A mãe do Joãozinho andava muito preocupada.
Depois que mudaram para Brasília, o menino estava cabisbaixo, calado, deprimido.
Nem quis escrever a cartinha para Papai Noel, tradição mesmo depois do garoto deixar de acreditar nele.
Mudaram de cidade porque o pai, economista, fora convidado a integrar o Ministério do Planejamento.
Naquela época, meados de 2015, Joãozinho adorou a ideia de mudar de cidade.
Chegaram justamente um ano antes do impeachment.
Competente, o pai manteve o emprego apesar da crise.
Teve colegas presos, demitidos, afastados ou exonerados, mas seguiu firme no cargo.
Justamente nessa época, Joãozinho começou a mostrar os sinais do desânimo.
Sempre bom aluno, começou a ir mal na escola.
A mãe foi chamada para falar com a orientadora.
– Não houve nenhuma perda ou trauma recente? – perguntou a mulher.
– Não, não! Vida normal! – a mãe respondeu segura.
– Um cachorro que morreu?
– Não temos cachorro.
– Um parente preso?
– Oi!?
– Ah… a senhora vai me desculpar, mas aqui é Brasília, né?
A mãe compreendeu mas descartou a possibilidade com um gesto.
– Então deve ser o rito de passagem para a adolescência, misturado com a mudança de cidade. Muito comum…
– Adolescência? Mas ele tem nove anos!
– Ele pode ser precoce… por que vocês não procuram um psicólogo?
A orientadora tira da gaveta o cartão de um psicólogo que lhe pagava comissão por aluno enviado.
O pai, muito a contragosto, marcou uma consulta às vésperas do Natal.
– Bobagem. Criança não precisa de terapia.
– Mas vamos tentar, amor. É pelo bem dele. – a mãe insistiu.
Na consulta, depois das perguntas de praxe, o sujeito pede para que o deixem a sós com Joãozinho.
Os pais, angustiados, aguardam na sala de espera.
Apenas quinze minutos depois, o psicólogo pede que os pais voltem, enquanto Joãozinho vai para a sala de espera jogar Fifa no Playstation.
A semana que se seguiu à consulta não teve novidades.
Joãozinho continuava igual.
Na noite de Natal, por volta das sete horas, o impensado aconteceu.
Bateram à porta do apartamento funcional.
Joãozinho abriu e policiais federais invadiram a casa, numa cena que mais parecia um seriado policial da tevê.
Levaram o pai preso, algemado.
A mãe chorava desesperada.
Joãozinho, estranhamente, observava a cena sem reação.
Desse dia em diante, mudou.
Voltou a ser a criança feliz de sempre.
O pai estava hospedado em um hotel próximo.
Sentia muita saudade da família.
Via a mãe levar o filho à escola todos os dias.
Por mais alguns meses, precisaria ficar longe de todos.
Pelo filho, faria o sacrifício.
– Joãozinho está com SPH. Síndrome do Pai Honesto, uma condição muito rara… – diagnosticou o psicólogo na tarde da consulta.
E decretou a cura:
– O pai precisa ser preso para Joãozinho ser aceito pelo grupo.
Ainda no consultório, o pai reagiu.
Disse que não participaria daquela farsa.
Foi a mãe quem o convenceu.
– Querido, você é o herói do menino!
Topou.
Armaram tudo com uns amigos do ministério.
Funcionou.
Joãozinho voltou a ser como antes.
E, no íntimo, ainda desconfia que Papai Noel é quem atendeu seu pedido.

Joãozinho está com SPH. Síndrome do Pai Honesto, uma condição muito rara… diagnosticou o psicólogo na tarde da consulta


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