Tentativa da Câmara de beneficiar Ramagem não abala relação de Motta com o Supremo

Em meio a rumores de novos atritos institucionais, presidentes da Câmara e do STF cumprem agenda em Nova York

Marina Ramos / Câmara dos Deputados
Foto: Marina Ramos / Câmara dos Deputados

A relação institucional entre o presidente da Câmara, Hugo Motta, e o STF não sofreu abalo com a tentativa da Casa de suspender toda a ação penal aberta contra o deputado Alexandre Ramagem, acusado de participar da trama golpista na transição de governo. Se desse certo, a manobra da Câmara abriria brecha para beneficiar, de quebra, os outros sete réus inseridos no mesmo processo – entre eles, o ex-presidente Jair Bolsonaro.

A Primeira Turma do STF foi unânime ao derrubar a decisão da Câmara. Em mensagens duras, os ministros do tribunal rechaçaram qualquer tentativa de suspender as investigações. Flavio Dino afirmou no julgamento que “somente em tiranias” um poder paralisaria um julgamento criminal arbitrariamente.

O movimento de Motta de pautar a votação do projeto foi um gesto interno para os deputados. O presidente da Câmara já esperava que a inconstitucionalidade da proposta. Sabia, também, que ela seria derrubada facilmente pelo STF. Motta pautou a votação emparedado pelos próprios pares, mas com conhecimento de que se tratava de um movimento político, sem chance de ser posto em prática.

Enquanto o mundo político especula o nascimento de uma nova crise institucional entre Câmara e STF, Motta e o presidente o tribunal, Luís Roberto Barroso, cumprem agendas comuns nesta semana em Nova York, onde, em paralelo à entrega de um prêmio concedido pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos a empresários, ocorrem várias conferências para discutir o Brasil — nesta quarta, o PlatôBR e o Brazil Journal realizam, em parceria, um desses eventos.

Muito antes da aprovação do projeto que visava beneficiar Ramagem, Motta mandou sinais ao STF de que não queria guerra. Evitou, por exemplo, pautar uma proposta muito mais ofensiva ao Supremo: a anistia aos acusados de tentativa de golpe. Defendida por bolsonaristas, a medida seria uma afronta à atuação do tribunal, que ainda nem julgou os processos contra os principais acusados da trama golpista.

O presidente da Câmara também segurou a tramitação de um pacote anti-STF, com propostas que objetivam diminuir os poderes da Corte. A mais perigosa para o tribunal é a autorização para o Congresso Nacional suspender decisões do tribunal se dois terços dos parlamentares discordarem delas.

Motta também não incentivou a tramitação do projeto que facilita o impeachment de ministros do STF, com a possibilidade de tira-los do cargo se Congresso considerar que houve usurpação de competências do Legislativo em uma decisão. O presidente da Câmara também ignorou os pedidos de abertura de uma CPI do Judiciário.

As atitudes de Motta são lidas no STF como trégua na relação tempestuosa dos últimos anos. A paz, ainda que provisória, não foi ameaçada pelo movimento pró-Ramagem da semana passada.