16/02/2017 - 11:49
Distanciando-se da solução de dois Estados para resolver um dos conflitos mais antigos do mundo, Donald Trump encantou a direita de Israel e chocou os palestinos, embora ninguém consiga desvendar direito as intenções do novo presidente americano.
“Este é o fim de uma ideia perigosa e errada: a criação de um Estado terrorista palestino no coração da terra de Israel”, alardeou o ministro israelense da Ciência, Ofir Akunis, reiterando a reivindicação judaica sobre a Cisjordânia em nome da Bíblia.
Para sua colega da Cultura, Miri Regev, é “uma nova era diplomática” e o “fim do congelamento” dos assentamentos nos territórios palestinos ocupados.
A ONU avaliou que não houve mudança em sua política.
“A solução de dois Estados continua sendo o único caminho para alcançar as legítimas aspirações nacionais de ambos os povos”, disse o enviado da ONU para o Oriente Médio, Nickolay Mladenov, ao Conselho de Segurança.
Hoje, a embaixadora dos Estados Unidos nas Nações Unidas, Nikki Haley, minimizou as declarações de Trump.
“Apoiamos totalmente a solução de dois Estados, mas também pensamos (em alternativas) fora desse marco”, declarou Haley, após uma reunião do Conselho sobre Oriente Médio.
Já o candidato de Trump para ser embaixador em Israel, o advogado judeu americano David Friedman, muito polêmico por suas posturas radicais a favor da colonização, mostrou-se cético diante da possibilidade de uma solução de dois Estados, sem descartá-la.
“Manifestei meu ceticismo sobre a solução de dois Estados unicamente com base no que percebi como a recusa a renunciar à violência e aceitar Israel como um Estado judaico”, declarou ele na sabatina no Senado, que deve validar sua nomeação.
O ministro francês das Relações Exteriores, Jean-Marc Ayrault, classificou a posição dos Estados Unidos como “confusa e preocupante” e reiterou o apoio de seu governo a ambas as partes.
“A perspectiva de um Estado palestino também é uma garantia para a segurança de Israel”, acrescentou.
O líder da Liga Árabe (LA), Abul Gheit, comentou que nenhuma alternativa à de dois Estados será aceitável.
Ao receber na quarta-feira, na Casa Branca, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, Trump tomou distância da posição defendida há anos por seus antecessores em relação ao conflito entre israelenses e palestinos.
Ele afirmou que os Estados Unidos não vão se ater à solução de dois Estados – a criação de um Estado palestino que coexista com Israel -, a qual também é a referência de grande parte da comunidade internacional.
“Por muito tempo, pensei que a solução de dois Estados era a mais fácil. Mas, honestamente, se Israel e os palestinos estão felizes, eu estou feliz com o que eles preferirem”, declarou o presidente republicano.
A aparente ruptura de um homem que durante sua campanha defendeu ideias muito pró-israelenses preocupa os palestinos.
“O fim da solução de dois Estados significa um único Estado, mesmo racista”, reagiu o editorial do jornal Al-Quds.
“Após mais de 20 anos passados a negociar e depois de concordar em manter apenas 22% da Palestina histórica, a grande questão é: o que devemos fazer?”.
Os líderes palestinos que apoiam as negociações com Israel afirmam que, sem um Estado palestino, a única possibilidade é um Estado expandido na Cisjordânia, já ocupada por Israel, e em Jerusalém Oriental, reivindicada pelos palestinos como sua futura capital, mas que foi anexada por Israel.
Os judeus terão mais direitos do que os palestinos, o que equivaleria a um regime de Apartheid, alegam as lideranças palestinas.
Após o encontro Trump-Netanyahu, a Presidência palestina escolheu o tom da reserva.
Em uma nota, repetiu seu “compromisso com a solução de dois Estados” e disse estar “pronta para interagir de forma positiva com a administração Trump para construir a paz”.
Prematuro
“A impressão que nós tivemos é a de que Trump diz que quer a paz”, declarou à AFP Hossam Zomlot, assessor do presidente Mahmud Abbas, atacando Israel, mas não Trump.
Já o cientista político palestino Jihad Harb destaca as dificuldades da liderança palestina para estabelecer canais de comunicação com o governo Trump.
Enfraquecidos e divididos, os palestinos não têm outro horizonte além de um confronto diplomático com Israel, algo que os Estados Unidos poderiam fazê-los pagar caro, ou de uma revolta popular, com consequências imprevisíveis, aponta Harb.
“A liderança palestina teme entrar em um confronto que poderia ser contraproducente”, segundo o especialista.
“Caloroso e excelente encontro com o presidente Donald Trump. Um dia de sucesso para o Estado de Israel”, tuitou Netanyahu.
Até mesmo o apelo à retenção feito por Trump sobre a colonização não afetou a satisfação daquele cujo país anunciou nas últimas semanas mais de 6.000 assentamentos, antes de ser contido pela Casa Branca.
Sob pressão de sua direita, Netanyahu disse aos jornalistas israelenses que aceitou, durante suas conversas com Trump, buscar um acordo com o governo dos Estados Unidos sobre a construção dos assentamentos, informou a imprensa.
“Vale a pena fazer o esforço”, afirmou ele, segundo a imprensa, excluindo voltar atrás nos recentes anúncios.
“A administração Trump ainda não é capaz de desenvolver políticas reais, e é prematuro especular”, diz o especialista do Instituto de Política do Povo Judeu Shmuel Rosner.
“Não acredito que o presidente Trump apresentou ontem uma visão realista da paz no Oriente Médio”, avaliou.