Depois de atingir níveis já considerados elevados no ano passado e ajudar a sustentar os lucros de empresas como Vale e CSN, o preço do minério de ferro pode bater nos US$ 100 por tonelada neste ano, maior patamar desde meados de 2014, apontam analistas. A perspectiva é sustentada por uma “tempestade perfeita”, que englobou tanto os desafios da Vale após o rompimento de sua barragem em Brumadinho (MG), quanto os efeitos climáticos em áreas importantes para outras gigantes como a BHP e Rio Tinto.

Em 24 de janeiro, um dia antes do rompimento da barragem da Vale, a cotação do minério no porto de Qingdao, na China, estava nos US$ 74,71/t. Um mês depois, no dia 25 de fevereiro, a commodity já havia atingido os US$ 86,65. No fechamento desta terça-feira (9), bateu nos US$ 94,85, alta de 27% na comparação com o período antes do rompimento.

Os analistas Thiago Lofiego, Arthur Suelotto e Isabella Vasconcelos, do Bradesco BBI, avaliam que a curva do preço do minério deve aumentar sobretudo por causa dos maiores custos operacionais e investimentos para que a indústria possa crescer daqui em diante. “Agora, prevemos um déficit de oferta de 45 milhões de toneladas no mercado em 2019, o que deve ser suficiente para manter os preços dentro da faixa de US$ 80 a US$ 100/t”, escrevem em relatório.

O Bradesco BBI elevou de US$ 80 para US$ 90/t o preço médio para a commodity em 2019. “Nós estimamos que a Vale vai enviar cerca de 60 milhões de toneladas a menos em 2019, enquanto a Austrália deve reduzir a oferta em 25 milhões de toneladas, devido aos ciclones que atingiram os principais portos de exportação de minério de ferro do país”, estima o banco.

Em resposta a tal queda na oferta, os analistas do Bradesco disseram que os outros players, como China e Índia, devem ter participação aquém do necessário para preencher a demanda global.

A expectativa em torno de um acordo comercial entre Estados Unidos e China também influencia a cotação do minério, lembra ainda o analista Regis Régis Chinchila, da Terra Investimentos. “Nas próximas semanas teremos anúncios e definições, por isso o preço do minério deve se sustentar no patamar atual”, avalia.

Já Sabrina Cassiano, analista da Coinvalores, acrescenta ainda que a demanda da China continua sólida, com as obras de infraestrutura e o setor de construção civil garantindo o bom desempenho a despeito da desaceleração da atividade. Ela destacou, entretanto, que mesmo com a demanda chinesa, o patamar de US$ 100 deverá ser um teto.

A última vez que o minério chegou a níveis parecidos foi em 16 de maio de 2014, aos US$ 100,7/tonelada no porto de Qingdao. Nessa época, Sabrina lembra que o PIB da China crescia mais de 7% ao ano, enquanto os EUA também estavam crescendo mais de 2%. “O cenário econômico global era diferente. Foi uma época em que a China estava bombando. O patamar do minério deve continuar positivo, mas se bater no US$ 100, ele não se sustenta”, avalia. Segundo a analista, a casa dos US$ 80/t já seria interessante, inclusive, para as próprias mineradoras.

Preocupação

Empresários da siderurgia nacional começaram a pressionar o governo por uma solução para o impasse envolvendo a oferta de minério e pelotas diante das restrições da Vale. Em reunião com o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, na semana passada, o setor sinalizou o que poderá ser uma retomada antecipada de parte da oferta da Vale.

Entre as demandas, os executivos pleitearam a retomada das operações em Brucutu e do processo de pelotização em Vargem Grande. A Vale tem forte representatividade para o setor siderúrgico no Brasil. Segundo o presidente executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes, 46% de todo o minério usado na produção de aço nacional tem origem na Vale, contra 47% com origem na produção das próprias siderúrgicas e 7% de outras fontes.

De acordo com Lopes, o ministro Albuquerque se mostrou bastante solidário e determinou a criação de uma força tarefa com imediata incumbência de definir prioridades e implementar ações que corrijam tais pendências.

Normalização

Depois do turbilhão de 2019, analistas esperam que o mercado comece a se recuperar já em 2020, com estabilização na oferta de players importantes. A estimativa da equipe do Bradesco é que o preço fique na média na casa dos US$75/t em 2020.

Na mesma direção, o vice-presidente do Bank of America Merrill Lynch (BofA), Antonio Heluany, afirmou em evento recente que, para o ano que vem, os preços devem recuar para a casa dos US$ 64 por tonelada. “Teremos em parte uma normalização da oferta da Vale, assim como da BHP e Rio Tinto”, disse na ocasião. “A China também deve elevar sua produção e sobrará um pouco mais de minério no ano que vem.”