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A bancada do PT, com a ajuda de deputados do PDT, PSB, PCdoB e PSOL, bem que tentou sabotar a aprovação da PEC do Teto dos Gastos, essencial para recolocar a economia nos trilhos. Adeptos do quanto pior melhor, claro, nos momentos em que não encontram-se no poder, petistas repetem o erro de épocas anteriores, quando se opuseram ao Plano Real e à Lei de Responsabilidade Fiscal. A ladainha é a mesma. Sob a pretensa defesa dos direitos sociais, Lula chegou a acusar Itamar Franco em 1994 de “estelionato eleitoral”, durante a implantação do Plano Real, responsável por domar a feroz inflação e conferir estabilidade à moeda. O economista Guido Mantega, que viria a ser ministro da Fazenda de Lula e Dilma, foi outro ferrenho crítico do Plano – o qual chamou de “jogo de aparências”. Ironicamente, hoje o Brasil vive a pior crise econômica da história e a origem está justamente nas medidas aplicadas pelo ex-ministro, sendo inclusive responsabilizado pelo Tribunal de Contas da União por sua participação nas pedaladas fiscais.

Mas, novamente, a tentativa de manter o País nas trevas, provocada exatamente pela política econômica legada pelo PT, não frutificou. A articulação do governo Temer resultou em uma vitória avassaladora. Por 366 votos contra 111 e duas abstenções, a proposta do governo foi aprovada em primeiro turno. A segunda votação deve ocorrer no próximo dia 24. Para modificar a Constituição, é necessário que o texto seja votado em dois turnos, com o apoio de ao menos três quintos dos deputados – 308 de 513. Caso seja aprovada, a PEC do Teto seguirá para o Senado. Na Câmara, 92% dos parlamentares da base aliada votaram afinados com o governo. Entre os poucos nomes que traíram o Planalto estão as deputadas Clarissa Garotinho (PR-RJ) e Professora Dorinha (DEM-TO), além de parlamentares do PSB e PPS. Segundo o ministro Eliseu Padilha, os rebeldes já estão sendo enquadrados. “O presidente Michel Temer disse que haverá uma ‘DR’ (discutir a relação) com quem não teve condições de acompanhar o governo”, alertou.

A PEC do Teto dos Gastos é essencial para colocar a casa em ordem. A verdadeira ameaça às políticas sociais seria manter o descontrole da gestão, porque não sobrariam mais recursos para investir. Não é com populismo que se resolvem questões econômicas tão complexas. A Suécia, um dos países da UE com mais baixos índices de dívida pública, constitui-se num belo exemplo. Adotou o mesmo caminho em 1996, na esteira de uma crise semelhante à vivida pelo Brasil. A partir da medida governamental chamada de “utgiftstak”, estabeleceu limites para seus gastos e saiu do atoleiro.

O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda dos três primeiros anos do governo Lula, Marcos Lisboa, é um dos defensores fervorosos da PEC. “A proposta traz uma disciplina que deveria ser natural à gestão pública. A maior ameaça às políticas sociais é não tê-las e continuar a trajetória de crescimento dos gastos públicos em 6% ao ano, enquanto o PIB cai. Em vários estados, a economia já está em colapso e atingindo sobretudo os mais pobres”, explica o atual presidente do Insper, que já foi vice-presidente do Itaú Unibanco. Segundo o economista, “uma crise como a nossa não se faz com poucos erros” e o déficit fiscal é apenas um deles. “Temos de olhar para todas as intervenções desastradas na economia e os artifícios utilizados para que as contas públicas não refletissem o rombo real”, afirma Lisboa.

Negociar é preciso Vitória na Câmara contou com o apoio de 92% da base aliada de Temer
NEGOCIAR É PRECISO: Vitória na Câmara contou com o apoio de 92% da base aliada de Temer

Professor da Escola Brasileira de Administração Pública e Empresas da FGV, Fernando Rezende diz que “há um excesso de visões negativas” sobre a PEC. À ISTOÉ, ele avalia que, ao contrário de prejudicar as políticas sociais, a proposta “contribuirá para que essas políticas sejam desenvolvidas de forma equilibrada”. O ex-presidente do Ipea ressalta ainda que a nova lei permitirá uma maior discussão sobre alocação de recursos orçamentários. “Não só sobre saúde e educação, mas também sobre segurança pública, saneamento e outros direitos sociais previstos na Constituição. É preciso equilibrar as nossas prioridades”.

O atual presidente do Ipea e professor de economia internacional na FGV, Ernesto Lozardo, é mais um dos que defende a medida. Segundo ele, o reequilíbrio das contas é necessário para enfrentar o atual estado de “estagflação” da economia brasileira. Em audiência pública na Câmara dos Deputados para debater a PEC 241, no último mês, o economista defendeu “um esforço coletivo para tirar o país de uma situação insustentável”. “A crise é profunda, o ajuste é inevitável e os desafios precisam ser enfrentados e superados, para o bem do futuro do país”.

A vitória do governo na aprovação da PEC do Teto revelou uma completa mudança no estilo de atuação da Presidência da República em comparação com a gestão anterior. Horas antes da votação em primeiro turno da PEC pela Câmara, o peemedebista Michel Temer ofereceu um jantar no Palácio da Alvorada para toda sua base aliada. O cardápio, com direito a vinho, filé com risoto de funghi e salmão grelhado, agradou ao paladar dos mais de 200 deputados presentes, em pleno domingo à noite. A oportunidade de conversar diretamente com o presidente falou mais alto. À porta, os visitantes se enfileiravam para tirar “selfies” com o anfitrião e sua esposa, Marcela Temer.

Em telões espalhados pelos salões do Palácio, vídeos eram exibidos com o ministro Henrique Meirelles e economistas convidados, como José Marcio Camargo, da PUC do Rio, e Armando Castelar, da FGV, detalhando o cenário econômico. Por meio de gráficos e argumentos econômicos, eles ressaltaram a urgência de se aprovar a PEC para reerguer o País.

“Estamos cortando na carne”, explicou Temer aos presentes. “Estamos fazendo História até o último dia do nosso governo e lá vamos erguer as mãos e dizer que salvamos o Brasil”, completou. Mais cedo, o presidente já havia almoçado com lideranças partidárias a convite do deputado Rogério Rosso (DF), líder do PSD na Câmara, que ofereceu sua casa em Brasília. Devido a uma reunião com o Fundo Monetário Internacional (FMI) no mesmo dia, Meirelles não participou do jantar. Dos Estados Unidos, porém, o ministro conseguiu o apoio da diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde. “A aprovação destas medidas em um período razoável de tempo vai ajudar a fortalecer a credibilidade da política macroeconômica, ampliar a confiança na economia e apoiar um retorno de crescimento forte, inclusivo e sustentável no Brasil”, afirmou Lagarde.

Além do afago ao ego dos parlamentares, Temer atendeu aos pedidos por uma interlocução direta com a sociedade. Na semana anterior, o ministro da Fazenda foi ao ar, em cadeia nacional de rádio e televisão, para defender a PEC. “Na sua casa, todos sabem que não podem se endividar para gastar mais do que ganham, continuamente. Com o governo acontece a mesma coisa”, explicou Meirelles. O mesmo tom foi adotado na campanha publicitária produzida pelo Planalto, com veiculação em horário nobre. “Todo esse sofrimento teria sido evitado se não tivessem gasto mais do que arrecadaram”. Ao final do vídeo, é exibido o endereço para o site “equilíbrio de contas”, criado pelo governo. Que o passo dado pela Câmara, na última semana, seja apenas o primeiro em favor da reordenação das contas públicas. As próximas gerações agradecem.

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Fotos: Givaldo Barbosa/Agência O Globo; Andre Coelho/Agência O Globo; Beto Barata/PR; Beto Barata/PR; Welliam Volcov/Brazil Photo Press