionário da lojinha fuzilado em seu trabalho, a subversão de uma ordem mínima no noticiário é tão nociva quanto os atos terroristas. Globo e Band, claramente puxadas pelas equipes de seus canais noticiosos na TV por assinatura, são emissoras que demonstram comprometimento com a informação. A Cultura, com menos estrutura e a inegável desconfiança que um canal ligado ao governo sempre despertará, também cumpre seu papel. O resto optou pela cobertura de uma espécie de Terra 2, um mundo de fantasia onde um Brasil 2 tem mais do que se ocupar do que manter a democracia em pé.