Mais de dez meses após o início da invasão russa, a Ucrânia continua a surpreender os analistas que não acreditavam na sua capacidade de resistir. Nesta segunda-feira, 25, o país atacou pela segunda vez em menos de um mês a importante base aérea de Engels, no interior da Rússia, construída na época soviética e onde ficam estacionados bombardeiros estratégicos Tupolev. Eles são parcialmente responsáveis pelos ataques a mísseis que destruíram boa parte da infraestrura da Ucrânia neste inverno.

A última incursão da Ucrânia, com drones, teve poucos resultados práticos. Aparentemente, três russos foram mortos e nenhum avião destruído. Foi mais uma operação simbólica. Como já havia acontecido na Crimeia, território ocupado ilegalmente, a ousada ação ucraniana mostra que os russos não estão imunes a ataques em seu próprio território. Algo difícil de ser imaginado para a segunda potência militar do planeta, orgulhosa de seu poderio. Na Crimeia, uma base aérea foi gravemente atingida em agosto, e vários aviões de Vladimir Putin foram dizimados. Além disso, a nau capitânia russa no Mar Negro, o cruzador Moscou, que era baseado na península, foi abatido em abril. Com ele, boa parte do orgulho russo já tinha naufragado.

Não há solução à vista para o conflito, que mudou a geopolítica mundial neste ano e vai determinar a política internacional em 2023. Os ucranianos têm mostrado engenhosidade militar surpreendente, estão fazendo bom uso do farto armamento que a Europa e os Estados Unidos enviam e estão mais determinados do que nunca a resistir. A invasão cimentou o sentimento nacionalista na Ucrânia e o ódio aos russos.

Já Putin isolou-se, viu suas Forças Armadas serem desmoralizadas e começa a enfrentar a rivalidade dos próprios oligarcas que cultivou. Os militares russos já são abertamente desafiados pelas tropas de mercenários do grupo Wagner (de inspiração nazista e criado por um de seus antigos aliados), que levam para o campo de batalha prisioneiros sacados das penitenciárias e são especializados em atrocidades e crimes de guerra.

Ao contrário de Putin, os ucranianos são cautelosos e pragmáticos. Ampliam pacientemente a ofensiva ao sul e no leste, mas sabem que ainda há o risco de uma nova invasão por terra dos russos, a partir da Belarus. No jogo de xadrez diplomático e no campo militar, até agora saíram vitoriosos. Já o presidente russo está ficando cada vez mais sem opções. A cartada nuclear, que chegou a ensaiar, foi rechaçada pelos aliados chineses e indianos. A convocação de 300 mil novos soldados mostrou para os russos que o conflito poderia acabar com o conforto e a estabilidade que conquistaram a duras penas depois do colapso comunista. Como os ucranianos estão mostrando, Putin cometeu um erro histórico achando que subjugaria o país.