E terminou mais uma edição do festival Lollapalooza, em São Paulo.

Se você nunca foi vítima deste evento, não sabe o que está perdendo. Ou ganhando.

O Lolla é, de longe, a melhor experiência antropológica que você pode usufruir fora do Egito.

Ali, por um, dois ou três dias – de acordo com o seu saldo bancário e forma física – você pode estudar exemplares únicos de nossa juventude, pode conhecer as mais inovadoras tendências musicais, pode ser exposto a uma meia dúzia de drogas, incluindo algumas das mais inovadoras tendências musicais.

Há alguns anos, quando o Festival migrou de locações menos inóspitas para o autódromo de Interlagos escrevi sobre essa experiência em detalhes.

Naquela época, reclamei que os palcos ficavam muito longe uns dos outros o que obrigava a audiência a caminhar por horas.

Tudo longe até mesmo, lembre-se, para o padrão de uma pista de automobilismo.

Não é fácil caminhar do ponto A ao ponto B num espaço que foi projetado para carros de corrida.

Passadas algumas edições, este ano decidi testar meus limites e mais uma vez comparecer ao evento.

A primeira surpresa foi na hora de comprar os ingressos.

Não conhecia boa parte das bandas, o que era de se esperar já que estou longe de viver no limite da modernidade musical.

Ocorre que as que eu conhecia estavam espalhadas geometricamente pelos 3 dias do evento. Ou seja, tive que eleger um dia ao acaso, para que sobrasse algum saldo em minha conta corrente para pequenezas como me alimentar.

A brincadeira é cara. São muitos dígitos.

Fazendo as contas na ponta do lápis, descubro que uma assinatura de anual de algum serviço de streaming, um sofá chic e uma TV saem mais barato do que o ingresso para um único dia do Festival. E ainda dá para pedir uma pizza.

Ao contrário de me arrepender, essa constatação apenas elevou minhas expectativas.

Quem sabe desta vez o evento me surpreende com conforto, qualidade de som e imagens.

Com a agravante que optei pelo domingo, porque azar pouco é bobagem.

Acontece que no domingo pela manhã, enquanto vestia minha roupa camuflada de jovem, fui surpreendido pelo fiasco arquitetado pelo Drake, que simplesmente não veio.

Não apenas isso, o artista deixou para informar que havia desistido de cumprir seu contrato como todo cidadão de bem, na última hora.

E mais. Não se deu ao trabalho, sequer, de inventar uma desculpa que nos fizesse ter compaixão. Uma doença qualquer. Uma morte na família.

Nada disso.

Apenas alegou que acordou sem vontade de viajar para o Brasil e que preferia passar o final de semana na companhia de sua mulher.

Drake, meu amigo, se você prefere ficar com sua mulher, espere até ver a lista de quem prefiro estar ao invés de seu lado. Dica: além de humanos, inclui caninos.

Palhaçada, pensei. Mas mesmo assim, imbuído da nobre missão de reportar os avanços da produção do Festival, peguei meu cantil com água e minha bússola, tomei dois ônibus, um metrô e um trem e em poucas horas me fagocitei à multidão em Interlagos.

Pouca coisa muda ao se adquirir experiência sociológica musical

As próximas horas foram de absoluto desamparo.

Para minha surpresa, quase nada mudou.

Os palcos continuam astronomicamente distantes, separados por banheiros idem.

Os nativos continuam os mesmos, hipnotizados pelo som que por vezes se mistura de forma ininteligível.

Uma coisa mudou, a bem da verdade.

A qualidade das imagens nos telões ao lado do palco melhorou muito.

Uma definição realmente maravilhosa.

Só perde para a daquela TV que me referi acima, o que me faz lembrar que poderia estar vendo alguém no palco, ao invés desse mar de cabeças, caso tivesse optado por ficar em casa.

Começa o show do substituto do Drake. Não consigo reproduzir seu nome, pois só tem vogais.

Decido ir embora, afinal, nada pode piorar.

Aliás, pode começar a chover.