A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre, derrubou a condenação, por improbidade administrativa, de um ex-policial rodoviário federal acusado de roubo à mão armada, crime que teria praticado fazendo uso de dados internos da corporação para identificar os CPFs de vítimas. Os desembargadores aplicaram ao caso o princípio de ‘retroatividade benéfica’ da nova Lei de Improbidade e agora o Ministério Público Federal contesta o acórdão.

A condenação derrubada pelo TRF-4 foi dada em maio de 2021 e impôs ao PRF perda de função pública e dos direitos políticos por três anos. O policial chegou a responder processo administrativo disciplinar e foi demitido da 8ª Superintendência da PRF, em 2016. Na Justiça Estadual de Santa Catarina, ele foi absolvido por falta de provas.

Na ação de improbidade, a Procuradoria narrou que o réu teria se passado, em 2012, por comprador de bebidas para assaltar os vendedores no dia da entrega das mercadorias. Ele ainda foi acusado de ter utilizado indevidamente sistema interno da corporação para identificar os CPFs das vítimas.

Ao TRF-4, o policial alegou supostas irregularidades no processo administrativo disciplinar e ‘contradições’ na investigação criminal.

Em meio à tramitação do processo, foi aprovada a nova Lei de Improbidade Administrativa e assim o TRF-4 intimou tanto o réu quanto o Ministério Público a se manifestar.

A Procuradoria requereu a manutenção da sentença e, caso tal pedido principal não fosse acolhido, solicitou a avaliação de possíveis alternativas, até mesmo com a conversão da ação de improbidade em ação civil pública.

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Ao analisar o caso, o TRF-4 considerou, por exemplo, que a nova Lei de Improbidade estabelece um ‘rol taxativo’ para as condutas que atentam contra os princípios da administração pública. Nessa linha, os desembargadores aplicaram o ‘princípio da retroatividade benéfica’ sob o entendimento de que ‘inexiste fundamento’ para o prosseguimento da ação.

Além disso, o colegiado fez avaliações sobre a prescrição dos fatos imputados ao ex-PRF. A nova LIA estabelece o prazo prescricional de oito anos, contados a partir do suposto ato de improbidade. Após marcos de interrupção – como o oferecimento da ação – incide o prazo de quatro anos.

O TRF-4 reconheceu a prescrição no caso por verificar que entre a data do ajuizamento da ação, em 22 de maio de 2017 e a publicação da sentença condenatória, em 24 de maio de 2021 ‘houve o transcurso de mais de quatro anos’.

Agora, o Ministério Público Federal recorre da decisão sob a alegação de que a corte não analisou ‘pontos importantes’ que haviam sido levantados pela Procuradoria. Ao TRF-4, a Procuradoria argumenta que deve-se afastar a retroatividade no caso em questão pelo fato de ele envolver condutas praticadas antes da vigência da nova lei de improbidade.

Na avaliação do procurador regional da República Sérgio Cruz Arenhart, quando há ‘conflito entre o direito fundamental à retroatividade da norma mais benéfica ao réu e o direito fundamental da coletividade à probidade administrativa’, o segundo deve prevalecer.

Na avaliação do procurador, apesar de a Constituição autorizar que o Legislativo discipline a ‘forma e gradação’ das sanções aplicáveis em caso de improbidade administrativa, ‘isso não dá ao legislador uma permissão geral para dizer o que é ou não é comportamento ímprobo’.

“Ao deixar de prever como ímprobos comportamentos manifestamente ilegais, imorais e abusivos – mais que isso, no caso presente, condutas que constituem crime -, a lei nova afronta, de modo escancarado, o art. 37 da Constituição. Por isso, até mesmo em relação a comportamentos praticados já na sua vigência, essa lei não merece ser aplicada. Trata-se de verdadeiro desrespeito ao povo brasileiro e aplauso ao comportamento errado, malicioso, criminoso e imoral do mau servidor público. E isso não se pode admitir”, afirma.

Com relação à prescrição reconhecida pelo TRF-4, o Ministério Público Federal alega que não se pode aplicar efeitos retroativos em tal ponto, sob o argumento de que, uma vez que não existia tal regra quando a ação foi ajuizada, ‘não se poderia esperar que o processo tivesse conclusão em algum prazo determinado’.

“Pretender aplicar essa restrição neste momento claramente conflita com essa justa e legítima expectativa criada, sendo medida absolutamente inadequada. Não bastasse isso, seria de todo absurdo pretender aplicar o referido preceito quando não há demora atribuível ao autor da ação! Esse tipo de interpretação implicaria punir a sociedade quando, a rigor, nenhuma omissão existe por parte dos órgãos de controle”, registra trecho do recurso apresentado ao TRF-4.


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