No momento em que a República enfrenta o seu maior desafio em décadas, dois daqueles que deveriam personificar a voz da razão trocaram acusações pouco ortodoxas publicamente, numa briga que está muito perto do que se vê nos recreios de escolas do País – antes da quinta série, note-se. Os dois envolvidos no embate não são apenas homens feitos, mas duas das figuras mais importantes da nação, pois são diretamente responsáveis por decidir o destino dos envolvidos na Operação Lava Jato e as demandas mais importantes da Justiça brasileira. São eles: Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), e Rodrigo Janot, procurador-geral da República. Entre a terça-feira 21 e a quarta-feira 22, trocaram ofensas publicamente, de um modo como há muito não se via em Brasília. Falando sobre o vazamento de informações confidenciais da investigação, Mendes acusou o procurador de criminoso, por vazar informações da delação da Odebrecht: “A divulgação (da lista de Janot) é uma forma de chantagem implícita ou explícita. Quem não tiver essa noção de que não estão em jogo os personagens que hoje ocupam as funções, mas as instituições, é um irresponsável, e não é digno de ocupar o cargo que porventura está a ocupar.” Em resposta, no dia seguinte, Janot classificou a declaração do magistrado como “disenteria verbal”: “Esse fato em particular é uma mentira. Alguns tentam nivelar todos à sua decrepitude moral, e para isso acusam-nos de condutas que lhe são próprias.”

Instabilidade

No mesmo dia, após uma série de polêmicas que se seguiram à sua nomeação, pelas suas relações próximas com políticos envolvidos na Lava Jato, pelo fato de ser filiado ao PSDB, o novo membro do STF Alexandre de Moraes adotou a fórmula contrária a dos dois boquirrotos colegas. Depois de ter sua nomeação aprovada pela maioria do Senado em fevereiro, na cerimônia da posse, o maior evento público desde a sabatina, Moraes decidiu entrar pela porta da frente da Suprema Corte. Ou seja, sem polemizar. Não discursou, fazendo apenas um juramento protocolar, onde defendeu o combate à criminalidade e a atuação contra a corrupção. Na saída, não respondeu a questionamentos sobre a presença de alvos da Lava Jato na solenidade, incluindo governadores, ministros e parlamentares, despolitizando o evento.

Quando o ativismo político se sobrepõe à lei, quem perde é o povo. O processo de indicação do novo ministro do STF, Alexandre de Moraes, já havia sido alvo de discussões partidárias. Agora, o ministro Gilmar Mendes, do STF, e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, protagonizam um bizarro espetáculo de críticas mútuas em público, sem base nos autos

Enquanto isso, Mendes e Janot evitavam se olhar no plenário da corte. Além da instabilidade que causam nas instituições, o comportamento lamentável normaliza o discurso do “vale tudo” que tomou conta da política brasileira, com partidários de ambos os lados se digladiando com todas as armas. Nem é preciso dizer que a reconstrução de um país depende da união. Mais do que isso. O conflito representa um risco real para a Operação Lava Jato, já que Mendes fez questão de frisar que propõe “o descarte do material vazado”, classificado por ele como “uma espécie de contaminação de provas colhidas licitamente e divulgadas ilicitamente.” Como sempre, disputas entre mandatários prejudicarão aqueles que não têm envolvimento direto, mas que possuem mais a perder: o povo. Para o bem do Brasil, que esse tipo de atitude não se repita.

Estreia Na posse como o mais novo ministro do STF, Alexandre de Moraes prestou juramento, sem polemizar
ESTREIA Na posse como o mais novo ministro do STF, Alexandre de Moraes prestou juramento, sem polemizar