SABATINA DA ABIN Antes de ser indicado para presidir a Petrobras, Ferreira Coelho teve a vida vasculhada: perfil técnico (Crédito:Leo Pinheiro)

A confusão que se instalou na Petrobras nos últimos dias, com a fracassada tentativa de alçar ao comando da instituição nomes ligados a empresas privadas de energia (Adriano Pires e Rodolfo Landim), o que caracterizou flagrante conflito de interesses, mostrou mais uma vez o tamanho do despreparo do governo Bolsonaro na condução da máquina pública do País. As más escolhas do presidente são latentes. Tanto que em meio à escalada acelerada das cotações de gasolina, diesel e gás de cozinha, a direção da Petrobrás permaneceu um longo período batendo cabeça com o presidente da República quanto à política de preços, levando a empresa ao descalabro administrativo em mais uma clara demonstração de que competência e rigor com a coisa pública definitivamente não são as marcas do atual governo. Para contornar a crise de gestão em que a estatal estava mergulhada desde que o mandatário demitiu o general Joaquim Silva e Luna, de forma vexatória, o ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, buscou uma solução caseira nos quadros do governo e nomeou, na noite de quarta-feira, 6, José Mauro Ferreira Coelho para presidir a estatal e Márcio Andrade Weber para comandar o conselho de administração da companhia. Sem essas escolhas, a empresa ficaria à deriva a partir desta quarta-feira, 13, quando acontece a assembleia geral dos acionistas para aprovar as mudanças na direção.

FUTEBOL Rodolfo Landim preferiu seguir a carreira à frente do clube esportivo Flamengo (Crédito:Divulgação)

Mas se a intenção de Bolsonaro ao demitir Silva e Luna era forçar a Petrobras a não reajustar os preços dos combustíveis com base nos preços internacionais e colaborar com o governo na contenção dos aumentos frequentes ao consumidor por causa da campanha eleitoral, os esforços do governo podem dar com os burros n’água. Afinal, o novo presidente da estatal já defendeu a manutenção da atual política de preços. Em entrevista em outubro do ano passado, Ferreira Coelho disse que “os combustíveis são derivados do petróleo, que é uma commodity precificada em dólar no mercado internacional. Se o preço do petróleo aumenta, o dos combustíveis também aumenta”, disse ele. Aliás, essa forma de reajuste nos derivados do petróleo com base nas cotações em dólar também já havia sido o motivo da demissão de Roberto Castelo Branco, o presidente da estatal que antecedeu Silva e Luna.

Para evitar que os nomes de Ferreira Coelho e Andrade Weber fossem vetados pelos controles internos da Petrobras por eventuais manchas nas carreiras, eles foram submetidos a uma checagem de informações por parte da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), vinculada ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, e foram aprovados. Esse monitoramento, portanto, não viu nada de irregular na vida pregressa dos dois novos indicados para dirigir a estatal. O novo presidente da companhia foi o que mais correu riscos. Afinal, ele era funcionário concursado da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e ajudou o governo Lula na formulação do regime de partilhas de produção quando o Pré-sal foi descoberto. Em 2006, chegou a ser candidato a deputado estadual no Rio de Janeiro pelo PSDB, mas não se elegeu, já que fez apenas 1.437 votos. O PSDB, como se sabe, é hoje um dos maiores adversários do bolsonarismo. Por sua vez, Andrade Weber, escolhido para a presidência do Conselho de Administração, já era conselheiro da estatal e, portanto, não tinha nenhuma falha curricular. Ele irá substituir Eduardo Bacelar Leal Ferreira, que pediu para deixar o conselho da empresa. Essa vaga, inicialmente, seria de Rodolfo Landim, presidente do Flamengo, que desistiu da indicação. Assim como Adriano Pires, ele era ligado ao empresário Carlos Suarez, dono de empresas de gás e um dos fundadores da OAS, investigada na Lava Jato.

CONFLITO Adriano Pires reconheceu dificuldade de conciliar estatal com negócios privados (Crédito:Leo Pinheiro)

Conflito de interesses

As más escolhas eram tão nítidas que o próprio Adriano Pires pediu para não assumir a presidência da estatal. Em carta enviada ao Ministério das Minas e Energia, no último dia 4, o economista declinou do convite e admitiu o conflito de interesses. “Ficou claro para mim que não poderia conciliar meu trabalho de consultor com o exercício da presidência da Petrobras”, pontuou Pires ao ministro Bento Albuquerque, após lembrar seus “mais de 30 anos de vida dedicados ao setor de óleo e gás”. Em 2018, Pires já havia declinado de outro convite para ocupar um posto na estrutura do governo federal. Na ocasião, ele fora indicado para integrar o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), mas renunciou depois que o MP de Contas junto ao TCU pediu a lista de clientes das empresas dele e de outros conselheiros para apurar eventuais divergências de ordem ética.