Relatórios obtidos pelo Estadão mostram que o ex-ministro da Justiça Anderson Torres – que comandava a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal no 8 de Janeiro – antecipou suas férias para o dia 6 daquele mês mesmo depois de receber alertas por escrito de seus subordinados na pasta e informações da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) sobre o risco de violência nos protestos em Brasília.

Questionado nesta terça-feira, 8, na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que apura os atos golpistas, no entanto, Torres disse não ter recebido tais alertas. “Este documento, ele foi transmitido para o gabinete do secretário e eu já tinha saído da secretaria”, afirmou Torres na audiência com os parlamentares. “Quando eu viajei, não havia informação de inteligência.” Ele participou da sessão do colegiado usando tornozeleira eletrônica.

O ex-secretário alegou que viajou para os Estados Unidos na noite do dia 6 de janeiro – três dias antes do previsto – sem ler o documento elaborado por seus subordinados da Subsecretaria de Inteligência da pasta que citava risco de “invasão de órgãos públicos” e de “bloqueios em distribuidoras de combustíveis” para “sitiar Brasília”, conforme registros coletados em grupos de WhatsApp e nas redes sociais.

Os informes falavam, ainda, sobre preparativos de invasões de prédios públicos com a participação de indivíduos armados, que se enquadrariam na categoria de colecionadores, atiradores desportivos e caçadores (CACs). Os relatórios foram enviados pela Secretaria de Segurança Pública do DF à CPMI do 8 de Janeiro.

O documento destacava que postagens em grupos de aplicativo indicavam “a intenção de prática de atos de violência” no dia 8. A pasta também recebeu alertas sobre ameaças de “tomada de poder”. Já na manhã do dia dos ataques, a Abin apontou riscos com o crescimento das convocações de manifestantes para o ato na Praça dos Três Poderes.

Cautelar

Torres compareceu à CPMI de tornozeleira porque o uso do equipamento foi uma das medidas cautelares impostas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes na decisão que concedeu liberdade provisória ao ex-ministro, em maio. Torres foi preso em janeiro, ao voltar dos EUA, suspeito de omissão e conivência diante da invasão e depredação das dependências do STF, do Congresso e do Palácio do Planalto por radicais.

Os alertas recebidos pela Secretaria de Segurança Pública do DF foram reunidos pela pasta depois do dia dos ataques e enviados para o ex-interventor federal Ricardo Cappelli. Ele encaminhou o material para o Tribunal de Contas da União (TCU), que apura a atuação de agentes públicos na depredação em Brasília.

‘Minuta fantasiosa’

O ex-ministro da Justiça disse também na CPMI que a minuta de decreto apreendida em sua casa pela Polícia Federal é uma “aberração jurídica” e que não foi descartada por “mero descuido”. De acordo com o rascunho da minuta, o objetivo era reverter o resultado da eleição do ano passado na qual o então presidente Jair Bolsonaro (PL) foi derrotado.

“A Polícia Federal encontrou um texto apócrifo, sem data, uma fantasiosa minuta, que vai para a coleção de absurdos que chegam aos detentores de cargos públicos”, disse Torres. “Basta uma breve leitura para que se perceba ser imprestável para qualquer fim. Sequer cogitei encaminhar ou mostrar para alguém.”

Torres ainda responsabilizou a Polícia Militar do DF pelo envio de efetivo menor do que o necessário à Esplanada dos Ministérios no dia 8, sob o argumento de que sua pasta não tinha ingerência sobre questões operacionais da instituição.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.