“Joe, o Dorminhoco”, “Pocahontas” e “Bernie Louco” são os apelidos com os quais o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tenta ridicularizar seus potenciais adversários nas eleições de novembro – Joe Biden, Elizabeth Warren e Bernie Sanders.

Mas o recém-chegado Pete Buttigieg, o pré-candidato democrata com menos de 40 anos, até agora escapou ileso dos ataques e do humor ácido do presidente.

“(Buttigieg) está indo muito bem hoje à noite. Ele está dificultando a vitória para o Bernie Louco. Muito interessante!”, publicou Trump no Twitter na terça-feira à noite, no encerramento da primária de New Hampshire.

Para os analistas, esta postagem foi muito comedida para alguém que tem o hábito de lançar insultos para todos os lados.

Será que essa postura em relação ao “Prefeito Pete” é motivada por não considerá-lo um adversário em potencial? Por não saber como lidar com este novo personagem do cenário político americano que tem praticamente metade de sua idade? Ou estaria em busca de uma estratégia para atacar um rival que agrada os independentes e os “futuros ex-republicanos”?

Para o historiador Julian Zelizer, da Universidade de Princeton, é claro que, se o ex-prefeito de South Bend seguir essa trajetória ascendente, ele logo se tornará o alvo favorito do milionário republicano.

“Assim que Trump vê uma ameaça, ele ataca a ameaça”, disse Zelizer à AFP, acrescentando que o presidente “estará observando e vai agir se a ameaça crescer”.

Resta estabelecer qual será a linha de ação que o magnata do ramo imobiliário vai escolher para atingir Buttigieg.

Seu nome, difícil de pronunciar?

Trump já lançou essa cartada durante um comício eleitoral, fingindo ter problemas para pronunciar o sobrenome do democrata. Mas o jovem político minimizou essa questão a partir do momento em que anunciou sua candidatura, com uma explicação jocosa de como pronunciar o nome de sua família.

Sua falta de experiência?

Buttigieg, de 38 anos, nunca foi eleito para o Congresso e sua experiência como governante se reduz à gestão, por oito anos, de uma cidade de 100.000 habitantes, South Bend, no estado de Indiana, onde nasceu.

Trump pode se sentir tentado a usar esse argumento contra o ex-prefeito, utilizado pelos pré-candidatos democratas nos debates promovidos pelo partido, mas ele deve ser cuidadoso.

“Vi coisas muito piores caírem do que um tuíte cheio de erros”, disse o jovem candidato em várias ocasiões, que tem em seu currículo um período servindo nas forças armadas americanas no Afeganistão.

“Estou pronto para enfrentar Donald Trump, porque quando ele chegar ao discurso agressivo e batendo no peito, terá que ficar ao lado de um veterano de guerra americano e explicar como ele fingiu que uma osteopatia o impedia de se alistar no Exército”, disse o ex-prefeito em janeiro, em referência a relatórios sobre vários atestados para adiar a incorporação e evitar um recrutamento do republicano que o levaria ao Vietnã.

– Quem é Alfred E. Neuman? –

A religião?

O apelo do “Prefeito Pete” aos cristãos americanos não é ignorado por Trump, que encontrou nessa massa de eleitores um elemento-chave em sua vitória nas eleições de 2016.

No início de janeiro, diante de centenas de eleitores evangélicos em Miami, Trump ironizou a fé de Buttigieg: “Agora, de repente, ele se tornou extremamente religioso, isso aconteceu cerca de duas semanas atrás”, disse o presidente.

A resposta do candidato democrata foi contundente: “Tenho quase certeza de que sou crente há mais tempo do que ele é republicano”.

Sua homossexualidade?

Contra o primeiro candidato abertamente homossexual com uma chance real de obter a indicação de um grande partido, até onde irá Trump?

“Nada está fora dos limites para o presidente”, disse Zelizer. “Isso poderia provocar uma reação negativa, embora temos visto o presidente constantemente atravessar essas fronteiras sem nenhum tipo de repercussão dentro de seu próprio partido”.

“Se Buttigieg for o candidato, a questão de seu casamento gay certamente estará no centro do debate”, afirma Larry Sabato, professor de ciência política da Universidade da Virgínia.

“Mas Trump pode permitir que líderes evangélicos cristãos façam o trabalho sujo para ele, neste caso”, acrescenta.

Finalmente, há a questão, central da estratégia de Trump, de um apelido, uma ferramenta que não é digna de sua administração, mas muito eficaz entre seus seguidores.

“Crooked Hillary” (“Hillary Desonesta”), “Lyin’ Ted” (“Ted, o Mentiroso”), “Sleepy Joe” (“Joe o Dorminhoco”), “Crazy Bernie” (“Bernie Louco”), “Shifty Schiff” (“Schiff Enganador”), “Cryin’ Chuck” (“Chuck Chorão”), “Pocahontas” (uma alusão à filha de um chefe indígena do século XVII), “Mini-Mike”… republicanos ou democratas, seus oponentes foram batizados com nomes que repercutiram entre os apoiadores do milionário.

“Tenho pequenos apelidos para cada um deles”, disse há alguns dias um entusiasmado Trump. Mas a afirmação está incorreta. Buttigieg ainda não possui o seu.

No ano passado, o presidente tentou comparar o jovem democrata a Alfred E. Neuman, o personagem com orelhas grandes e um sorriso exagerado que é um símbolo da revista de humor Mad.

Mas Trump errou em sua tentativa: nem todo mundo entendeu a comparação, e o “Prefeito Pete” não perdeu a oportunidade.

“Serei honesto, tive que buscar no Google isso”, respondeu. “Suponho que é uma questão geracional. Não entendi a referência”, declarou.