Um francês de 28 anos, tetraplégico há quatro anos, conseguiu caminhar e mexer os braços usando um exoesqueleto controlado pelo seu cérebro. Embora considerada promissora, a tecnologia ainda é experimental e precisa passar por muitos aprimoramentos para ser aplicada clinicamente, ressaltaram os cientistas franceses responsáveis.

Foi um longo caminho até que o paciente Thibault conseguisse movimentar os membros. A tecnologia, que alia um exoesqueleto a um sistema de sensores cerebrais, começou a ser desenvolvida há dez anos.

Na pesquisa, dois dispositivos foram implantados na cabeça do paciente, entre o cérebro e a pele, abrangendo a região que controla a sensação e a função motora. Cada dispositivo continha 64 eletrodos que coletavam sinais cerebrais e os transmitiam a um algoritmo de decodificação. O sistema traduzia sinais do cérebro nos movimentos em que o paciente pensava e enviava seus comandos ao exoesqueleto.

Por 24 meses, o paciente realizou, com a ajuda de um avatar virtual, várias tarefas mentais para treinar o algoritmo a entender seus pensamentos e aumentar o número de movimentos que poderia fazer. Após os treinos, o paciente começou a exercer a mesma tarefa de usar seus pensamentos para movimentar o exoesqueleto. O feito foi publicado anteontem na revista científica Lancet Neurology.

Segundo Alim-Louis Benabid, professor da Universidade de Grenoble (França) e um dos autores do estudo, tecnologias anteriores usavam sensores invasivos no cérebro, que podem ser mais perigosos e param de funcionar frequentemente. “É o primeiro sistema cérebro-computador semi-invasivo e sem fio desenvolvido para ativar os quatro membros.”

Há cerca de quatro anos, o francês Thibault caiu de uma altura de 15 metros. O acidente resultou em uma lesão na medula espinhal que o deixou paralisado e o obrigou, durante os dois primeiros anos, a viver no hospital. Em 2017, decidiu participar da investigação sobre o exoesqueleto da Clinatec (centro francês de biomedicina).

Repercussão

Autores do estudo e outros especialistas reconhecem que, apesar de inovadora, a técnica ainda está longe de ser facilmente aplicada a todos os pacientes. Segundo Tom Shakespeare, professor da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, a pesquisa representa “um avanço bem-vindo e animador”, mas está muito longe de ser uma possibilidade clínica utilizável. “Mesmo que sejam viáveis, restrições de custo significam que opções de alta tecnologia nunca estarão disponíveis para a maioria das pessoas com lesões na medula.”

Para o neurologista e neurofisiologista Marcel Simis, responsável pelo laboratório de neuromodulação do Instituto de Medicina Física e Reabilitação da Universidade de São Paulo (USP), o estudo mostra importante avanço no campo do exoesqueleto controlado pelo cérebro, mas a dificuldade é transformar sinais cerebrais em comandos para movimentos complexos. “As principais tecnologias em estudo geralmente permitem comandos mais simples. Para atividades como caminhar, o movimento é mais complexo.”

Outra questão a ser aprimorada é a necessidade de o exoesqueleto estar suspenso no teto para que o paciente consiga suportar o peso de toda a estrutura. Os cientistas já estão debruçados sobre isso. Outros três pacientes começaram a usar o novo sistema e o próximo objetivo é buscar uma solução que permita que a pessoa caminhe e mantenha o equilíbrio por conta própria. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.