Chegou ao fim após três anos a saga da polícia britânica para recuperar centenas de livros, manuscritos e gravuras avaliados em R$ 17,5 milhões. A solução do crime, que envolveu o serviço de segurança de diversos países, veio quando o material roubado do depósito em Londres foi encontrado enterrado em um poço de cimento em Neamt, área rural da Romênia. Segundo Pedro Corrêa do Lago, um dos maiores colecionadores de livros e editores do País, apesar da maestria do assalto em si, os ladrões não tinham a menor ideia do que estavam fazendo.

 

“É fácil perceber que quem realizou o assalto não compreendia como funciona o mercado dos colecionadores de livros” Pedro Corrêa do Lago, colecionador e editor (Crédito:DON EMMERT)

“É fácil perceber que quem realizou o assalto não compreendia como funciona o mercado dos colecionadores de livros. Ao contrário de outras obras de arte, como pinturas, que possuem uma única versão, os manuscritos possuem várias cópias, geralmente amplamente fotografadas. Por isso, são difíceis de serem revendidos”, explica o colecionador. Para negociar a mercadoria roubada e despistar as autoridades, segundo ele, seria necessário alterar os produtos de maneira que ficasse impossível identificá-los. “Tudo que existe de obras relacionadas a autores tão conhecidos é amplamente registrado. É impossível imaginar a máfia saindo por aí vendendo livros antigos”.

O roubo cinematográfico aconteceu em janeiro de 2017, quando os volumes estavam sendo embalados em um depósito de trânsito postal em Feltham, em Londres. Os objetos iriam a leilão posteriormente em Las Vegas, nos EUA.

Três ladrões ligados à máfia romena usaram cordas de rapel para invadir o edifício após abrirem um buraco no telhado. Enquanto Narcis Popescu ficava no carro, Daniel David e Victor Opariuc entraram no local e realizaram o roubo. A inspiração pode ter vindo do filme “Missão Impossível”, com Tom Cruise. Em uma das cenas mais marcantes, seu personagem, Ethan Hunt, invade o prédio pelo teto e fica pendurado para evitar os sensores dos alarmes.

Impressão digital

A ação durou cinco horas e os livros roubados foram retirados do local em 16 bolsas. O carro usado pelos criminosos na fuga foi abandonado após ter sido minuciosamente limpo com alvejante. A operação de resgate dos livros não foi menos detalhista: uma única impressão digital encontrada no veículo levou a Polícia Metropolitana de Londres a realizar 45 batidas, que culminaram com a captura dos envolvidos. Ao todo 13 pessoas foram condenadas.

Os mais de 200 livros recuperados, dentre eles as primeiras edições de Galileu Galilei e Sir Isaac Newton, pensadores que mudaram a forma como a humanidade entende o mundo, foram resgatados em perfeito estado. Havia ainda manuscritos de Petrarca, edições raras de Dante Alighieri e outros 80 esboços do pintor espanhol Francisco de Goya. “Todo colecionador de livros antigos sonha com um desses exemplares. Antes disso, porém, é necessário conhecer a real proveniência da obra. Há milhares de exemplares por aí, mas ninguém sai comprando produtos como esses sem ter maiores detalhes sobre a origem”, afirma Corrêa do Lago. Pelo jeito, os criminosos devem ter encontrado dificuldades para revender o produto de seu roubo. Ou seja: o crime que começou como um thriller cinematográfico ganhou, ao final, algumas pitadas de comédia.

Ilustres pensadores

Entre as obras roubadas, edições originais de pensadores e
filósofos europeus: livros de sonho para os colecionadores