Uma tentativa de vacinação virou caso de polícia no Rio de Janeiro. O promotor de justiça André Guilherme Tavares de Freitas, titular da 3ª Promotoria de Justiça junto à Vara de Execução Penal, do Ministério Público do Rio, tentou se vacinar contra o coronavírus, mas funcionários do posto instalado no Jockey Club da Lagoa teriam se recusado a imunizá-lo. As informações são d’O Globo.

O promotor alegou estar amparado por uma lei estadual por ter um filho autista, mas acabou parando na 15ª DP (Gávea), na tarde desta quarta-feira (12), que apura o crime de infração sanitária. O caso foi encaminhado para Luciano Oliveira Mattos de Souza, procurador-geral de justiça.

No depoimento dado na delegacia, André Guilherme alegou que avisou à técnica de enfermagem Luana Tavares de Freitas que estava respaldado pela Lei 9264/21, assinado pelo governador Cláudio Castro em 3 de maio, que permite que pais, mães e tutores de pessoas com deficiências intelectuais sejam incluídos no grupo prioritário da vacinação contra a Covid-19. O promotor afirmou que a técnica de enfermagem teria dito que “está ciente da lei, porém, que estava seguindo o cronograma da Secretaria municipal de Saúde, que não contempla pais de crianças com autismo na prioridade”.

Em entrevista ao O Globo, o promotor considerou o caso uma “falta de humanidade”. “Eu sou pai de uma criança autista e tem uma lei que dá direito à dose. Eu cheguei para me vacinar, expliquei a situação, e a responsável disse que não iria cumprir a lei, pois não estariam obrigados a cumprir a lei do estado. Insisti com ela que era preciso cumprir. (A responsável técnica) insistiu e falou que o posto não estava preparado”, disse.

“Eu disse que chamaria a polícia e elas falaram que era para eu chamar. A vacinação no município está um caos. E agora eles descumprem uma lei do estado. Tem uma lei e ela deve ser cumprida. Eu estava lá como pessoa civil, não dei carteirada em momento algum. Se a gente que conhece minimamente da lei eles fazem isso, imagina com quem não conhece. Eles foram arrogantes”, contou.

Já a técnica de enfermagem Luana Tavares de Freitas, responsável pelo posto de vacinação, disse no depoimento, que, por volta de 11h30, o promotor chegou ao local afirmando que estava amparado em um lei estadual e que teria prioridade na vacinação. Luana teria relatado “a secretaria de saúde ainda estava elaborando o cronograma para incluir o respectivo grupo prioritário” no calendário de vacinação, e que “não tinha autonomia para vacinar pessoas fora do grupo prioritário estipulado pela secretaria, mesmo o posto estando vazio”.

A profissional de saúde negou ter dito que a lei não se aplicava ao munícipio, e afirmou que “após ser informada por André que o mesmo iria chamar a polícia, informa ter falado: “o senhor fique a vontade para fazer o que quiser”, assim como negou ter tido que o promotor tentou dar uma “carteirada” para que a vacinação acontecesse.

Luana confirmou, por telefone, a versão narrada na delegacia. “Tem uma lei estadual que põem pais ou responsáveis de pessoas com deficiências intelectuais como prioridade. E eles precisam, mas a lei não deixa claro como ela deve ser cumprida e se é de imediato. Pela orientação da SMS, eles estão se organizando para contemplar esse público. Por ora, não estão sendo imunizados. Eu expliquei para ele que até houve a vacinação desse grupo de uma forma equivocada, mas que não estava acontecendo mais. Disse que estamos seguindo o Plano Nacional de Vacinação”, afirmou.

“Ele não me deixou nem explicar e disse que se eu não desse (a dose) iria chamar a polícia. Falei que ele poderia ficar à vontade. Ele saiu e em seguida voltou com a PM. Como não tinha ninguém no posto e ele se valia desse argumento, tivemos que parar momentaneamente. Liguei para a minha supervisora e outro colega me substituiu até eu voltar a delegacia”.

Uma fonte da 15ª DP (Gávea) afirmou que “a princípio o crime é de infração sanitária”. “A investigação iniciou para apurar de fato o que aconteceu. Terão diligências para sabermos o que aconteceu. Outras pessoas até seriam ouvidas no inquérito. No entanto, a Civil não tem atribuição para investigar promotor de Justiça”.

Em nota, a a Polícia Civil disse que “a 15ªDP (Gávea) instaurou um termo circunstanciado. Todos os envolvidos estão sendo convocados para prestar depoimento e diligências estão sendo feitas. A investigação está e andamento. Posteriormente, a assessoria de imprensa da Polícia Civil disse que “a Secretaria de Estado de Polícia Civil (Sepol) informa que encaminhou a ocorrência ao Ministério Público (MP)”.

Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde afirmou que, “por decisão do Supremo Tribunal Federal, vacina os grupos prioritários de pessoas com comorbidades e com deficiência”. A pasta também afirmou que “infelizmente, o episódio de ontem não foi um caso isolado. Profissionais da linha de frente estão enfrentando situações difíceis ao cumprirem as regras para a aplicação de vacina e, inclusive, um funcionário já foi agredido em outra ocasião. A SMS lamenta que seus profissionais tenham que passar por situações como essa, quando estão trabalhando incansavelmente no combate à pandemia e está colaborando com as investigações”.