Há quem diga que o presidente Bolsonaro está gestando um golpe.

Não é de hoje essa intenção.

Inesquecível a entrevista de 1999 à Band na qual Bolsonaro afirmou que, se presidente, fecharia o Congresso.

Não fechou, mas insiste em sugerir que quer chamar para si as responsabilidades dos três poderes.

Os ataques constantes ao STF, jogando ministros contra a população; as críticas e acusações aos governadores polarizam a opinião pública e tentam fragmentar a União; a insistência em chamar o Exército de “meu”; a ideia fixa de armar a população; os infindáveis ataques à mídia; a criação quase diária de inimigos imaginários, fake news e o gabinete do ódio que, com a CPI são cada vez mais evidentes; e o injustificável aparelhamento militar do Estado.

Militares, apesar de sempre estarem presentes, nos governos passados não passavam de 2 mil e hoje já passam de 6 mil.

Esse número crescente, quem sabe, sirva para agradar as Forças Armadas que nunca foram simpáticas ao ex-Capitão e são fundamentaispara o tal golpe.

Falas e atos polêmicos usados como termômetro de sua popularidade.

Nada disso configura planos para um ato tão radical, mas são sinais inequívocos de que o presidente quer ter todos os fios devidamente desencapados para um eventual choque antidemocrático.

Golpe estranho seria esse.

Pois ao longo da História, por mais nefastos que sejam os golpes à democracia, quase sempre existem motivos que sirvam como álibi.

Impedir o crescimento de uma forma de poder ou, ao contrário, sua implantação.

Restabelecer uma antiga ordem social, ou a entrega do poder a um partido ou facção.

Sempre existe uma razão qualquer, equivocada ou não, criminosa ou não, para a tomada do poder.

Não é o caso.

Não somos ameaçados, hoje, por nenhuma outra forma de ideologia política ou socioeconômica nem houve ruptura das instituições ou no tecido social que justifique uma intentona para resgatar um antigo ethos ou staus quo.
O presidente sequer possuiu filiação a um partido político que queira trazer ao poder.

Hoje, pateticamente, divide com a família as decisões que nos regem.

Enquanto Bolsonaro é o mandatário, os filhos orbitam o governo, muitas vezes como porta-vozes do que não pode ser dito oficialmente, como dar nomes a seus inimigos nas redes sociais, outras vezes como pontas de lança de políticas questionáveis, como os ataques à China.

O que explicaria um vereador do Rio de Janeiro participando constantemente de reuniões no Palácio do Planalto, sem nenhum cargo oficial se não esse poder quase monárquico?

Um golpe, pois, seria tão somente a oficialização do poder absolutista da família Real do brasão da Casa Bolsonaro.

Então, se o autogolpe é a real intenção do presidente, vivemos hoje sob a angústia de saber qual será seu estopim e se o presidente terá o apoio das Forças Armadas, Polícias Militares e, até, de outras forças antidemocráticas.

Resta que Bolsonaro não tem em seu currículo nenhum exemplo de que foi capaz de levar a cabo um projeto
tão complexo.

Bolsonaro pode estar preparando sua derradeira demonstração de incompetência

Chegou ao poder empurrado pelo contexto e de lá para cá, só fez se atrapalhar.

É um homem de impulsos com dificuldades cognitivas e não parece capaz de articular as variáveis para impor sua vontade ou mesmo de acertar o momento correto para programar seu eventual plano.

Infelizmente a população, por razões que não cabem neste texto, também não tem se mostrado capaz de impor uma barreira às insanidades do governo.

Nem panelaços conseguimos organizar direito.

O Brasil de hoje lembra a velha piada: somos um asilo no qual se oferece comida ruim e em pouca quantidade.

Piada, neste caso, sem graça nenhuma.