O perfil político de Luis Alberto Arce Catacora, presidente eleito da Bolívia, é diferente de seu padrinho Evo Morales. O novo presidente não é um líder carismático como Morales, também não é indígena; tem uma personalidade menos centralizadora e é mais dado ao diálogo. Para André Caysel, cientista político e professor da Universidade de Campinas, foi uma escolha estratégica. “Ele prefere contemporizar”, diz. O especialista acredita que Arce não deve se tornar uma espécie de antítese de Evo ao assumir o governo, a exemplo de Lenín Moreno, no Equador. “Arce tem outro comportamento”, afirma. Ele venceu as eleições em primeiro turno, uma surpresa para a oposição que sonhava com um novo embate. A presidente atual, a ultradireitista Janine Añez e Carlos Mesa, seu adversário no pleito e um dos artífices da derrocada de Evo Morales no ano passado, reconheceram a derrota. Segundo o fotógrafo brasileiro João Castellano, que está em La Paz, as ruas da capital estão tranquilas. “Antes das eleições havia preocupação com a violência, mas agora não há mais”, conta.

PADRINHO Arce pertence ao mesmo partido de Evo Morales, mas tem uma visão pragmática: governo de centro (Crédito:Marcos Brindicci/Getty Images)

Além disso, desta vez, a Organização dos Estados Americanos (OEA), chancelou o pleito e parabenizou a chapa do Movimento ao Socialismo, o MAS, partido de Evo e Arce. “O povo da Bolívia se expressou nas urnas. Felicitamos Luis Arce e seu vice David Choquehuanca”, afirmou Luis Almagro, secretário-geral da instituição. Os EUA apoiavam a oposição, assim como o presidente Jair Bolsonaro, dado o interesse americano nas reservas de lítio da Bolívia, recurso cobiçado por Elon Musk, magnata da indústria aeroespacial, que apoiou abertamente o golpe de 2019. Porém, devido às eleições internas, os EUA pouco influenciaram na disputa boliviana.

 

Esperança nacional

A história de vida de Luis Arce é incomum a maioria da população boliviana. Ele nasceu em 1963, na capital La Paz, filho de professores de ensino médio. Formou-se em economia e fez mestrado no Reino Unido. Mais tarde, atuou como professor na Argentina e em Harvard e Columbia, nos EUA. Entrou para política de fato em 2006, ao ser nomeado ministro da Economia por Evo Morales. Teve uma atuação de destaque, atuando no processo de nacionalização da exploração de petróleo e gás natural, impulsionando o PIB boliviano, que saltou de US$ 11,45 bilhões (R$ 64,22 bilhões), em 2016, para US$ 40,89 bilhões (R$ 229,17 bilhões), em 2019. Em suas primeiras declarações sobre o setor energético, afirmou que vai renegociar todos os contratos do período Añez, inclusive o acordo com o Brasil, em relação à importação de gás. Luis Arce ressurge como esperança nacional para controlar a pandemia do novo coronavírus e retomar o crescimento alinhado com a convivência pacífica entre as diversas forças políticas da Bolívia.