Gustavo Roth /Folhapress

Que delírio é esse que toma conta do País? Imaginam os senhores parlamentares e mesmo o povo em geral que conseguiremos seguir adiante sem uma reforma previdenciária convincente? Acabou o caixa disponível. É fato. Todos sabem e fazem de conta que não. Idealizam o Estado como uma mãe de benevolência e fartura irrestritas. Há de se cair na realidade. Deixemos de lado as promessas populistas, a resistência politiqueira de arautos farsantes, meros candidatos à eleição que ludibriam a opinião pública. Não há mais recurso extra para engordar o orçamento vinculado a essa rubrica. E ponto final. Portugal e Grécia, que chegaram ao limite da irresponsabilidade e levaram o assunto com a barriga enquanto puderam, acabaram por cortar de vez a aposentadoria. Encerraram o benefício e a população de idosos ficou a ver navios por absoluta incapacidade financeira dos dois países em honrar com o compromisso. O Brasil, em três anos – o prazo é esse mesmo! – pode chegar lá, nas mesmas circunstâncias de insolvência previdenciária, se nada for feito. Um pouco de sensatez e engajamento ao projeto de reforma é aconselhável aos brasileiros. Especialmente àqueles responsáveis por votar o tema. É preciso rever o sistema, cortar benefícios, colocar travas, criar as tais escalas de contribuição mais rígidas, estabelecer tetos realistas de idade mínima, arrancar os privilégios, demover os lobbies classistas daqueles que levam mais que a média em prejuízo da esmagadora maioria. Pode-se discutir como e em que áreas, estratégicas ou não, a mexida na fórmula deve ser mais acentuada. O coerente, decerto, seria atacar primordialmente as chamadas gordas pensões dadas a militares e a seus familiares, servidores públicos de vários matizes e naturezas funcionais, e mesmo a regra que contempla os excelentíssimos senhores parlamentares, que possuem privilégios de encher os olhos nesse tocante. As castas previdenciárias deveriam simplesmente sumir, em prol do interesse geral. O governo tergiversou na questão. Recuou diante de eventuais adversários de porte e deu assim fôlego aos que gritam mais alto. Os privilegiados fizeram valer a vontade junto ao Executivo, que é em ultima instância quem elabora e encaminha a proposta final. Mas a briga foi apenas adiada. Terá de ocorrer de uma maneira ou de outra, o quanto antes. Nada disso tira da frente a urgência de se produzir alguma solução, por menor que seja, nesse campo. Não dá mais para adiar. Os simpatizantes da ideia do deixa como está para ver no que vai dar querem tão somente o caos. Sabem que a previdência não aguenta seguir nessa toada indefinidamente. Políticos jogam com a tática de empurrar o tema – amargo por natureza – para depois da eleição. Imprudência absoluta. Em um ano a situação de penúria será mais aguda e o grau de intervenção também. Vivemos tempos de um governo de transição e, por isso mesmo, criou-se o ambiente ideal para o ajuste antes que a nova gestão tome posse e dê continuidade à retomada do desenvolvimento, sem amarras como essa para desatar. Do contrário, o País perderá o bonde e despenderá uma energia enorme para resolver a questão mais adiante. Será bem mais complexo e custoso fazer passar qualquer proposta de envergadura na temporada de início de novo governo, normalmente voltado para a costura de composições e dedicado a garantir prestígio com os eleitores. Muitos, no passado, tentaram e não conseguiram – de FHC a Lula, com ensaios de mobilização tímidos nos mandatos de Collor, Itamar e Dilma. Em síntese: há décadas uma necessária reforma previdenciária aguarda na fila. A maioria dos congressistas e políticos de calibre fazem proselitismo inconsequente sobre o assunto para angariar simpatizantes. O presidenciável Ciro Gomes, para ficar em um exemplo, optou pelo alarmismo tolo e fora de hora ao reverberar que alguns querem tirar a aposentadoria do trabalhador. Na verdade, se nada for feito, ela será mesmo eliminada – independentemente de quem esteja no comando da Nação – por insuficiência de recursos. Seria um despropósito. Cada um de nós quer e possui o direito a se aposentar. É só zelar por ele, assegurando a saúde financeira do sistema. Reforma já, antes que seja tarde!


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