Teste de mísseis norte-coreanos mostra que Biden não deve perder Ásia de vista

Teste de mísseis norte-coreanos mostra que Biden não deve perder Ásia de vista

O teste de mísseis balísticos intercontinentais da Coreia do Norte lembrou nesta quinta-feira (24) ao presidente americano Joe Biden que seus planos de enfocar a política externa dos Estados Unidos na Ásia devem continuar na ordem do dia, apesar da atenção momentânea na invasão russa da Ucrânia, estimam analistas.

O primeiro teste de um míssil mais potente do líder norte-coreano Kim Jong Un desde 2017 foi uma lembrança para Biden de sua influência limitada, inclusive no momento em que o presidente americano visita a Europa para liderar uma aliança ocidental em Bruxelas contra a invasão russa da Ucrânia.

“Kim Jong Un decidiu colocar em aperto a administração Biden enquanto [o presidente americano] assistia à cúpula da Otan na Europa”, opina Harry Kazianis, diretor do centro de estudos conservador Center for the National Interest.

O dirigente norte-coreano “mostra que Pyongyang e seus mísseis não vão desaparecer”.

Biden assumiu o cargo em 2021 prometendo que os Estados Unidos priorizariam a Ásia, em detrimento da Europa e do Oriente Médio, porque a Casa Branca considera que a rápida expansão da China é o principal desafio estratégico do século XXI.

Contudo, ninguém sabia na época que, pouco mais de um ano depois do início de seu primeiro mandato, Biden lideraria a resposta ocidental à invasão russa da Ucrânia, que representa a ameaça mais grave para a segurança na Europa desde a Segunda Guerra Mundial.

E, apesar de o democrata receber aplausos pela forma como está gerenciando a crise na Ucrânia, a ameaça da Ásia persiste.

Por medo de que a China ajude a Rússia a contornar as sanções ocidentais e, inclusive, forneça armas a Moscou, Biden tem pressionado para manter Pequim à margem do conflito.

Por ora, o presidente chinês, Xi Jinping, parece se manter distante, mas se recusa a aderir à indignação ocidental pela campanha violenta do Kremlin.

Depois do disparo de míssil da Coreia do Norte, a Casa Branca condenou um “aumento desnecessário das tensões”. Mas, assim como a China, a Coreia do Norte parece suficientemente segura para não se preocupar muito com o que pensam os Estados Unidos.

– Realidade nuclear –

Biden não é o primeiro presidente dos Estados Unidos que fracassa em fazer com que a Coreia do Norte renuncie a suas armas nucleares. Seu antecessor, Donald Trump, tentou empreender uma diplomacia pessoal com Kim, que não chegou a lugar nenhum.

As propostas do governo Biden de negociações mais tradicionais também estão em um beco sem saída.

Para Terence Roehrig, especialista no conflito coreano que dá aulas no Naval War College, o último teste de mísseis de Kim não é muito “um pedido de atenção”, mas um passo a mais de um programa agora imparável.

“O teste ocorreria de qualquer maneira”, disse Roehrig. “Kim está determinado a desenvolver suas capacidades. Necessita de testes para garantir que funciona e a possibilidade de diálogo é bastante escassa, até que os testes terminem” e ele possa falar de “uma posição de força”.

Segundo Roehrig, Washington tem que assumir a ideia de que deverá “lidar” com uma Coreia do Norte nuclear, que esta é a única opção realista.

– China espera –

Independentemente do ressurgimento repentino da Europa como uma das principais crises mundiais, a política externa dos Estados Unidos continua focada na Ásia, uma mudança que começou quando Biden era vice-presidente de Barack Obama, afirmam os analistas.

“Embora a invasão da Ucrânia pela Rússia e os tremendos esforços diplomáticos nessa frente continuem claramente a engolir o governo Biden, os Estados Unidos não têm escolha a não ser continuar olhando para a Ásia”, afirma Paul Fritz, professor de ciência política na Universidade de Hofstra.

“Dados os desafios que a contínua ascensão da China apresentam para os Estados Unidos e seus aliados, Biden deve equilibrar os interesses estratégicos de longo prazo na Ásia com os desafios de uma Rússia ressurgente”, avalia.

Roehrig considera que a Rússia “complicou” o panorama, mas que o governo dos Estados Unidos está em condições de lidar com as duas frentes ao mesmo tempo.

O acordo dos Estados Unidos firmado no ano passado para vender submarinos nucleares à Austrália, as longas conversas por teleconferência entre Biden e Xi, e a próxima cúpula dos países do Quad (Austrália, Índia, Japão e Estados Unidos) são uma prova de que a mudança segue o seu curso.

E a Coreia do Norte acaba de mostrar que Biden não tem escolha.