O cardápio escrito à mão, no capricho, circula pelas redes sociais. Desde 2017 que Dede Sendyk, de 51 anos, deixou a vista enevoada de um escritório na Avenida Luís Carlos Berrini, na zona sul paulistana, para se dedicar só à fumaça das alcachofras. Toda semana, ela transforma a sala de seu apartamento em um restaurante. E recebe conhecidos e desconhecidos para almoços e jantares pagos.

A experiência vem na esteira de outros serviços no mesmo modelo, como os de hospedagem em casa. Em comum, quem cozinha “para dentro” tem amor pelo fogão, gosta de receber convidados e quer garantir renda com o que faz de melhor. Quem vai procura ambientes mais intimistas e novas vivências gastronômicas.

No caso de Dede, a clientela é formada, na maioria, por amantes da alcachofra, especialidade do apartamento. “Mas também vem muito casal. Tem pessoas que não gostam da impessoalidade do restaurante.” A reserva no Dadedé deve ser feita um dia antes. O apê em Santa Cecília, região central, comporta até seis pessoas – o que cabe na mesa de jantar. A refeição, por pessoa, custa R$ 130, com bebidas à parte.

O grupo escolhe entre algumas opções do menu – a chef sugere o vinho e tem até sobremesa. O pagamento é feito ali mesmo, em dinheiro ou cartão. Para Dede, que não descarta ter um restaurante no futuro, esse é um bom treino. “A maneira como trato os alimentos e sirvo porções melhora a cada jantar. Isso me estimula a continuar.”

Amiga de amigos da chef, a museóloga Eugênia Esmeraldo, de 71 anos, foi uma vez, voltou e quer ir de novo. Atraída pela comida, gostou também da experiência. “Estou aberta a tudo o que é novidade e acho legal dividir o espaço.” Levou dois casais que nem se conheciam e, no fim, viraram amigos.

O formato costuma agradar, mas os “chefs de casa” reconhecem não ser unanimidade. “Tem pessoas que não estão a fim de vir para minha casa. Tenho certeza de que tenho amigos que só estão esperando eu abrir um restaurante para comer minha comida”, diz Dede.

Ao gosto do freguês. Abrir um restaurante não está nos planos de Flávia Pinto, de 42 anos. Isso porque atender a clientela em casa foi o jeito que achou de conciliar cuidados com o filho e o amor pela culinária baiana. Não à toa seu restaurante em casa se chama Quitutes de Mainha, alcunha que ela pronuncia com gosto e o saboroso sotaque.

Em sua casa no Cambuci, região central, moquecas e acarajés enchem a mesa de cores. “A casa vira de pernas para o ar para receber.” Baiana acostumada com casa cheia, barulho e fartura, não foi difícil para ela abrir as portas. O desafio ficou para o marido. Paulistano discreto, teve de “abaianar” para dar conta da mudança. Hoje, faz sala para convidados enquanto Flávia finaliza pratos. A dose da pimenta varia de acordo com o grupo.

O cuidado com o tempero é ainda maior quando a visita vem de longe. Turistas dos Estados Unidos, Canadá e até Líbano já foram conhecer a comida de mainha. “Trouxe o mundo para minha casa”, diz. Quando o idioma dificulta – ela não fala inglês -, o sabor dá uma mão.

Interessados não só em comer, mas em conhecer o processo até a mesa posta, clientes dos restaurantes em casa elogiam a chance de bisbilhotar a cozinha, algo raro em espaços convencionais. “Você pode levantar e falar com ele na cozinha. Permite interagir mais com o chef”, diz o bancário Affonso Taciro, de 47 anos, sobre a casa de Gustavo Araújo, de 36, na Vila Mariana, zona sul.

A Casa do Araújo abre toda sexta e sábado à noite. Convidados fazem reserva e se espalham por sala, edícula e quintal – o mesmo que, em dias normais, é usado para estender a roupa da família.

Publicitário e músico, ele serve porções para compartilhar – de R$ 25 a R$ 65 – e há até 25 lugares. Começou antes de virar moda, há sete anos, com amigos e parentes. “A maior preocupação era se iam gostar da comida.” Quem vai hoje foge de filas e da ‘frieza” de restaurantes. “São pessoas românticas, no sentido mais amplo.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.