Se o nome Felipe Aparecido de Lima e Souza for mencionado no ginásio do Taquaral, poucos saberão de quem se trata. O analista de desempenho do Vôlei Renata, time de Campinas que abre neste sábado a Superliga Masculina de Vôlei diante de Maringá, é bem mais conhecido como Ori, apelido que recebeu devido às orelhas avantajadas.

Aos 21 anos, o estudante de Educação Física da Unicamp, a pouco mais de um semestre da conclusão do curso, não perde um jogo da equipe campineira já faz uns bons anos. Os dirigentes e treinadores da equipe, percebendo que a paixão do jovem torcedor sempre foi enorme, deram um jeito de aproximá-lo ainda mais dela: algumas temporadas atrás, ele começou a carregar água para os jogadores, atuar como apanhador de bolas nos treinamentos, ajudar a montar a rede, secar a quadra. Ele desempenha algumas dessas tarefas até hoje.

Suas orelhas captaram muitas vezes o discurso da mãe, segundo a qual toda aquela devoção ao time não lhe daria futuro. “Se ao menos você arrumasse um emprego lá…”, suspirava a professora. Pois Ori arrumou.

A oportunidade se abriu para o pegador de bolas quando a antiga analista, Amanda Barsi, aceitou um convite feito pelo Corinthians/Guarulhos. Desde 2017, é analista de desempenho, como prefere ser chamado. Trata-se daquele trabalhador que vive com um laptop no colo durante a partida, pronto a passar dados imprescindíveis ao treinador. No meio do vôlei, esse profissional é conhecido como estatístico, palavra que ele considera inadequada.

“É que a gente não estudou estatística. Compilamos dados, como direcionamento de saque e de ataque, com a ajuda de um software, e estamos prontos para passá-los a qualquer momento para o treinador, que, baseado nesses indicadores, monta e remonta suas estratégias de bloqueio e de defesa”, explica.

Esse caso de amor com o Vôlei Renata começou com uma rejeição. Ori jogou nas divisões de base do Fonte São Paulo. Localizado no bairro Jardim Itapura, não muito longe do Taquaral, o clube revelou ninguém menos do que o levantador Maurício, bicampeão olímpico, e o atual titular da seleção brasileira, Bruninho. “2014, quando o clube entrou na disputa do Metropolitano sub-17, foi o ano-chave pra mim. A treinadora deixou claro que eu não teria futuro como jogador. É como se eu tivesse dois braços esquerdos, sendo que sou destro”, explica o futuro profissional de Educação Física, da forma mais objetiva possível.

Como o Fonte tem parceria com o Vôlei Renata, foi fácil para Ori se aproximar da equipe. Não demorou muito para que ele se aninhasse no deck, uma plataforma de onde filmava os jogos e anotava em papel detalhes táticos. O trabalho bem cuidado chamou a atenção de André Heller, campeão olímpico em 2004 e vice em 2008 e que hoje ocupa o cargo de coordenador técnico do Renata. Mas quem gostou ainda mais foi o treinador Horacio Dileo.

“Ele escuta bem tudo o que peço e me entrega exatamente aquilo de que preciso. É um jovem que trabalha duro todos os dias, e o faz com paixão. Isso hoje não é comum”, elogia o argentino.

Com todo esse envolvimento, Ori não teve muitas dúvidas na hora de se inscrever no vestibular: Educação Física era mesmo a escolha mais indicada para o rapaz, que se vê um dia com a prancheta na mão e atento às indicações de um outro analista de desempenho. “Gosto muito dessa área, de passar informações. Mas é claro que tenho ambições e que vou querer sempre dar um passinho a mais numa comissão técnica”.

Enquanto esse momento não chega, o analista “dos dois braços esquerdos” aproveita para curtir momentos intensos, como aqueles em que o bloqueio de sua equipe se posta da maneira correta, fechando uma diagonal, por exemplo, graças a uma informação garimpada por ele. “Gosto muito de vibrar, mas faço isso com cuidado, para não deixar o laptop cair do colo”, sorri.