Zelenski diz que drone atingiu cobertura de proteção do local onde ocorreu o mais grave acidente nuclear da história. Kremlin acusa "encenação ucraniana"; UE diz que Moscou "não quer a paz". AIEA confirma incidente.O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, afirmou nesta sexta-feira (14/02) que um drone russo atingiu a cobertura construída para conter vazamento de radiação na usina nuclear de Tchernobil, local do mais grave acidente nuclear da história, ocorrido em 1986. Ele, contudo, acrescentou que os níveis de radiação estavam normais.
"Ontem à noite, um drone de ataque russo com uma ogiva de alto poder explosivo atingiu a cobertura que protege o mundo da radiação na quarta unidade de energia destruída da Usina Nuclear de Tchernobil", disse Zelenski em postagem nas redes sociais.
Zelenski disse que o drone voou a uma altitude de 85 metros, muito baixo para ser detectado pelo radar. Imagens de câmeras de segurança postadas pelo líder ucraniano mostram uma explosão na lateral da estrutura de Tchernobil, com data e hora marcadas.
Incidente ocorre em meio a avanços diplomáticos
A Ucrânia vem alertando constantemente desde o inicio da invasão de seu território pela Rússia que ataques e combates próximo a suas usinas nucleares têm forte potencial para desencadear uma catástrofe.
O Kremlin negou que seus militares tenham como alvo as instalações nucleares ucranianas.
O incidente ocorre em um momento em que os Estados Unidos pressionam Kiev e Moscou a negociarem urgentemente o fim da guerra. O presidente americano, Donald Trump, conversou nesta semana com Zelenski e o presidente russo Vladimir Putin.
Na quarta-feira, Trump surpreendeu Kiev e os aliados europeus ao manter uma longa ligação telefônica com Putin e anunciar que os dois líderes concordaram em iniciar em breve as negociações de paz na Ucrânia.
O suposto ataque aconteceu antes de uma série de reuniões bastante aguardadas no âmbito da Conferência de Segurança de Munique, que teve início sexta-feira, onde Zelenski se reuniu com o vice-presidente dos EUA, J.D. Vance.
Um assessor do chefe de gabinete de Zelenski disse que a delegação ucraniana colocaria o ataque a Tchernobil na agenda das conversas com os Estados Unidos e os países aliados da Ucrânia.
Rússia "não quer a paz"
Zelenski disse que o incidente com o drone russo em Tchernobil era uma evidência de que "Putin definitivamente não está se preparando para negociações; ele se prepara para continuar enganando o mundo".
O Kremlin chamou o incidente de uma "provocação" encenada por Kiev. "Não há nenhuma dúvida sobre ataques a locais de infraestrutura nuclear", disse o porta-voz de Putin, Dmitry Peskov. "Quaisquer alegações de que esse foi o caso não correspondem à realidade. As Forças Armadas russas não fazem isso", afirmou, após declarar que não tinha "informações exatas" sobre o suposto ataque em Tchernobil.
A chefe da política externa da União Europeia (UE), Kaja Kallas, disse que o ataque mostra claramente que os russos "não querem a paz".
O ministro do Exterior da Polônia, Radoslav Sikorski, disse que o episódio reforça a necessidade de "melhorar as defesas aéreas da Ucrânia em nosso próprio interesse". "Em 1986, a nuvem radioativa colocou em perigo toda a Europa e mais além", acrescentou.
AIEA confirma incidente
A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) também relatou uma explosão no local e disse que "os níveis de radiação dentro e fora permanecem normais e estáveis".
A agência, que possui uma equipe em Tchernobil desde os estágios iniciais da invasão russa, publicou imagens mostrando um drone em chamas após colidir com a cobertura.
Desde o início do conflito, a AIEA alertou sobre os perigos de realizar combates ao redor de usinas nucleares.
O Ministério ucraniano da Energia pediu à AIEA a intensificação dos "esforços para evitar ataques hostis a instalações nucleares".
Nos primeiros dias da guerra, as forças russas tomaram brevemente as usina de Tchernobil e Zaporíjia no sul da Ucrânia, que ainda está sob seu controle.
Desde o início da guerra, ataques russos de drones e mísseis contra instalações de energia prejudicaram a capacidade de geração de eletricidade da Ucrânia e forçaram interrupções no fornecimento.
Pior acidente nuclear da história
Em 1986, um reator em Tchernobil explodiu durante um teste de segurança, o que resultou no pior acidente nuclear da história, que enviou nuvens de radiação por grande parte da Europa e forçou dezenas de milhares de pessoas a deixarem suas regiões.
Autoridades da antiga União Soviética tentaram inicialmente encobrir e depois minimizar a catástrofe.
Em novembro de 2016, uma enorme cúpula de metal foi erguida sobre os restos do reator – ao custo de 2,1 bilhões de euros (R$ 12,6 bilhões) pagos através de financiamento internacional – para impedir vazamentos futuros.
Shaun Burnie, especialista nuclear do Greenpeace Ucrânia, disse que o abrigo "não é apenas um teto, mas uma máquina enorme e sofisticada projetada especificamente para evitar a liberação de radioatividade no meio ambiente".
O grupo ambientalista chamou o ataque de "ultrajante" e disse que a Rússia estava "escalando sua guerra contra a Ucrânia para um novo nível".
"O único país no mundo que ataca esses locais, ocupa usinas nucleares e trava uma guerra sem nenhuma consideração pelas consequências é a Rússia de hoje", afirmou Zelenski.
rc/ra (AFP, AP)