Viva a Biblioteca Nacional da França! Viva a República! Viva a França!”, foi com o histórico grito revolucionário que a primeira-ministra francesa Élisabeth Borne inaugurou oficialmente o mais antigo edifício pertencente à instituição: o Richelieu, que começou a ser construído ainda no século XVI. Após 12 anos e 261 milhões de euros investidos na reforma, a biblioteca localizada no coração de Paris reabre ao público trazendo não apenas livros e documentos, mas também tesouros da humanidade. Estão expostas as peças de xadrez de marfim do imperador Carlos Magno; a partitura manuscrita da ópera Don Giovanni, de Mozart; um globo do século 16, o primeiro a apresentar a palavra “América”; o manuscrito Notre-Dame de Paris, do escritor Victor Hugo, entre outros.

A história biblioteca se traduz em uma perpétua busca por espaço, devido ao constante crescimento de seu acervo. Dois endereços principais abrigam mais de 40 milhões de documentos: o edifício François-Mitterrand, destinado aos impressos de toda natureza e documentos audiovisuais, e o Richelieu, onde estão as coleções especializadas – manuscritos, desenhos, gravuras, fotografias, mapas, moedas e medalhas, antiguidades e joias. No total, o Richelieu contém 22 milhões de objetos e documentos que datam da antiguidade até os dias atuais. Só a coleção de gravuras e fotografias tem 15 milhões de obras.

ARQUITETURA Escadaria monumental: toque de modernidade no Richelieu (Crédito:STEPHANE DE SAKUTIN)

Os tesouros mais valiosos ficam no piso superior, com acesso por meio de uma escada monumental de aço e alumínio, espécie de espinha dorsal do local. Esse verdadeiro museu contém ainda a segunda maior coleção de vasos gregos antigos depois do Louvre, além de algumas das moedas mais raras da França. Há também peças de vestuário e, claro, os manuscritos da Galeria Mazarin, que serão trocados a cada quatro meses para evitar danos causados pela exposição à luz. A Galeria Mazarin é uma atração por si só: foi criada 40 anos antes do Salão dos Espelhos de Versalhes (1684) e possui 280 metros quadrados de puro luxo. Seu teto do século XVII, coberto de pinturas barrocas, foi inspirado nas “Metamorfoses” de Ovídio.

MANUSCRITOS Obras-primas da literatura mundial: rascunhos de Marcel Proust (Crédito:Francois Mori)

Para quem se emociona ao ver uma página da obra de sete volumes de Marcel Proust, Em Busca do Tempo Perdido, cujas palavras – riscadas e reescritas – testemunham suas hesitações e incertezas como escritor, o espaço é capaz de colocar o turista apaixonado por literatura em transe. Os manuscritos vão desde o livro ricamente ilustrado do século 13 conhecido como Saltério de São Luís até O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir. Partituras de Stravinsky, gravuras originais de Rembrandt e Pablo Picasso, fotografias de Nadar e Robert Capa e também uma das duas Bíblias de Gutenberg que pertencem à instituição fazem parte da exposição.

O térreo permanece o que sempre foi: uma biblioteca tradicional – se é que é possível considerar essa espetacular coleção de livros como algo corriqueiro. A magnífica Salle Ovale, uma joia arquitetônica inaugurada em 1936, foi por muito tempo reservada somente aos estudiosos e estudantes. Agora, foi totalmente redesenhada como uma sala de leitura pública e está aberta a qualquer um, de forma gratuita.

“A leitura e o estudo são essenciais para qualquer democracia esclarecida. É nas bibliotecas que nasce e cresce o espírito crítico” Élisabeth Borne, primeira-ministra da França (Crédito:Christophe ARCHAMBAULT)

Há mesas para 160 pessoas, uma área para crianças com sofás e telas interativas, fora 20 mil obras de acesso irrestrito, incluindo nove mil histórias em quadrinhos. O espaço é imponente, com um telhado de vidro de quase 18 metros de altura, 16 janelas decorativas, mosaicos e dezenas de metros de estantes, algo que torna o espaço um dos mais belos locais da Europa. “A leitura pública e o estudo são essenciais para qualquer democracia esclarecida. É nos livros que se encontram as perguntas, as respostas e os saberes que auxiliam na construção de cada cidadão. É nas bibliotecas que nasce e cresce o espírito crítico”, afirmou a primeira-ministra Élisabeth Borne durante sua visita ao local.

Para Marie Bally, professora de História da Arte e Cultura Francesa, visitar a biblioteca é imprescindível para quem visita Paris. “Para os franceses, a arte e a literatura, são muito importantes. E são valorizadas desde a infância. Em qualquer local que você vá, é possível ver crianças sentadas em círculo no chão, vivenciando essas experiências com a ajuda de um monitor”, diz. Por isso ela sempre incentiva aos seus alunos adultos que levem seus filhos ao fazer uma viagem a Paris. “Estar em família nesses locais é muito importante. É apresentar uma nova forma de ver o mundo.”