Eu devo ser um covarde.

Um gordinho quatro-olhos, desses que morre de medo de tomar uma surra do fortão da turma. Ou um covarde magrelo, desses de repartição pública, que fica no cantinho da sala sempre que o chefe aparece fumando charuto.

Não que eu tenha medo de toda e qualquer coisa. Isso não.

Meu medo é muito específico e vem se desenvolvendo e ampliando ao longo dos anos.

Tenho medo da internet.

Tenho muito medo da rede mundial de computadores.

O que, na prática, é ter medo de tudo.

E olha que no começo fui um de seus maiores fãs.

De carteirinha mesmo.

Quando os primeiros emails começaram a circular, estava certo que nosso futuro seria brilhante. Coisa bonita de se ouvir, aquele chiado dos modens se conectando à rede.

Gilberto Gil fez até música, para me certificar de que seria linda aquela revolução.

Sorte a minha viver naqueles tempos onde descobrimos um Shangrilá ao alcance de todos.

Iriamos nos unir em busca de soluções para a vida, para as relações e para o planeta. Conectados às páginas de empresas que, agora, amadureceriam e jamais tentariam nos enganar seriamos, enfim, felizes.

E o futuro veio rápido. Num clicar de mouse ele chegou e, como somos humanos, demos um jeito de estragar tudo.

Começa que aquela quase-anarquia democrática, descentralizada, que ameaçou existir nos primeiros dias da internet se transformou, no reinado hegemônico do Mark e seus pares.

Uma meia dúzia de geniozinhos americanos-indianos-chineses, donos das principais redes sociais. Redes sociais, por sua vez, que em questão de meses atingiram seguidores aos bilhões.

Lembro que a primeira vez que tive esse meu medo foi quando li que adolescentes estavam viciados em redes sociais.
Como assim? – pensei, decepcionado.

O que era para ser um oceano de liberdade, virou um culto ao deus dopamina.

Medo.

Medo porque eu mesmo não dispensava algumas curtidas na foto do meu almoço. Estava contaminado também.

A internet virou, então, um feudo moderno.

Nos tornou dependentes, até antes de impor seu poderio.

Mais tempo se passou e os meninos donos das redes, foram conquistados por suas próprias criações.

Você, eles e eu viramos os vassalos e os algoritmos é que mandam.

Quando vejo gente dizer que os computadores dominarão o mundo, dou uma risada nervosa e histérica.

Dominarão? No futuro? Em que mundo você vive, companheiro?

Os computadores já dominam o mundo há décadas.
Aos poucos, percebemos que a liberdade que imaginávamos que iria existir, com a internet, foi sequestrada pelos tais algoritmos.

Esses sim são os mandachuvas.

São eles que decidem quem é seu amigo e quem não é, nas redes.

Você pode culpar políticos do mal, pode culpar marqueteiros, pode culpar redes sociais, mas até essa história de “fake news” é o nome que demos para a maneira que os algoritmos, usando as pessoas, divulgam suas mentiras.

Por isso eu morro de medo.

Agora, o assunto da vez é a Inteligência Artificial.

Internetfobia. Eu tenho e um dia você também vai ter

Volta a ter destaque essa bobagem de “singularidade”, o dia em que os computadores finalmente serão mais inteligentes que nós.

Como se fosse muito difícil ser mais inteligente que o homo sapiens.

Ou que a mulher sapiens.

Essa batalha nós já perdemos amigão. Acorda!

Se cai o sistema, você não pode tirar dinheiro do banco.

Se seus registros sumirem de um computador qualquer em Brasília, você deixa de existir.

Se seu nome não estiver no computador, você não vota, não toma remédio, não come.

Inteligência Artificial é só outro nome bonitinho para tomar posse de nossa limitada Inteligência Natural.

Por isso me arrasto pelos cantos, encostado nas paredes, com terror de ser flagrado pelo Grande Computador.

Puro medo. Ele que não me ouça.