A enorme quantidade de estilos nos impede de dizer que existe uma única “música negra”. Há, no entanto, apenas um músico como Ben Harper: nenhum outro artista da atualidade transita com tanta desenvoltura pelo blues, soul, gospel e hip-hop como esse talentoso multi-instrumentista norte-americano, que está de volta com seu 17º álbum de estúdio – e seu melhor trabalho desde o início da carreira, no início dos anos 1990. Bloodline Maintenance tem tudo para se tornar uma obra histórica: instrumental poderoso e bem executado, excelentes canções e letras contundentes, que abordam o racismo, a política e as emoções. Traz outra característica, curiosa e extremamente rara: Harper compõe, produz, canta e toca todos os instrumentos. “Foi um trabalho duro para trazer ao público uma experiência sonora única”, afirmou ele à ISTOÉ. Algumas letras foram inspiradas por um sentimento de perda: a morte do baixista Juan Nelson, seu colaborador de anos na banda The Innocent Criminals, que morreu em 2021, aos 62 anos. “Isso me afetou como ser humano e como artista. Por isso o novo trabalho traz letras tão pessoais.” Ao comentar sobre a temática reflexiva, o músico faz uma curiosa comparação entre sua carreira e o skate, esporte que pratica na Califórnia. “Sempre tive receio de cair na frente de alguém. Hoje vejo que isso era uma questão ligada ao meu ego: eu estava preocupado demais com o que as pessoas iam pensar. É a mesma coisa com a música: você tem de se sentir livre e sem medo para expressar a sua criatividade”.

Críticas ao racismo e à escravidão

A canção Nós Precisamos Falar Sobre Isso, do novo disco de Ben Harper (foto), é um manifesto contra o racismo: “Escravidão/ Nós precisamos falar sobre isso / Eu digo que vidas negras importam / Porque a história mostra que não / Ou você é um cristão ou um racista/  Porque não pode ser ambos”, lê-se em um trecho da letra. Na sonoridade, sua guitarra mescla elementos de Robert Johnson, pioneiro do blues, e do lendário roqueiro Jimi Hendrix.