A pandemia causou um estrago generalizado na economia, mas alguns segmentos conseguiram manter sua força. É o caso da construção e venda de imóveis novos, que têm mostrado bom desempenho também em 2021. A construção cresceu 10% em 2020 e a expectativa é de nova expansão de 5% neste ano. Já a incorporação de imóveis, atividade que anda junto e lida mais com os estoques, teve expansão de 26,1% no volume de vendas e 1,1% nos lançamentos em 2020. Entre as novas estratégias, as construtoras e incorporadoras adotaram a venda de forma remota, o que manteve o interesse dos clientes durante o isolamento social.

CURITIBA Aldenor e Lúcia cancelaram viagens para comprar a casa nova (Crédito:Divulgação)

O ritmo de vendas e lançamentos se mantém, diz Luiz França, presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc). “O mercado está aquecido porque os juros estão baixos. As pessoas compram com o objetivo principal de morar no imóvel. Adquirir para investir ainda é secundário”, diz. O mercado não se retraiu mesmo com o novo ciclo de expansão da taxa Selic, iniciado pelo Banco Central no último dia 17. Foi a primeira alta após seis anos. Segundo ele, eventuais aumentos nas taxas básicas de juros não preocupam. Alguns empresários lembram que 2020 foi marcado pelo forte crescimento do segmento popular, que é mais vulnerável ao aumento dos preços.

Mesmo assim, o temor não é grande se o crescimento dos juros for moderado. “Calculo que hoje 75% do mercado brasileiro é formado por consumidores dessa faixa, com renda mensal familiar de até R$ 4 mil. A taxa Selic já subiu para 2,75% ao ano. Até 4% ou 4,25% ao ano, o mercado imobiliário tem como absorver esse aumento dos juros, sem repassá-lo para o cliente”, diz Celso Petrucci, economista e vice-presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).

No total, foram vendidas 119.911 unidades no ano passado, e lançadas 113.191, entre casas e apartamentos novos. Do total de vendas, 77,8% foram de apartamentos e casas da faixa popular. Os dados são da Abrainc e da CBIC. Segundo a Abrainc, o déficit habitacional é maior na região Sudeste, onde faltam 3,1 milhões de moradias. Nacionalmente, faltam 7,79 milhões de moradias. Os números incluem pessoas que comprometem mais de 30% da renda com aluguel e por isto gostariam de comprar uma casa ou apartamento.

RECIFE Mercado imobiliário na capital de Pernambuco cresceu 10% (Crédito:Leo Caldas)

Casa nova

A crise sanitária acabou impulsionando a área. Muitos consumidores gastaram suas economias na compra do apartamento novo ao invés de aplicarem em viagens ao exterior e automóveis de luxo, no caso da classe média alta. Nas classes média e popular, os cortes atingiram viagens dentro do Brasil e idas a restaurantes, shoppings e bares. O contador Aldenor Fernandes dos Santos vive com a esposa Lúcia Maria, psicóloga, e dois filhos em Curitiba (PR).

Segundo ele, a compra de um apartamento novo “foi uma oportunidade” que surgiu no bairro do Cabral, na zona Norte da capital paranaense. Santos comenta que morava com a família em um sobrado próprio e por isto adquiriram moradia melhor. “Não conhecia o prédio. Vim olhar o apartamento com a minha esposa em maio passado, em plena pandemia. Gostamos e decidimos comprar”, diz. “Se pudéssemos viajar para o exterior, talvez nem comprássemos o apartamento. Mas viajar ficou impossível em razão da Covid.”

A pandemia direcionou os gastos de todas as classes sociais para o mercado imobiliário, diz Thiago Correa Ely, diretor comercial da MRV, maior construtora residencial brasileira, responsável por 95% das vendas na faixa popular. A companhia atua em 160 municípios e entrou no mercado de renda média em Campinas (SP). As vendas virtuais passaram de 30%, antes da pandemia, para 80%, atualmente, diz Ely. Segundo ele, a alta nos preços dos materiais de construção poderá impor dificuldades ao setor. Ao fim e ao cabo, mesmo um setor que mostrou resistência diante do coronavírus pode enfrentar problemas devido à falta de rumo na política econômica do governo Bolsonaro.